21.8.09

UM ESTADO NÃO TÃO LAICO ASSIM

Quem nunca entrou numa repartição pública e não viu um crucifixo? Nas câmaras de vereadores, no Congresso Nacional, nas prefeituras, enfim, os crucifixos estão em quase todas as repartições públicas. Essa presença maciça de imagens religiosas incomodou o cidadão Daniel Sottomaior Pereira que entrou com uma representação junto ao Ministério Público Federal por se sentir ofendido com uma imagem de crucifixo num determinado órgão público, alegando a laicidade do Estado, a liberdade de crença e a impessoalidade da administração pública. Não por surpresa, uma juíza da 3ª Vara Cível Federal de São Paulo, Maria Lúcia Lencastre Ursaia, determinou que os símbolos religiosos (crucifixos, imagens, entre outros) poderão permanecer nos órgãos públicos. A decisão liminar da juíza indeferiu o pedido do Ministério Público Federal (MPF) para a retirada dos símbolos dos prédios públicos. Alegou a juíza que "o Estado laico foi a primeira organização política que garantiu a liberdade religiosa. A liberdade de crença, de culto e a tolerância religiosa foram aceitas graças ao Estado laico e não como oposição a ele. Assim sendo, a laicidade não pode se expressar na eliminação dos símbolos religiosos, mas na tolerância aos mesmos". A magistrada Maria Lúcia, entendeu que as imagens não ferem a Constituição que garante a liberdade religiosa. Parece que o Estado não é tão laico assim.

Se voltarmos um pouco na história, descobrimos que a luta por um Estado laico começa com os protestantes ingleses. Numa época em que o absolutismo religioso e político reinavam no velho continente, a Inglaterra passou pela chamada Revolução Gloriosa (1688-1689) influenciada pelos liberais da época, garantindo a superioridade da lei sobre a vontade do rei e garantindo a liberdade religiosa. É neste processo que os primeiros batistas ingleses irão dar a sua vida pela liberdade religiosa na Inglaterra como Thomas Helwys que em 1612, na prisão, já escrevia sobre isso: “a religião do homem está entre Deus e eles: o rei não tem que responder por ela e nem pode o rei ser juiz entre Deus e o homem. Que haja, pois, heréticos, turcos ou judeus ou outros mais, não cabe ao poder terreno puni-los de maneira nenhuma”. Helwys pagou com a própria vida a defesa da liberdade religiosa.

A Inglaterra foi a potência que foi nos anos que se seguiram a Revolução Gloriosa devido a laicidade do Estado. A tolerância religiosa veio acompanhada de liberdade política e expressão filosófica, além de abrir as fronteiras para o avanço do capitalismo.

A liberdade religiosa é consolidada com as colônias norte-americanas ocupadas por dissidentes do governo inglês, formada na sua maioria por batistas. Mas foi na Constituição dos Estados Unidos de 1787, que a liberdade religiosa é estabelecida entre outras como a liberdade de expressão, de imprensa etc. Uma Constituição que servirá de modelo para a novel republica que se formava aqui no Brasil.

Parece que o Estado não é tão laico assim. O Brasil, onde não há uma religião oficial, têm na sua Constituição garantida a laicidade do Estado. Mas como o país é considerado católico, é predominante a presença de imagens em repartições públicas, e logo o Cristo crucificado. É em baixo dessas imagens que sentenças injustas são proferidas; senadores têm seus processos de decoro arquivados.

É uma pena senhor Daniel Sottomaior Pereira, o Estado é laico, mas nem tanto assim. Numa coisa a juíza esta certa, a tolerância religiosa deve sempre prevalecer, mas não a preferência exagerada por uma determinada tradição do cristianismo. A laicidade do Estado não impede um pastor batista, Rick Warren, orar na posse do presidente Barack Obama; a laicidade do Estado não impede um governante pedir a Deus sabedoria e discernimento para governar. Agora a laicidade do Estado impede a supremacia de uma religião sobre a outra.

Um comentário:

Anônimo disse...

A Inglaterra não é um Estado laico. Desde o século 16, possui religião oficial, e o monarca é obrigado a jurar sua fé à religião anglicana para assumir o trono. No parlamento, há 26 lordes da igreja nomeados pela rainha. Como você pode chamar a Inglaterra de estado secular se nem mesmo no Brasil temos uma religião oficial?