Alonso Gonçalves
Há um consenso, nas ciências sociais, de que a pluralidade é um fator incontestável da realidade. Dito de outro modo, a pluralidade não é apenas um discurso narrativo, antes é uma maneira de ver e praticar a vida em sua diversidade e concepções. Daí uma das funções da pluralidade é favorecer a aceitação da existência do outro e de sua absoluta alteridade. Essa constatação se dá a partir do entendimento de que as relações de poder precisam ser diminuídas para que o plural seja valorizado enquanto constituinte de leitura da realidade. Desafio sempre atual na conjuntura do mundo.Assim, estamos de
acordo com Claudio de Oliveira Ribeiro (2020, p. 25) quando define o “princípio
pluralista”, objeto de alguns anos de trabalho com o tema, como “um instrumento hermenêutico de mediação teológica e analítica da
realidade sociocultural e religiosa que procura dar visibilidade a
experiências, grupos e posicionamentos gerados nos ‘entrelugares’”. O
“entrelugares” se constitui como um dos pilares do “princípio pluralista”, uma
vez que permite ultrapassar fronteiras e estabelecer pontes entre os temas da
vida. Por essa razão, que o “princípio pluralista” é uma ferramenta
hermenêutica porque “possibilita divergências e
convergências novas, outros pontos de vista, perspectivas críticas e
autocríticas para diálogo, empoderamento de grupos e de visões subalternas e
formas de alteridade e de inclusão, considerados e explicitados os diferenciais
de poder presentes na sociedade” (RIBEIRO, 2020, p. 25-26).
Os estudos feitos
por J. E. Lovelock demonstrou a complexidade e a interligação de tudo que
acontece no planeta. Essa complexidade de Gaia precisa ser respeitada na
sua inteligência. Não é nada por acaso. Nada está fora de lugar por acaso.
Nesse sentido, é preciso reconhecer que estamos imersos dentro de uma “Inteligência
que excede em muito a nossa” e agindo assim “significa render-se humildemente a
uma Inteligência mais sábia e soberana do que a nossa” (BOFF, 2009, p. 56). A
relação que precisa ter com Gaia, uma vez admitindo a sua complexidade e
inteligência, precisa ser espiritual, místico-teológico. Tendo como princípio a
pluralidade na leitura da realidade.
Não é mais
concebível que a discussão em torno do clima, das matas, rios e florestas deixe
de fora o olhar místico-teológico. Por isso, dentre todos os olhares para este
dado da realidade, o místico-teológico se encaixa dentro do princípio
pluralista porque procura possibilitar “divergências e
convergências novas, outros pontos de vista, perspectivas críticas e
autocríticas para diálogo, empoderamento de grupos e de visões subalternas e
formas de alteridade e de inclusão”. A visão místico-teológica é uma dessas
perspectiva crítica que favorece o diálogo, além de empoderar grupos como os
povos originários com sua cosmo-convivência que foi subalternizada por longos
anos, tratando-os como povos inferiores e desprovidos de conhecimento sobre a
vida. Está se provando que isso é uma falácia e não poucos estudiosos e pesquisadores
estão se dando conta disso e buscando na sabedoria dos povos originários
alternativas para lidar com o enorme problema que a ciência/modernidade colocou
o planeta.
Ailton Krenak (2020, p. 28), com um olhar plural, lembra que “a vida atravessa tudo, atravessa uma pedra, a camada de ozônio, geleiras. A vida vai dos oceanos para a terra firme, atravessa norte e sul, como uma brisa, em todas as direções. A vida é esse atravessamento do organismo vivo do planeta”. Como raízes de uma árvore que, aparentemente não se vê, mas está ali com suas inúmeras ramificações com beleza e resistência, o princípio pluralista ajuda a fazer uma leitura que seja mais próxima das reais demandas da vida.
Referências
BOFF, Leonardo. A opção-Terra: a solução para a Terra não cai do céu. Rio de Janeiro: Record, 2009.
KRENAK, Ailton. A vida não é útil. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
RIBEIRO, Claudio de Oliveira. O princípio pluralista. São Paulo: Loyola, 2020.