18.3.09

UNIVERSAL, INTERNACIONAL OU MUNDIAL: O NEOPENTECOSTALISMO IMAGÉTICO

O cenário religioso no Brasil sempre foi dinâmico. Aqui se pega de tudo. O trânsito religioso é intenso. A regra básica é a conveniência e a necessidade. Uma expressão cunhada por Eduardo Peagle (www3.est.edu.br/nepp) cabe muito bem neste quadro: é a “McDonalização” da fé. Esta geração fast food que espera tudo pronto a qualquer momento chegou também no imaginário religioso. Hoje há uma porção de possibilidades para se atender as mais diversas necessidades das pessoas.

A era da espetacularização chegou para ficar. Estamos presenciando uma briga nos meios de comunicação de gente que quer ser grande a qualquer custo. A igreja imagética e seus pastores, bispos e apóstolos televisivos, estão lutando para conquistar espaço na mídia e pessoas. Este processo começou com a Igreja Universal do Reino de Deus, fundada por Edir Macedo em 1977 naquilo que os pesquisadores do fenômeno chamam de pentecostalismo de terceira onda. Seu cunhado, R. R. Soares, desgostoso com Edir rompe com este e cria a Igreja Internacional da Graça de Deus em 1980. Agora esta havendo um novo surto, é a Igreja Mundial do Poder de Deus com seu fundador o então “apóstolo” Valdomiro Santiago. Este, com problemas de relacionamento, acaba rompendo com a IURD e criando mais uma igreja que quer conquistar o mundo. Não é por acaso que estas igrejas têm em seus nomes adjetivos como universal, internacional e mundial.

Com uma forte presença, até mesmo com sinais claros de monopólio, a IURD tem na mídia a sua mensagem de prosperidade e saúde. Não é de hoje que os neopentecostais não se importam com a questão teológica e seu estudo, porque afinal de contas isso não interessa ao povo. O que o povo precisa é outra coisa. É a satisfação imediata de seus desejos. O apelo da Universal continua com a classe média. Os acessórios para a fé – sal, rosa, água do rio Jordão etc. – ainda chama atenção.

A Confissão Positiva é mais forte na Igreja Internacional da Graça de Deus. O apelo ao demônio como explicação plausível para as mazelas da vida continua sendo válido. O uso da TV é uma arma poderosa para conquistar novos patrocinadores. Embora tenha uma visão mais inclinada para as questões teológicas, a Internacional tem em seu estoque litúrgico a manipulação do Sagrado como maneira de arrebanhar mais adeptos. A figura de R. R. Soares é centralizadora na igreja.

Quem leu e aprendeu na cartilha da Universal não foi somente a Internacional, mas também a Mundial. Valdomiro Santiago ganhou espaço na mídia com suas concentrações de milagres que tem como lema “a mão de Deus está aqui”. Com isso parece que tem arrumado briga com a Universal que chega a sentir nostalgia dos tempos em que estava começando, agora a institucionalização já chegou à IURD também. Os elementos mágicos são os mesmos, só muda a clientela, que é de baixa renda e extremamente necessitada. Isso é um prato cheio para as sessões de “curas e milagres” como sinais claros de que a Mundial é a igreja de Deus no momento. Somando a isso, há um verdadeiro culto à personalidade de Valdomiro. Assim como na Universal e Internacional, na Mundial há os que imitam claramente seu mentor e fundador na fala, postura e gestos.

As pessoas estão tendo uma imagem equivocada do evangelho devido a essas igrejas eletrônicas. Há um novo corpo doutrinário hoje: Deus abençoa quem se sacrifica, Deus honra quem persevera. Há uma nova relação com a Divindade, uma relação baseada nas necessidades atendidas – quase sempre financeira e física. Uma nova mentalidade foi inaugurada, a de que as bênçãos de Deus devem ser conquistadas e elas não veem pela sua graça.

O lema de João Batista era simples: “importa que ele cresça e que eu diminua”. O lema dos neopentecostais é: “importa que o outro diminua e eu cresça”. Entre Universal, Internacional e Mundial prefiro ficar com a igreja Local. Um lugar onde posso participar das debilidades e alegrais do meu irmão; um lugar onde a Bíblia se torne instrumento de consolo, ensino e comunhão; um lugar onde o Sagrado é solenizado e a sua manifestação é percebida com a reunião do corpo de Cristo e no partir do pão.

10.3.09

UM DEUS DE EMOÇÕES

Preguei na comunidade esses dias sobre Oséias, um dos profetas menores. Tentei chamar atenção da congregação para a empatia de Deus no texto. Aquela figura simbólica de Oséias e Gômer, os dois filhos – Desfavorecida e Não Meu Povo – como mensagem de Deus para Israel. Com uma linguagem marital, o enredo quer mostrar uma história de amor e infidelidade: Oséias e Gômer, Deus e Israel. A forma como Deus ama seu povo, o modo como ele quer tratar seu povo, é surpreendente no texto.

O ápice disso esta no capítulo 11 versos 7 e 8: “meu coração está comovido dentro em mim, as minhas compaixões à uma se acendem”. A atribuição de emoções humanas a Deus é conhecido como antropopatismo. O texto de Oséias esta cheio disso, coisa linda de se ler.

A nossa teologia foi muito influenciada pela cosmovisão grega. Os gregos não aceitavam as emoções, as quais eles chamavam de pathos, como algo bom. Quando alguém era afetado por emoções e tinha seu interior modificado, logo se acreditava que essa pessoa era fraca. Portanto para os gregos, Deus não poderia ter sentimentos e muito menos pathos, pois eles acreditavam que a Divindade não poderia sofrer influência exterior. Já que ele é o causador de tudo, como poderia alguma coisa causar qualquer emoção em Deus. Aristóteles já havia formulado: “ele é o Motor Imóvel”; os estóicos não admitiam qualquer alteração na Divindade, mas apenas na criação.

Por este fato, que a tradição cristã se apegou demasiadamente no conceito de poder de Deus, formulando ideias como onipotência, onisciência, onipresença. A Bíblia está cheia de emoções atribuídas a Deus, os profetas falam disso com uma naturalidade incrível.

O filósofo e místico judeu Abraham Joshua Heschel (1907-1972) foi um dos líderes do movimento denominado hassidismo (tradução simples: piedoso). Uma visão mística de Deus a partir de dentro e não de fora da realidade. Neste processo de contemplação, Heschel formula três caminhos: o caminho do sentimento da presença de Deus no mundo; o caminho do sentimento de sua presença na Bíblia; o caminho de sua presença nos atos sagrados. Com a clara intenção de renovar a condição humana, no que ele chama de humanização, com o intuito de despertar a profundidade dessa condição humana no homem. Neste sentido, Heschel formula não uma teologia de Deus, mas uma antropologia de Deus: “a Bíblia é mais uma antropologia de Deus do que uma teologia do homem. Os profetas não falaram tanto do interesse do homem por Deus, como no interesse de Deus pelo homem”. E neste interesse de Deus pelo homem que a linguagem é puramente emocional, pois afinal de contas somos mais pathos que logos.