30.6.08

JESUS: O PREGADOR DO REINO DE DEUS

Nem sempre se soube lidar com a figura de Jesus. Para alguns no cristianismo primitivo ele tinha aparência de humano, mas não era – concepção conhecida como docetismo; outros postularam sua humanidade, mas que em algum momento ele foi adotado por Deus e elevado a condição divina – concepção conhecida como adocionismo. Sempre houve polêmica em relação a Jesus. Os debates nos Concílios sobre as duas naturezas e a luta contra o gnosticismo sempre levaram a igreja a formular doutrinas a respeito dele. Quando tornaram Jesus parte da Trindade, a teologia católica viu a necessidade em se buscar outro símbolo para ocupar o lugar daquele que deixa de ser humano para se tornar divino. O subterfúgio vem com a teologia mariana na Idade Média e o dogma da Assunção de Maria sancionado pelo Papa Pio XII em 1950. No século XIX e XX os fundamentalistas do norte acentuaram mais ainda a natureza divina de Jesus como reação e resposta a chamada teologia liberal nascida no velho continente. Esse Jesus desenhado pelos fundamentalistas estava envolto em três temas: o berço, a cruz e o túmulo. A grande preocupação era com a sua divindade e sua obra salvífica. Enquanto a teologia, ora denominada de liberal, apregoava de que era preciso resgatar os ensinos de Jesus, uma vez que a teologia ortodoxa sempre se preocupou em formular doutrinas teológicas sobre ele.

O fato é que o Jesus de Nazaré que chorou, riu, sofreu, alegrou-se e morreu, foi substituído por um Jesus transcendente e inacessível. A sua humanidade deu lugar a sua divindade utilitária apenas para fim soterilógico. Não esta se negando a divindade de Jesus, o que poderia ser abordada em outra ocasião, esta se expondo a necessidade de atentar para aquele homem que viveu e morreu em função de sua mensagem: o Reino de Deus. Hoje, a maioria de nossos irmãos desconhece o centro da mensagem de Jesus. Para muitos ele é o salvador “das nossas almas” e sua vida e ensino se resume nisso; outros ainda o confundem com um santo milagreiro; sem mencionar nos novos modismos teológicos, se é que podemos assim chamar, em que Jesus não passa de um meio para se receber bênçãos, na sua maioria de consumo. A mensagem de Jesus sobre o Reino de Deus não é muito lembrada por aqueles que fazem profissão de fé em nossas igrejas; o “venha nós o teu Reino” quase ninguém entende. Não há comprometimento com o Reino de Deus pelo fato de desconhecerem as exigências da mensagem pregada por Jesus.

A grande obsessão de Jesus foi com o Reino de Deus. Sei que nem todos ficam contentes com isso, mas a verdade é que Jesus em nenhum momento quis fundar o cristianismo. Este só surgiu depois da vida, morte e ressurreição. O cristianismo é mais um resultado do que um propósito. Ele pregou o Reino de Deus e em lugar dele veio a Igreja. Jesus não fundou a Igreja, mas acabou sendo fundamento dela, como dizia Karl Rahner.

Ao iniciar sua caminhada naquelas terras áridas de um povo que não agüentava mais esperar pela intervenção de Deus; gente sofrida e calejada pela vida, mas que nutria a esperança em ver novamente seu povo livre da dominação estrangeira e a instauração do tão esperado Reino de Deus, o filho do carpinteiro, que vem de uma cidadezinha que quase ninguém conhecia direito, começa pregando o Reino de Deus.

Era esperado que aquele povo se empolgasse novamente. Seria este que assentaria no trono de Davi? Aquele que iria expulsar os impuros da terra santa? Eram tempos de expectativas (Lc. 3,15). Os discípulos de João Batista manda logo perguntar: “é você mesmo ou havemos de esperar outro?” (Lc. 7,18-22). A questão toda era a natureza deste Reino que Jesus estaria para propor. Não era um reino político, territorial ou guerreiro, mas era um Reino que exigia mudanças na maneira de agir e pensar. Este Reino não poderia ser reduzido a meras expectativas políticas e nacionalistas dos judeus, ele tem outra natureza.

Com esta mensagem Jesus decepciona a todos: discípulos, povo e autoridades judaicas. Perguntam a ele: “quando vem o reino de Deus?” Ele responde: “não poderão vê-lo ali ou acolá, pois ele esta entre vós” (Lc. 17,20-21). O Reino de Deus está aí, é preciso decidir por ele. Há uma nova ordem a ser instaurada por Deus e ela está à disposição de todos. A maior característica do Reino de Deus é a libertação do próprio eu. Era deixar-se ser guiado e tomado por Deus, ser conduzido pelos seus cuidados e estender as mãos para o outro. Este Reino só poderia ter sentido para aqueles que entrassem nele como crianças (Lc. 18,15-17). Agora para aqueles que tinham outro reino dentro de si, como o homem rico, o Reino de Deus não acharia lugar (Lc. 18,18-24).

Jesus de Nazaré. Nasceu entre animais; andou preferindo a companhia dos maus cheirosos, publicanos, zelotes e leprosos. Acabou sendo executado como herege religioso, blasfemo e político subversivo, porque, supostamente, estava tentando ser rei de um povo que o pendura na cruz. Morreu porque se comprometeu com sua mensagem até o último momento de sua vida: o Reino de Deus.

A sua mensagem em nenhum momento foi imposta, é por isso que ele ensina a orar: “venha nós o teu Reino”. Ele não queria criar um novo mundo, mas transformar este velho e conhecido mundo com os valores do Reino. Procurou ser a resposta divina para as mazelas desta vida; ensinou-nos que quando nos abrimos para receber o Reino de Deus mudanças ocorrem, como no caso do pequeno Zaqueu (Lc. 19,1-9).

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