30.5.15

UMA IGREJA “TRADICIONALMENTE” BATISTA. SERÁ?

Saiu no jornal denominacional do Estado de São Paulo. O título da reportagem: “uma igreja tradicionalmente batista”.

Na referida reportagem a igreja se “orgulha” em ser tradicionalmente “batista” por entender algumas questões que, na sua visão, as igrejas batistas não fazem ou não são mais do jeito que essa igreja é. Daí a ênfase no “tradicionalmente”, por entender que há outras igrejas coirmãs que não são “tradicionalmente” batistas. Por isso a necessidade de serem distinguidos, diferenciados em relação às igrejas que são batistas, mas não são tradicionalmente batistas.

O que define o “ser” batista? O que uma igreja batista deveria ter e fazer? Há um parâmetro para uma Igreja ser de fato Batista? Existe uma norma, um código doutrinário que a define como Batista? Sim existe, mas isso não é uma régua eliminatória que exclui outras comunidades que não entende e não veja da mesma forma.

Para a igreja da reportagem, que se define como uma igreja tradicionalmente batista, ser batista é:

Permanecer ao longo do tempo como uma igreja realmente batista, na pregação bíblica, na preservação e busca da música sacra com excelência na letra e melodia, [...] a escola (leia-se EBD) funciona sem inovações, seguindo a agenda tradicional, que é muito eficiente, com a abertura tradicional de antigamente, em que são recitados o tema e o texto básico, e os aniversariantes são chamados à frente. São utilizadas as revistas da denominação.

Para essa igreja que se proclama tradicionalmente batista a sua definição do ser batista passa, exclusivamente, pelo modus operandi da estrutura eclesiástica.

Não apenas essa igreja, mas igrejas e pastores tem reivindicado o “tradicionalmente” para dizer que não é igual às outras igrejas. Como um sinal de identidade, igrejas como essas da reportagem buscam uma definição identitária e, se for possível (e é), desqualificar outras comunidades que não prezem pelos mesmos valores e comportamentos defendidos por uma igreja “tradicionalmente” batista.

Se o que seja “antigo” funciona como sinal de vitalidade e coerência, os batistas ingleses são os tradicionais, pois o movimento batista surge na Holanda/Inglaterra tendo sua gênese no movimento liberal inglês, eles participam dos anseios e perspectivas de sua época, ou seja, liberdade religiosa e separação entre Igreja e Estado. Esse ímpeto por liberdade levou o filósofo inglês John Locke a dizer que “os batistas foram os primeiros proponentes de uma liberdade absoluta, justa e verdadeira liberdade, liberdade igual e imparcial”. Esse intenso debate em torno da liberdade notabilizou os batistas como um grupo que lutou – a priori para a sua própria sobrevivência – contra absolutismos e posturas dogmáticas. E isso teve consequências para a sua eclesiologia, entendendo que esta deveria ser congregacional, ou seja, igrejas livres e autônomas sem vínculo com a igreja oficial. Os batistas ingleses são partidários desses ideais. Assim, seguindo uma lógica de que o antigo é o tradicional, uma igreja tradicionalmente batista deveria lutar pela liberdade em todas as esferas, política, social e teológica. Não poderia haver nenhuma tutela em termos de controle eclesiológico, político ou teológico que determinasse a dinâmica de uma comunidade.

Se a igreja da referida reportagem quer ter (e continua tendo) uma seleção musical que agrade a sua membresia; uma “escola” que siga a “agenda tradicional”, uma agenda que apenas a igreja entende, não há problema algum.

A questão é colocar a igreja como uma autêntica representante da denominação e trazer para si a marca de uma igreja que seja realmente batista por fazer e entender coisas do cotidiano de uma comunidade e seu comportamento cúltico e ético.

Sendo assim, não há nenhuma igreja que seja tradicionalmente batista.

Os batistas são fruto do seu tempo e são chamados a serem relevantes para esse tempo, assim como foram os batistas ingleses e os norte-americanos e tantos outros batistas espalhados pelo mundo. Reivindicar uma “continuidade” com o movimento batista tendo como critério maneiras de ver o culto, a liturgia e a maneira de aplicar o ensino religioso, não dá legitimidade para dizer que seja uma igreja diferentemente de outras por entender e fazer as coisas dessa ou de outra forma.

A grande marca do ser batista é a liberdade. 

17.5.15

ERA PARA SER ASSIM...

No Evangelho de Mateus há um convite para que outros possam seguir Jesus e o ápice desse convite é o capítulo 28 e seus versículos finais.

Logo no capítulo 9, 35-38, o Jesus mateano dá o tom:

Jesus ia passando por todas as cidades e povoados, ensinando nas sinagogas, pregando as boas novas do Reino e curando todas as enfermidades e doenças.

Ao ver as multidões, teve compaixão delas, porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor.

Então disse aos seus discípulos: “A seara é grande, mas os trabalhadores são poucos. Peçam, pois, ao Senhor da seara que envie trabalhadores para a sua seara”.

Jesus na sua caminhada preferiu a companhia dos mal cheirosos; das mulheres marginalizadas conhecidas como “pecadoras”; ele se sentava com gente que outro teria dificuldade de comer junto, cobradores de impostos e gente que ninguém gostaria de cumprimentar na rua. Esse era Jesus...

Ele pede para que outras pessoas (discípulos e discípulas) se juntem a ele, porque a “seara é grande”.

O seu principal foco era:

- Ensinar: ele ensinava sobre Deus, qual deveria ser a relação com ele, diferente dos fariseus e saduceus; ele ensinava sobre os relacionamentos interpessoais, de como deveria ser uns com os outros; ele ensinava sobre o perdão, condição imprescindível para a vida, e o amor como elemento norteador da vida.

- Anunciar: o reino de Deus, porque as relações com o reino de Deus era diferente de tudo aquilo que aquele povo compreendia. Se eles eram ensinados que havia um que era maior que o outro, no reino de Deus isso não acontecia. Se a eles eram ensinados que há privilégios para uns e outros não, no reino de Deus isso não existia. Ele focou sua caminhada em anunciar o reino de Deus.

- Libertar: a cura é sinal de libertação, de trazer as pessoas à vida; de dar condições para que vivam novamente e para isso era preciso haver saúde, alimentação, convívio.

Para essa tarefa, para essa missão, Jesus chama os seus discípulos no capítulo 10,1a:

         Chamando seus doze discípulos, deu-lhes autoridade

Ele chama esses homens (e mulheres) para acompanha-lo, para prosseguir na mesma missão que ele tem.

Ao chamar, Jesus não dita normas a serem seguidas; ele não estabelece um código doutrinário; ele não faz promessas. Ele faz questão de deixar claro que o seguimento significa ter uma relação profunda e pessoal com ele.

Ele chama para que essas pessoas continuassem o que ele começou, por isso ele os “envia” (10,5); diz para não ficar presos a estruturas financeiras (10,9-13); pedem para que eles se parecessem com ele (10,24-25).

Era para ser assim...

Quando chega o capítulo 28,18-20, há uma continuação da missão de Jesus, agora para todos.


Então, Jesus aproximou-se deles e disse: “Foi-me dada toda a autoridade no céu e na terra. Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei. E eu estarei sempre com vocês, até o fim dos tempos”.


Jesus tem autoridade – que no evangelho de Mateus significa algo outorgado por Deus (9,6). Essa autoridade ele dá aos seus primeiros discípulos (10,1a).

Agora, ele dá essa autoridade a todos que se tornaram (e vierem a ser) discípulos dele, ou seja, que irão continuar a missão que ele começou e agora ele espera que os que se tornarão discípulos e discípulas continuem a fazer:

- Indo (e não ide), enquanto caminha, na vida do dia a dia, façam discípulos;
- Coloquem esses discípulos em comunhão (batismo);
- Ensine esses discípulos àquilo que vocês ouviram, aprenderam e vivenciaram.

Era para ser assim...

O que Jesus queria e o que fizemos do que ele queria?

Jesus                                       Nós
Indo (todos)                           Só missionários que vão
Fazer discípulos                     Fazer membros de igreja
Comunhão (batismo)              Batismo é assumir a estrutura da igreja
Ensinar                                   Doutrinar (classe de doutrina)

Não era para ser assim...

Em que momento deixamos (ou será que ainda não aprendemos?) de ser discípulos de Jesus?