Uma leitura de 1João 2,12-14
É
comum a seleção de alguns versículos para “dizer” algo que o texto não está
dizendo. Assim, tira-se o texto (versículo) do seu contexto imediato a fim justificar uma atitude, ação ou
discurso. Isso, num primeiro momento, é “normal”, quando se leva em
consideração a capacidade de leitura de quem faz isso. Um exemplo dessa
apropriação indevida de alguns textos (versículos) é o caso de Mateus 7,6: fala
sobre dar aos “cães o que é santo”, não lançando “aos porcos” pérolas. Já ouvi
algo assim sobre esse texto: ele serve para “evangelizar” pessoas fora da
igreja e, quando não ouvirem, não gastar “tempo” com eles, pois assim estaria
dando o evangelho (santo) aos cães (não convertidos ainda), o mesmo com as
“pérolas”.
Outro
texto (versículo) que comumente entra para essa coleção de apropriação indevida
a fim de justificar uma atitude, ação
ou discurso, é 1Jo 2,13: Pais, eu vos
escrevo porque conheceis aquele que é desde o princípio. Jovens, eu vos escrevo
porque vencestes o Maligno. Quantos sermões já ouvi em cima desse versículo
nos encontros de jovens. Vários! Cada um dando a sua “explicação” quanto aos
“jovens” e o “Maligno” no texto. Claro, o “Maligno” sendo interpretado como
“diabo” ou “satanás”.
A
carta de 1Jo está dentro de um contexto muito triste e dolorido para as
comunidades joaninas, ligadas ao Evangelho de João. A carta tem origem a partir
de um cisma, ou seja, a comunidade estava em
processo de divisão por razões que, ao longo da carta, ficamos sabendo, como
problemas teológicos e relacionais. Não por acaso que o texto de 1Jo 2,19 é
enfático: Esses anticristos saíram do
meio de nós, mas não eram dos nossos. Se tivessem sido dos nossos, teriam
permanecido conosco. Mas era preciso que ficasse claro que nem todos eram dos
nossos. Há disputas de poder
dentro da comunidade e um grupo permanece fiel
a proposta do Evangelho.
Um desses problemas, são pessoas que se entendiam investidas de poder, transformando a comunidade em hierarquias, algo que o Evangelho de João sempre rechaçou!
Um desses problemas, são pessoas que se entendiam investidas de poder, transformando a comunidade em hierarquias, algo que o Evangelho de João sempre rechaçou!
Um dos maiores temas de 1Jo é o amor e a resistência em tempos difíceis. O capítulo dois está reforçando o amor, quando a comunidade segue o exemplo de Jesus. Amar é o principal e fundamental mandamento da comunidade. Aqui, há dois caminhos o amor ou o ódio, escolhendo esse último, haverá tropeço e escuridão.
A
resistência se dá com o mundo, que
aqui, como no Evangelho de João, tem sentido negativo, ou seja, significando uma sociedade injusta, não
comprometida com a vida, em total oposição ao projeto de Deus, por isso que os anticristos pertencem ao mundo. A luta seria contra a malignidade
do mundo, ou seja, é uma luta
contra o desamor e a inverdade. É uma luta contra o ódio. O Maligno se dá com a falta de amor para com o próximo, sendo ele uma
característica do mundo – “meus
irmãos, não vos admireis se o mundo vos odeia. Nós sabemos que já passamos da
morte para a vida, porque amamos os
irmãos” (1Jo 3,13-14).
Em
1Jo 2,12-14, há uma compreensão quanto aos participantes da comunidade que
estão enfrentando esses problemas, principalmente com o mundo. Nesses versículos há uma espécie
de compreensão da vida em Cristo, envolvendo participantes da comunidade. Eles
são os filhinhos, os pais, os jovens e as crianças. Há uma
disputa quanto a compreensão desses grupos se são faixas etárias ou níveis de compreensão dos participantes
da comunidade. Além dessa dificuldade, se são ou não grupos etários, alguns
especialistas no texto de 1Jo entendem que se trata de líderes (presbíteros ou diáconos) da comunidade, os pais e os jovens. Há um consenso de que filhinhos
são os membros da comunidade. Assim, é provável que pais e jovens se tratem
de níveis de maturidade espiritual e
não classificação por faixa etária. Paulo Roberto Garcia, professor de Novo
Testamento e especialista em comunidades primitivas, em aula, demonstrou, a
partir da exegese do texto de 1Jo, que pais
e jovens não se configuram como
faixas etárias, mas sim estados de maturidade espiritual. Dessa forma, pais e jovens, incidem em níveis de
compreensão e maturidade no Evangelho.
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