8.6.08

"EU ESTOU CONVOSCO"

A presença de Jesus na comunidade de Mateus

O evangelho de Mateus aborda diversos temas. Talvez o principal ou o centro de sua mensagem seja a consciência do Cristo ressuscitado no meio da comunidade. Em tempos de perseguição, a certeza de que o Ressuscitado se fazia presente era fundamental para a identidade da comunidade e sua sobrevivência entre os judaísmos nascentes depois de 70 d.C. O fator unificador para a comunidade era a presença sentida e celebrada de Jesus.

A comunidade primitiva adotou o princípio de continuidade entre o Jesus terreno e o Cristo glorificado. Para o evangelista Mateus, as palavras de Jesus não são lembranças de um passado, mas são atuais e vindas diretamente do Ressuscitado, agora presente no meio da comunidade.

Mateus não quer que seu texto seja lido como recordações de um personagem distante e indiferente. O Jesus de Nazaré está vivo, e mais, está entre a comunidade e se dirige a ela!

Nossa chave de leitura esta em três versículos: 1,23; 18,20; 28,20. No primeiro texto o Mateus chama atenção para o nome – Emanuel, ou seja, Deus conosco. Ou, uma melhor tradução, Deus está conosco. Chegando ao capítulo 18 verso 20, outra importante acentuação da sua presença no meio da comunidade. Por coincidência ou não, o fato é que há na Mixná um texto rabínico em que dizia: “se duas pessoas estiverem reunidas e falarem da Lei, a presença (shekiná) de Deus mora no meio deles”. Para a comunidade mateana em lugar da Lei, acha-se o nome de Jesus – ele é a shekiná de Deus. O último texto, 28,20, é ainda mais enfático – “estou convosco”. Não tenho dúvidas de que Mateus quer ser lido desta forma: vendo a atuação do Ressuscitado no meio da comunidade.

A partir daqui podemos entender que a relação de Jesus com os seus discípulos reflete a relação atual dos irmãos com o Ressuscitado.

Imagine este texto, 8,23-26, sendo lido para uma comunidade que estava sendo ameaçada pelas calunias – entre elas a inobservância da Lei, e é por isso que o Jesus de Mateus cumpre a Lei (Mt. 5,17); pelas perseguições; pelo medo; e ainda com dúvidas se Jesus estava com eles ou não. Mateus diz: “ele está no barco, ele está presente”. E não é por acaso que a palavra tempestade para Mateus é seismos, perturbação. E não poderia ser “mestre, mestre estamos perecendo” como em Lucas 8,24, mas teria que ser mesmo uma oração, um grito em uníssono:“Senhor, salva-nos perecemos”. A sua palavra só poderia vir mesmo antes do milagre, diferente de Lucas 8,24-25, exortando para que eles confiassem na eficácia de sua presença e pudesse superar a “pouca fé”.

A sua presença é concretizada quando a comunidade esta reunida. Os versos 19 e 20 do capítulo 18 são fecundos nesta certeza. A sua presença viabiliza o conforto tão necessário para uma comunidade que sofria com adversidades tanto dentro quanto fora. Os irmãos reunidos encontram forças para resistir às ameaças e conduzir a vida eclesial. A pergunta de Pedro no verso 21 sobre perdão só se acha aqui no evangelho de Mateus. Perdão era uma questão de preservação. Sendo este tão essencial para a vida da comunidade não poderia ser contabilizado, mas somente doado; sem necessidade de explicações, porque aí seriam desculpas. Perdão é perdão. Tem sua natureza no próprio Deus (vs. 35).

Sua presença é indispensável para uma Igreja que sobre de falta de mística, porque no nosso imaginário religioso a concretização da presença de Deus é medida pelo número de pessoas que estão no templo num domingo à noite. A ausência de amor e perdão já não é mais sentida, sentimentos que foram vivenciados dinamicamente por Jesus de Nazaré. O “eu estou convosco” continua sendo ignorado quando uma comunidade não cultiva competição em lugar de cooperação, ódio pelo irmão em lugar de amor desinteressado, inospitalidade em lugar de hospitalidade, egoísmo em lugar do altruísmo.

A sua presença é vivenciada e celebrada, e ainda bem, na ceia do Senhor. Única maneira de perpetuar a sua presença na comunidade de fé.

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