18.3.10

A IDOLATRIA DO DINHEIRO

Com o tema ECONOMIA E VIDA a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB – lançou a Campanha da Fraternidade/2010. O lema é: “vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro”. Na ocasião do lançamento, estavam representantes das igrejas históricas: luteranos, metodistas, presbiterianos, batistas e anglicanos. Por mais que alguns líderes denominacionais não queiram se envolver com este tipo de agenda, o fato é que a Igreja Católica deu um tom ecumênico para a campanha entendendo que este movimento de libertação do poder econômico opressor só é possível com a participação de todos. É a comunidade cristã que envia uma mensagem de alerta para governantes e o povo de que Deus requer adoração exclusiva, pois adorar a Deus e idolatrar a riqueza se torna impraticável.

Além da mensagem de que o dinheiro não deve ser o agente transformador das pessoas, mas Deus, a CNBB manda uma mensagem clara para os neopentecostais com sua Teologia da Prosperidade, onde ensina que o dinheiro e as conquistas são sinais das bênçãos de Deus. Enquanto isso, o sistema econômico operante marginaliza pessoas; torna seres humanos em mercadoria; fabrica a pobreza quando não há uma clara divisão de riqueza. De pensar que os bens produzidos pela indústria poderiam manter a população do planeta, mas não o fazem porque a natureza vive em função do lucro desumano e descabido. Recentemente foi divulgada uma lista dos homens mais ricos do mundo. Nesta lista constavam apenas mil pessoas. Ou seja, a riqueza do planeta esta concentrada nas mãos de um pouco mais que mil pessoas e hoje o planeta conta com aproximadamente seis bilhões de pessoas! Destino? Não! Conformismo, uns nasceram para ser pobres enquanto outros para serem ricos? Nada disso. Um sistema que privilegia o lucro e a luxuria em detrimento do próximo não pode vencer. Enquanto alguns gastam milhões em lanchas e carros importados outros morrem de fome; enquanto muitos moram em condomínios fechado outros vivem favelizados por dentro e por fora.

Há um deus hoje. Um deus opressor, desumano. Um deus que provoca mortes de inocentes e inocenta políticos corruptos; um deus que impede jovens de baixa renda estudar; um deus que favorece uma emenda parlamentar; um deus para poucos abastados; um deus que é glorificado nas igrejas neopentecostais. É o deus-dinheiro, símbolo de poder e desprezo; obsessão e descontrole.

A idolatria se faz quando serve ao deus-dinheiro e não ao Deus de Jesus. O Deus de Jesus liberta da opressão, socializa os bens (multiplicação dos pães e peixes); perdoa as dívidas (parábolas).

A CNBB esta correta quando coloca que hoje não é mais possível dizer que serve a Deus e deixar o próximo na miséria; dizer que serve a Deus e não dividir o pão.

12.3.10

A ATUALIDADE DE DIETRICH BONHOEFFER

Nas últimas postagens tratei do tema religião e as dificuldades que envolvem o atual contexto de abertura e diálogo com a globalização e o secularismo. Quando penso em religião estou colocando o Cristianismo em especial e suas dificuldades dialógicas com o mundo pós-moderno.

O distanciamento Igreja/mundo causou sérios problemas de interação com a Igreja Católica. Na passagem da Idade Média, período dominado pelo pensamento da Igreja, para a era Moderna, a Igreja não participou da separação Igreja-Estado; não forneceu subsídios pastorais para o distanciamento entre religiosidade e vida secular; não se envolveu com as demandas sociais das revoluções que estavam em ebulição. Resultado disso é que a Igreja acabou por ver esses movimentos e as mudanças como inimigos de Deus e de si mesma, ao invés de interagir e tornar-se consciência das novas posturas do mundo.

A Reforma Protestante trouxe a secularização. Os movimentos teológicos abriram um leque de pesquisas e uma diversidade de caminhos. R. Bultmann deu uma nova interpretação para o Novo Testamento, a demitização; Dietrich Bonhoeffer desenvolveu o conceito de “cristianismo sem religião”. O conceito de religião para Bonhoeffer significava dizer a institucionalidade da religião, ou seja, a velha maneira de ver Deus metafisicamente separado do mundo, a ideia do sagrado/profano. Para o teólogo alemão a religião que ignora o mundo e reivindica o indivíduo para si e proclama um espaço próprio, territorial e setorial não tem mais espaço mesmo. Neste quadro incube a todos apresentar um Cristianismo que não seja religioso, ou seja, não trate o homem pós-moderno como alguém que ignora os avanços da ciência, que não perceba a condução do mundo pelas nações e suas relações internacionais e que ainda sofre com carências espirituais!

O homem que morreu nas mãos de Adolf Hitler entende que é preciso assumir posturas pastorais não de convencimento, mas de dedicação ao homem. Bonhoeffer faz questão de frisar que Jesus nunca, e nem se quer deixou, a impressão de mostrar às pessoas que elas eram realmente piores quando na verdade eram de fato; com os ladrões na cruz ele não vez nenhuma tentativa de convencimento, até que um deles dirigiu a palavra a ele. Essa tentativa de ser mais religioso que Deus é pedantismo espiritual. É por isso que o luterano preferia a companhia de “não-crentes” à de piedosos que só falavam a respeito de Deus.

O Cristianismo que Bonhoeffer propõe é o do seguimento de Jesus, o discipulado mesmo. Cristianismo não é mera introspecção de soluções de problemas, mas é engajamento com o mundo e com o homem pós-moderno. Cristo não pertence à Igreja, ele pertence ao mundo, mas a Igreja deve desenvolver uma teologia política.

A atualidade de Bonhoeffer é no sentido de que hoje, inevitavelmente, não dá mais para explorar a fraqueza humana em nome do céu. O olhar é holístico, integral e não paliativo. A secularidade deve ser uma aliada da Igreja com sua missão no mundo, do contrário corremos o risco de cometer o mesmo erro da Igreja Católica quando ignorou a mutação social e foi perceber bem tarde que as cidades não são conhecidas pelas suas catedrais, mas pelos seus edifícios e chaminés. Não é com dominação social e discurso reacionário que a Igreja conseguirá ser portadora do Evangelho para esta sociedade globalizada.

8.3.10

A MULTIPLICAÇÃO DE IGREJAS EM IPORANGA

Em cidades como São Paulo a proliferação de igrejas é incrível. A todo o momento esta surgindo outra “igreja” com um nome bizarro, o mais criativo possível. Num bairro onde tenho parentes, há alguns anos atrás havia pouquíssimas igrejas, hoje em uma mesma rua há nove, isso mesmo nove, todas se dizendo pentecostal.

Parece que este surto esta acontecendo aqui na nossa cidade. Está surgindo igrejas de todo o tipo: do tipo divisão de uma e depois divisão de novo. Só há este dois tipos de igrejas aqui, a Primeira Igreja Divisionista e a Segunda Igreja Divisionista, ambas reivindicando o poder do Espírito Santo. Até agora não vi nenhuma igreja que tenha começado com um trabalho missionário coerente com o Evangelho, um trabalho de evangelismo mesmo de pessoas que não conhecem uma igreja, mas apenas igrejinhas surgindo em cima de igrejinhas. Pergunto em que essas novas igrejas estão contribuindo para o Evangelho na cidade? Como as pessoas irão entrar em uma dessas igrejas em que os que estão lá dentro não se dão bem e por questão de vaidade, poder ou qualquer outra coisa saem abrindo outras igrejinhas à imagem e semelhança de seus líderes? Parece que a quantidade de novas igrejas na cidade não esta abençoando em nada as pessoas, pelo contrário, as pessoas estão fazendo chacota, e o Evangelho está perdendo a credibilidade com isso. Ainda bem que neste miolo as pessoas sabem identificar quem é quem, e os batistas continuam sendo identificados como BATISTAS, como protestantes.

Historicamente a igreja que mais se divide é a Assembleia de Deus. É só olhar ao redor para ver a quantidade de assembleias de Deus que há por aí. Aqui mesmo na cidade temos duas igrejas de divisão histórica, a Assembleia de Deus Ministério do Belém (uma divisão da Primeira Igreja Batista em Belém, Pará) e a Assembleia de Deus Ministério Madureira, uma divisão que ocorreu no bairro Madureira no Rio de Janeiro. Uma do lado da outra. Recentemente chegou à cidade mais uma Assembleia de Deus, Ministério Vale do Ribeira, uma divisão da Assembleia de Deus Ministério Santos, que bagunça, dá até para confundir a cabeça. O detalhe é que essas igrejas têm o mesmo discurso: a posse do Espírito Santo. Alguns se acham donos do Espírito Santo e por isso criticam e até mesmo não conversam com cristãos batistas porque acham que os batistas não têm o Espírito Santo, e quem decidi quebrar esta regra por lá é taxado de frio, de crente geladeira, de amigo dos batistas.

Por não ter um aprofundamento bíblico sobre o Espírito Santo, nossos irmãos pentecostais acham que pular, gritar e falar a tal “língua dos anjos” é estar com o Espírito Santo. Ocorre que a Bíblia ensina que o Espírito Santo promove a paz; ensina que o seu fruto é amor, longanimidade; ensina que é ele quem proporciona a unidade da Igreja; é ele quem capacita com os dons espirituais para a edificação da Igreja e não para vaidade pessoal; a Bíblia ensina que o Espírito Santo não é de confusão, mas de harmonia; o Espírito Santo é o responsável por nos apontar para Cristo, portanto o centro do culto não deve ser necessariamente o Espírito Santo, mas Cristo.

Hoje na cidade de Iporanga ninguém pode alegar que nunca ouviu falar de Jesus Cristo. Já ouviram e agora estão vendo a bagunça religiosa que se formou aqui. O testemunho é pessoal, é de vida, é de caráter, é de identidade mesmo. Só conseguiremos falar para alguém sobre Cristo quando elas virem em nós o caráter de Cristo.

4.3.10

CRISTÃOS ANÔNIMOS

No último texto publicado neste blog, o Pr. Natanael Gabriel da Silva (doutor em Ciências da Religião pela UMESP), postou com muita propriedade um comentário em que fala do teólogo católico Karl Rahner, aliás, autor pesquisado em sua dissertação de mestrado e tese doutoral, acerca do “cristianismo anônimo”. Com isso ele coloca a questão do Cristianismo em outras dimensões, não somente aquela institucional e dogmática. Uma expressão que chamou minha atenção foi a “teologia da afetividade”, no sentido de que hoje, inevitavelmente, é preciso olhar com afeto e nem tanto com regras. Como deixei claro no comentário subsequente, o próximo texto que estaria indo ao ar seria sobre o teólogo alemão, que aprendi a ler com o próprio Natanael. Sua ideia seria analisada justamente porque, sendo um teólogo confessional, Rahner ultrapassa os limites da Igreja colocando Cristo em cada pessoa que seguisse o seu projeto humano-espiritual. Ocorre também que juntamente com alguns colegas do Vale do Ribeira estar-se pensando nos desafios que a cultura hodierna coloca diante da religião e da denominação enquanto instituição. Não somente nós, mas outros autores batistas, dentre eles Lourenço Stelio Rega em artigo publicado no O Jornal Batista com o título: “O bonde atrapalha o trânsito”, em que abre uma discussão sobre o real papel das instituições denominacionais como a CBB que corre um sério risco de cair no obsoletismo. Ainda em cima desse assunto, no dia 20/Fev realizamos a 1ª Mesa Redonda entre Pastores em Jacupiranga cujo tema foi as dificuldades dialógicas dos batistas com os paradigmas da pós-modernidade.

O sentimento religioso não vai deixar de existir, mas a religião institucionalizada deve passar por transformações, por mudanças que gerem vida. Como colocar diante da nova cultura uma postura mais afetiva, solidaria e companheira? Na expressão do Pr. Natanael isso é possível apenas quando pensarmos a teologia a partir da afetividade, do afeto mesmo, do amor; com a mudança da velha maneira de ler o mundo e nossa relação com ele.

Por mais que a comunidade seja o melhor lugar para se esta, a Igreja não é detentora da salvação. Há uma revelação de Deus que não passa pelo dogma, ritos ou declarações doutrinárias. No entender de Karl Rahner essa revelação seria um conhecimento de Deus atemático, ou seja, sem ainda sistematizar em que se vai crer. Essa dimensão no ser humano, segundo Rahner, é fruto da sua natureza transcendental. A antropologia teológica do teólogo alemão é transcendental. A experiência transcendente orienta para o mistério de Deus, portanto é um conhecimento atemático e anônimo de Deus. Com isso, segundo Rahner, todo aquele que vive valores humanos e religiosos relacionado ao projeto salvífico de Deus em Cristo Jesus é um “cristão anônimo”, sem a necessidade de conhecer tal relação entre Jesus e seus valores.

Acontece que nossa soteriologia é de gueto. Só é “salvo”, neste sentido, aquele que levanta sua mão num apelo no culto de domingo à noite. A própria postura das juntas missionárias trabalha com critérios de “conquistas” ou “ganhar” almas para Cristo!

Não esta se negando a atividade missionária da Igreja, mas os critérios adotados para se levar o Evangelho. Não se leva em consideração a revelação atemática de Deus; trabalha-se com a dialética nós/eles, como se fossemos os portadores auto-suficientes da mensagem de Cristo; ignora-se ainda que aqueles que não seguem o mesmo rito ou orientação de fé são considerados “não-convertidos”. Isso é tão real que há quem questione a vivência cristã de Zilda Arns!

Esse dualismo estabelecido em nossa postura de profano/sagrado, Igreja/mundo, obscureceu a nossa maneira de enxergar o mundo e suas possibilidades de ver Deus. Parece que estamos agindo como os discípulos que proibiram certo homem agir em nome de Jesus porque não andavam com eles.