22.4.16

ANTAGONISMO BATISTA - PARTE II

A eclesiologia batista e suas contradições: Diretoria Administrativa tem prerrogativa espiritual?

Proponho! Há apoio? Apoiado. Em votação...

Assim os membros da Diretoria Administrativa da igreja são votados para mais um período de atividade.

As Igrejas Batistas no seu aspecto jurídico, são dirigidas por Estatuto e Regimento Interno. Em seu Estatuto há os membros da Diretoria Administrativa que são responsáveis por dirigir a parte burocrática da igreja.

Geralmente, os membros da Diretoria Administrativa têm suas funções discriminadas no Estatuto, cabendo a eles exercerem o que preceitua os dispositivos...

Compete ao presidente:
- Convocar e dirigir as Assembleias Gerais da Igreja;
- Representar a Igreja, ativa, passiva, judicial e extrajudicialmente;
- Assinar as atas das Assembleias Gerais da Igreja, depois de aprovadas...

Compete ao vice-presidente:
- Substituir integralmente o presidente em seus impedimentos eventuais e na vacância da presidência...

Compete ao primeiro secretário lavrar e assinar as atas das Assembleias Gerais da Igreja.

Compete ao segundo secretário auxiliar o primeiro secretário em suas funções e substituí-lo em seus impedimentos eventuais ou na vacância do cargo.

Compete ao primeiro tesoureiro:
- Receber, guardar e contabilizar todos os valores financeiros da Igreja;
- Efetuar todos os pagamentos autorizados pela Igreja;
- Apresentar balancetes nas Assembleias Gerais ou a qualquer momento que solicitado...

Compete ao segundo tesoureiro auxiliar o primeiro tesoureiro em suas funções e substituí-lo em seus impedimentos eventuais ou na vacância do cargo.

Em nenhuma dessas funções aparece um dispositivo espiritual para os membros da Diretoria Administrativa. É aqui que a eclesiologia batista encontra dificuldades, uma vez que o pastor é o líder espiritual da igreja e, ao mesmo tempo, com algumas exceções, também exerce a função de presidente da igreja no seu aspecto jurídico. Quando o pastor se ausenta, o vice-presidente (aspecto jurídico) assume as funções espirituais que cabe ao pastor. Se a mesma pessoa tiver qualificações espirituais para assumir a liderança da comunidade e exercer a função de vice-presidente, será proveitoso. Se não corresponder, a igreja sente as incoerências.

Os membros da Diretoria Administrativa, segundo o Estatuto, não têm função espiritual, apenas burocráticas e administrativas.

Há um antagonismo aqui.

Os membros da Diretoria Administrativa são tratados como líderes espirituais da igreja e geralmente estão em reuniões com o pastor-presidente para tratar de assuntos espirituais da comunidade e, não necessariamente, de temas burocráticos e administrativos. Assim, @ secretári@, que tem suas prerrogativas estatutárias, é chamad@ a emitir sua opinião em assuntos disciplinares e espirituais. O mesmo ocorre com os demais membros da Diretoria Administrativa. Demais líderes da igreja, que trabalham com pessoas, são deixados de fora de tais encontros, alegando que os mesmos são tem prerrogativas estatutárias.

O pastor, endossa essa perspectiva quando faz reuniões com a Diretoria Administrativa para tratar de temas correntes na comunidade que não seja, meramente, administrativo.

Esse antagonismo poderia ser minimizado, se houvesse oportunidade para que os líderes espirituais da comunidade (líderes, corpo diaconal) fossem chamados a compor uma rede de assistência espiritual com qualificações espirituais para tal. Cabendo a Diretoria Administrativa os assuntos burocráticos da igreja.

ANTAGONISMO BATISTA - PARTE I

A eclesiologia batista e suas contradições: dons espirituais ou votação de cargos?

Vez ou outra escuto alguém dizer que a Igreja Batista é uma das melhores denominações do Brasil. Esse preciosismo se deve, em grande parte, à formação batista no Brasil que herdou o legado material, teológico e identitário dos missionários que aqui estiveram.

É sabido também que muitas pessoas que hoje pertencem a uma Igreja Batista, desconhecem a história do movimento e muito menos aquilo que baliza suas posturas. Há um desconhecimento quanto aos princípios batistas que são, notadamente, confundidos com doutrinas batistas. Há ainda quem diga que os batistas têm uma ortodoxia e a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira é uma “regra de fé e prática”.

O que é uma Igreja Batista?

De acordo com a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, uma Igreja Batista “é uma congregação local de pessoas regeneradas e batizadas após profissão de fé. É nesse sentido que a palavra ‘igreja’ é empregada no maior número de vezes nos livros do Novo Testamento”. Com essa assertiva, os batistas se entendem como uma igreja neotestamentária e procuram ser fiéis ao que o Novo Testamento ensina sobre igreja. Deste modo, afirmam a autonomia das igrejas, daí não é possível nomear como Igreja Batista, mas sim Igrejas Batistas, por conta da sua pluralidade e sistema congregacional. Como igrejas autônomas e democráticas, elas não possuem um sistema centralizador, ou seja, cada igreja é soberana em suas decisões administrativas, que são tomadas democraticamente e isso é o que caracteriza a forma de governo de uma Igreja Batista. A democracia é sua forte característica e implica em uma participação igualitária dos membros de uma comunidade local, homens e mulheres, nas decisões a serem tomadas quanto aos rumos da comunidade. Isso é o ideal.

Segundo a Declaração Doutrinária da CBB quanto a natureza da igreja, ela é expressa em dizer que se trata de uma igreja nos moldes do Novo Testamento. Será?

Aponto algumas contradições da eclesiologia ideal (Declaração Doutrinária da CBB e Novo Testamento) e a real (com seu modus operandi na realidade das igrejas).

Em uma igreja neotestamentária não havia cargos a serem votados, pelo menos na de tradição paulina. Nem mesmo no caso de Matias foi uma votação, mas sim uma sorte entre dois nomes (At 1,15-26). Logo, votação para assumir cargos e funções na comunidade não havia. O Novo Testamento traz os dons espirituais como condição para o exercício das funções e possíveis cargos. Mesmo que haja uma certa compatibilidade entre votação e dons espirituais, é algo raro nas Igrejas Batistas. Ainda predomina a perspectiva dos cargos e a votação como condição para exercê-los. As disputas entre as pessoas para os respectivos cargos são acirradas e as assembleias se transformam em batalhas para assumir determinada posição, uma vez que ela pode conferir empoderamento. No Novo Testamento, há pelo menos quatro listas sobre os dons espirituais – (Rm 12,3-8; 1Co 12 e 14; Ef 4,11-13; 1Pe 4,10-11) – todas elas tratam de algo outorgado pelo Espírito Santo que dispõe como lhe cabe dentro da comunidade de fé.

Uma vez com os respectivos cargos, as pessoas passam a exercer uma função dentro da comunidade que só cabe a ele ou ela. Assim, outra pessoa não poderia fazer, mesmo que tenha condições para isso, porquê já foi votado quem deve/deveria realizar tal atividade. Aquelas pessoas que no memento da votação se sentiram pressionadas a aceitar algum cargo, assim que possível deixa de exercer tal função.

A igreja ideal, do Novo Testamento, tem nos dons espirituais sua maneira de se organizar, onde cada um servi uns aos outros “conforme o dom que recebeu” (1Pe 4,10). Se recebeu não há necessidade de ser votado. Se a comunidade reconhece os dons de alguém, logo não é preciso votar para que tal pessoa exerça suas funções dentro da comunidade.

Esse antagonismo batista se dá em confundir práticas do Novo Testamento com sistema de governo de uma Igreja Batista. Na prática do Novo Testamento, os dons espirituais são imprescindíveis. No sistema de governo de uma Igreja Batista, a votação é elemento preponderante na condução de uma comunidade. Isso leva/levou ao equívoco de votar em funções que o Espírito Santo já capacitara para tal, mas a igreja, desprovida de um inventário de dons e seus respectivos ministérios, desconhece a dinâmica dos dons e as pessoas que assim possam exercê-los dentro da comunidade e fora dela.

Consulta

Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira. Rio de Janeiro: JUERP, 1986.
Juan Antônio Estrada. Para compreender como surgiu a igreja. São Paulo: Paulinas, 2005.

11.4.16

A DECLARAÇÃO DA CBB NO CASO DA IGREJA BATISTA DO PINHEIRO

Diante da decisão da Igreja Batista do Pinheiro (IBP), que, dentro da sua autonomia, seguiu todas as fases de um processo democrático em uma Igreja Batista, a Convenção Batista Brasileira (CBB) emitiu uma Declaração sobre o tema em quatro páginas onde o principal objetivo foi elencar documentos e preceitos estatutários para tratar o assunto.

Um tema que a IBP demorou quase uma década para pensar, discutir e orar, a Declaração da CBB gastou quatro páginas para afirmar a sua posição diante da decisão da IBP.

O tema é delicado e merece total investimento de diálogo, leituras e considerações, abordando diferentes aspectos do assunto. Por isso, a Declaração da CBB veio desprovida de alguns elementos para uma situação que demorou dez anos para chegar em uma decisão na Assembleia Extraordinária da IBP por maioria absoluta. É sabido que que a liderança pastoral da IBP esteve com a diretoria da CBB e o encontro foi cordial e respeitoso. Por esse fato, a CBB – mesmo diante da pressão de pastores e igrejas para que a mesma emitisse o quanto antes uma Declaração –, poderia elencar os argumentos da IBP sobre o tema e refutá-los a fim de legitimar a sua decisão. Isso não foi possível na Declaração.

Antes da medida político-administrativa que ela, a CBB na sua, também, autonomia possa estar tomando, seria preciso olhar o tema a partir de uma leitura pastoral e humana, uma vez que o tema é complexo e não está apenas no âmbito bíblico-teológico, mas no social, político e psicológico.

Como batistas, é possível discordar fraternalmente, mas é preciso haver o diálogo, uma prerrogativa do ser batista. Com a IBP não se trata apenas de uma hermenêutica dos textos bíblicos, embora ela seja extremamente necessária, mas também compreender as motivações que levaram a igreja a tomar a sua decisão sobre o tema. A Declaração da CBB reconhece a autonomia da Igreja Local em suas decisões, mas faltou colocar o tema dentro de uma conjuntura mais ampla, não apenas institucional. Nesse sentido há uma reação de pastores, líderes e Igrejas Batistas ao teor da Declaração da CBB.

Com a decisão da IBP, os batistas são chamados a refletir sobre o tema no âmbito bíblico-teológico – e não há consenso em relação à exegese quanto a isso, prova maior é a decisão da IBP sobre o tema –, uma vez que os textos bíblicos não tratam da homossexualidade como orientação psicossocial; por alterações comportamentais no âmbito familiar; por violência sexual ou desenvolvida como relacionamento entre adultos conscientes... Nesse sentido, é um debate e ele é premente na realidade denominacional.

6.4.16

MISSÃO E CULTURA: RASCUNHO DE UM DEBATE

As igrejas (católica/protestante), quando da colonização na América Latina, foram promotoras da mentalidade do seu tempo, ou seja, fundiu evangelho com a cultura de origem, gerando um etnocentrismo em relação aos povos conquistados. Obviamente não é possível falar de evangelho sem cultura, o próprio evangelho se dá dentro de uma determinada cultura e a Bíblia é testemunha disso. Mas na América Latina, o evangelho se deu a partir de uma cultura que, indevidamente, procurou suprimir a cultura do outro, assim como em outros lugares em que o modus operandi foi o mesmo. Enrique Dussel, quando discute o colonialismo, faz uma constatação: “o pecado original da modernidade foi ter ignorado no índio, no africano, no asiático, o ‘outro’ sagrado, e o tê-lo coisificado como um instrumento dentro do mundo da dominação norte-atlântica”. Esse processo, que Dussel chama de coisificação do outro, contribuiu na dizimação da cultura do outro.

Quando a relação se dá entre evangelho e cultura na América Latina, não poderia ser diferente a postura. Dentro desse aspecto, há um intenso debate entre Bartolomeu de las Casas e Juan Ginés Sepúlveda em torno da questão indigenista.

Para Leonardo Boff, os missionários não se deixaram evangelizar, ou seja, não se deixaram admirar pelo que estavam vendo. Se isso tivesse acontecido, “o destino do cristianismo latino-americano e das culturas autóctones” seria outro, ou seja, um “cristianismo com traços culturais próprios, distintos daqueles europeus”.

Ainda é um desafio pensar missão na América Latina, principalmente quando o tema é corolário com a cultura. Além disso, a reflexão precisa acolher a relação missão e cultura tendo como contexto a diversidade religiosa latino-americano. Autores que se dedicam a pensar sobre o tema, procuram abrir caminhos que deem conta dessa problemática em diferentes interfaces, teológica, antropológica, social e política. Em comum entre eles, os desafios de alocar a missão, como um conceito extremamente saturado na América Latina em termos de evangelização, e a cultura, que vem sendo refletida a partir de epistemologias como o pós-colonialismo.

Ainda é frequente, na tarefa missionária, desprover o outro, alvo da missão, de elementos revelacionais que são característicos do cristianismo. Dentro dessa perspectiva, cabe a consideração por uma missiologia que contemple elementos de diálogo. Os desafios são enormes, mas a necessidade que o debate impõe é premente.

Consulta

DREHER, Martin N. A igreja latino-americana no contexto mundial. 3ª ed. São Leopoldo: Sinodal, 2007, p. 33-45.

PIEDRA, Arturo. Evangelização protestante na América Latina: análise das razões que justificaram e promoveram a expansão protestante (1830-1960). São Leopoldo: Sinodal, 2006, v. 1, p. 67-113.