1.8.12

ENTRE DISCÍPULOS E MULTIDÃO: A DIALÉTICA “EVANGÉLICA” HOJE

É típica nos evangelhos sinóticos a distinção entre multidão e discípulos. Por um lado há discípulos que seguem Jesus, e por outro há a multidão que vai atrás.

As semelhanças entre multidão e discípulos são evidentes. Tanto a multidão quanto os discípulos estão ouvido às palavras de Jesus em diversas ocasiões nos evangelhos. A multidão é amigável; ela fica maravilhada com os ensinamentos de Jesus (Mt 7,28). As diferenças entre esses dois segmentos também são claros. A multidão não tem rosto; ela é anônima; a multidão é mutante, em um momento busca Jesus em outro momento prefere Barrabás; na multidão não há uma constância; a multidão quer estar junto de Jesus, mas não quer se comprometer com ele; a multidão vai atrás de Jesus não pelos seus ensinamentos, mas pelo milagre dos pães (Jo 6). Os discípulos seguem Jesus. Mesmo não entendendo muita coisa da caminhada de Jesus e sua mensagem sobre o Reino de Deus, estão lá; mesmo dormindo no Monte das Oliveiras, mas estão lá.

Essa dialética – multidão e discípulos – me fez lembrar um livro do teólogo jesuíta uruguaio Juan Luis Segundo – Massas e minorias: na dialética divina da libertação (São Paulo: Loyola, 1975). Nesse texto Segundo trata da dimensão minoritária e massificante do Cristianismo colocando de que, originalmente, Jesus visou uma minoria – os discípulos, por exemplo – e não estava atrás da massa e nem mesmo se deixa se encantar por ela. Um livro que vale a pena ser lido por ser tão atual para os nossos dias.

Essa relação multidão-discípulos e massa-minoria são patentes no segmento denominado de “evangélico”. Parece que há uma sensação de que quando a massa está aderindo ao movimento (dados do IBGE apontou os “evangélicos” em 22,2% da população brasileira) é sinônimo de crescimento do Reino de Deus. Os pastores, bispos e apóstolos midiáticos quando atraem multidões é sinal de que Deus está “salvando” pessoas. Seria bom que fosse! A mensagem de Jesus sobre gratuidade, amor, perdão, diálogo, ou seja, os valores inegociáveis do Reino de Deus, não são vinculados nas grandes reuniões de milagres e vitória financeira. É a formação de multidão que corre atrás do milagre, da cura, não, propriamente de Jesus. Quando Jesus quis ensinar a multidão ela se dispersou, ouvir Jesus e seus ensinos não era relevante.

O segmento “evangélico” de massa está abarrotando os bolsos de pessoas que estão lucrando com a fé. Há verdadeiros impérios financeiros construídos a partir da boa vontade de pessoas que, sem arrependimento, não encontraram Jesus, mas sim Mamom (Mt 6,24).

Essa síndrome da massa tem, infelizmente, prejudicado a noção de comunidade. Geralmente a pergunta entre os pastores quando se conhecem é: “quantos membros tem a sua igreja?”. Pelo que me consta o evangelho de Cristo tem a ver com doação ao próximo; com a nossa maneira de ler a realidade; com a transformação da vida a partir do Reino de Deus. Portanto, não aceito um “evangelho” que ignora a premissa máxima da mensagem de Cristo – “buscar em primeiro lugar o Reino de Deus” (Mt 6,33).

14.7.12

TEOLOGIA(S) PARA ESTE TEMPO – DUAS PERSPECTIVAS EM DEBATE

Observações quanto ao debate entre Jung Mo Sung e Franklin Ferreira

Com o advento da chamada pós-modernidade as mudanças passou a serem frequentes. A efemeridade das coisas, dos conceitos e ideologias se tornou um fato. A dinâmica das mudanças não dá conta nem mesmo para o processo de habituação. Com a globalização – fenômeno que norteia não apenas a economia – as questões religiosas foram colocadas na pauta das discussões. Nas observações de João Batista Libânio, somos chamados, falando como teólogos, a pensar essa realidade com relevância e honestidade. Na sua vasta bibliografia, Libânio aborda as implicações dos fenômenos globalização e secularização (este último mais presente na Europa e EUA, mas já perceptível na América Latina – e no Brasil, segundo dados do IBGE os “sem-religião” saltou entre 2000 a 2010 de 4,7% para 8%) procurando apontar prospectivas coerentes para este tempo. No caso dele, um teólogo católico-romano, a dificuldade é alinhar mudanças de paradigmas com a Tradição da Igreja. Suas análises são pertinentes principalmente para enxergar onde a demanda teológica precisa ser mais contundente. As conclusões de Libânio e outros pesquisadores do tema Teologia e Sociedade concluem que a base antropológica da nova (um termo de José Comblin) cultura é pluridimensional, ou seja, é um ser humano que tem na sua subjetividade um valor em si. Daí a razão não ser mais o único caminho para a felicidade (como na Modernidade), mas ser, dentre outras, mais uma possibilidade de leitura do mundo.

Quando entramos no segmento protestante vemos que persiste o mesmo problema – lidar com as mudanças deste tempo em suas diferentes áreas. Tanto católico-romanos quanto protestantes estão discutindo as linguagens da nova cultura que é dinâmica. Quanto aos católico-romanos há uma clara distinção entre progressistas e conservadores sendo patente em reuniões (como foi na Conferência de Aparecida) e publicações. Já no universo protestante – onde a unidade nunca foi o ponto central, é fragmentado por natureza – as questões hodiernas têm sido tema de livros, palestras e debates. Duas tendências estão evidentes – conservadores (identificados, por alguns, como fundamentalistas) e não conservadores (identificados, por alguns, como liberais).

Essas duas vertentes se dá, principalmente, nas publicações. A ala conservadora tem deixado bem claro que não há diálogo com a nova cultura, mas confronto. Daí o aumento de livros sendo traduzidos que tratam da apologética numa clara mensagem de que a nova cultura precisa ser combatida – aliás, um dos livros (Em guarda, Vida Nova) do apologeta mais traduzido no Brasil, William Lane Craig, tem na capa um homem segurando uma espada – é a dimensão da defesa e do ataque. Neste mesmo intento as teologias sistemáticas estão dando a sua contribuição, reafirmando doutrinas e práticas tendo como referenciais teóricos e metodológicos teólogos norte-americanos. As teologias sistemáticas sempre funcionaram como formadora da educação teológica no País em seminários e faculdades das denominações protestantes.

Tanto a apologética quanto as teologias sistemáticas procuram estabelecer fronteiras para se pensar os rumos da cultura e seus desdobramentos em diversas áreas. A reivindicação de ambas é a posse da verdade, como discurso legitimador da fé e sua prática.

Dentro desse tema, educação teológica e a concepção sobre verdade, uma discussão me chamou atenção há algumas semanas. Ela se deu a partir de dois textos. O primeiro é de Jung Mo Sung, docente na UMESP na área de Ciências da Religião – Educação teológica e missão – um texto que foi publicado no livro Missão e educação teológica (ASTE, São Paulo). O outro texto é uma reação ao texto de Sung do consultor acadêmico de Edições Vida Nova Franklin Ferreira – Educação teológica e missão: uma resposta ao artigo de Jung Mo Sung. O texto de Sung provocou a reação de Ferreira devido o uso da Teologia Sistemática que este último escreveu com Alan Myatt. Os pormenores aqui não são de interesse pelo espaço, mas o que chamou a atenção é a clara distinção de ideias e posturas frente aos desafios da nova cultura. Enquanto Sung procura trabalhar a partir da subjetividade – um paradigma pós-moderno –, Ferreira advoga o conceito de revelação e verdade a partir de uma leitura bíblica e agostiniana. Enquanto um (Sung) defende uma educação teológica inclinada para uma nova linguagem tendo como ponto a experiência, o outro (Ferreira) pontua a relação Bíblia, revelação e Jesus Cristo como sendo unívocas.

É uma discussão interessante. As duas perspectivas são antagônicas, enquanto uma (Sung) delineia uma postura de adequação e diálogo com uma realidade plural, a outra (Ferreira) se dá a partir da igreja alegando que “quando a igreja é reformada, a sociedade é modificada”.

Diante desse acalorado debate fica evidente de que há duas perspectivas quando se trata de dialogar Igreja e Sociedade. Venho propondo uma via, a Teologia Pública, como uma alternativa a este cenário.

3.7.12

“CRESCEI E MULTIPLICAI-VOS”: OBSERVAÇÕES QUANTO AO AUMENTO DOS “EVANGÉLICOS” NO PAÍS

O IBGE divulgou dados do último censo e nele os denominados evangélicos saltou de 15,4% da população brasileira em 2000 para 22,2% em 2010. Isso é bom! Que ótimo! Isso significa que os “evangélicos” logo serão maioria – comemoraram alguns.

Em outro texto, neste blog, justifiquei – antes mesmo de Ricardo Gondim – o meu distanciamento da nomenclatura evangélico por entender que ele não cabe mais como mediador de sentido.

Mas diante dos novos dados do IBGE, gostaria de tecer algumas considerações quanto às implicações do crescimento dos evangélicos no país. Embora saiba que há pouquíssimos leitores deste blog (nem todo mundo gosta de ler bobagens – risos) aponto algumas coisas que considero pertinentes para o debate.

- A igreja evangélica cresce sem maturidade espiritual. Não há uma preocupação com um crescimento significativo na vivência cristã e seus desdobramentos em cidadania. São poucos os evangélicos, por exemplo, que esmeram em conhecer a Bíblia. Há uma hermenêutica sendo produzida na televisão, onde pessoas acatam o que o pastor, bispo ou apóstolo televisivo falou como se fosse um fato inquestionável. A falta de maturidade levam pessoas a contribuir com seus bens para que um império, erguido em nome da fé, seja cada vez mais abastecido e possa continuar na concorrência com outras denominações. Essa prática é bem mais visível no segmento neopentecostal e ainda bem que o próprio IBGE já faz a diferença entre os segmentos dividindo católicos, protestantes (históricos), pentecostais e neopentecostais.

- Não há um entendimento de que a igreja tenha um papel missionário holístico para a sociedade brasileira. As denominações não entram em acordo quanto a isso. Enquanto um está preocupado em como arrebanhar empresários para as suas reuniões, outras estão em busca de promoção própria. Não há missão, sim competição; não há uma clara concepção missionária no sentido de evidenciar os valores do Reino de Deus na sociedade, há proselitismo.

- Esses números, infelizmente, irá abastecer o marketing de alguns personagens do cenário evangélico. Os números servirão para que a Rede Globo coloque mais personagens evangélicos em suas novelas e contrate o maior número possível de artísticas do mundo gospel para a sua gravadora, a Som Livre. Isso porque o Jesus gospel está em alta. Há um comércio altamente lucrativo usando a marca Jesus. É um Jesus de vitrine, onde as pessoas se relacionam com ele através dos produtos. O Jesus gospel é badalado; ele é aclamado; pula-se nos estádios por ele; compram-se inúmeros produtos dele; há marcas de roupa, cosméticos e até mesmo celulares dele. Não é discipulado. Não é seguimento do Reino. É um Jesus para curtir.

O número de evangélicos pode até ser superior em 2050, mas tenho as minhas dúvidas se teremos uma igreja nos moldes do Segundo Testamento (NT).

28.6.12

CARTA DO PRESIDENTE DA CONVENÇÃO BATISTA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Antecedendo a Semana Batista/2012 na cidade de Ribeirão Preto/SP, o presidente da Convenção Batista do Estado de São Paulo – Pr. Manoel Ramires Filho – divulgou uma Carta em que apresenta os seus desafios e avanços na liderança da CBESP neste período.

No meu entender, Pr. Manoel Ramires deixa um legado que envolveu um direcionamento para a CBESP nas suas reais necessidades e um encurtamento da equidistância da liderança da CBESP e a pluralidade pastoral e eclesial do nosso Estado.

Por essa razão, e com a sua permissão, que compartilho a sua Carta.

Pr. Alonso Gonçalves
***
São Paulo, 26 de junho de 2012.

Estou escrevendo ao irmão e a todos os pastores de nosso Estado, depois de quase um ano de mandato, por alguns motivos em especial:

Em primeiro lugar, para agradecer o apoio incondicional recebido e pelas orações desde o inicio de nossa gestão, sem o que seria muito difícil chegar onde temos chegado.

Jamais sozinho, mas juntos temos trabalho no sentido de mudar a maneira de ser Convenção.

Em segundo lugar, para afirmar que pela graça de Deus, apoiado por minha família, igreja, diretoria, GPVE e por todas as áreas da CBESP e executivos, pudemos completar

algumas tarefas a que nos propomos e iniciar outras que a próxima diretoria deverá dar continuidade. Dentre elas enumero algumas:

1 – A mais importante, ouvir pastores e líderes através de encontros, viagens, visitas às Associações e e-mails, e relacionando as críticas e sugestões num total de 12 páginas.

2 – Reunião com as áreas a nível de detalhes, apresentando as críticas e sugestões e discutindo temas importantes. No próximo jornal Comunhão sairá um questionário que fiz ao pastores Valdo e Lourenço, dando assim uma resposta ao que ouvi.

3 – Sistematizar o Estatuto e Regimento Interno. Nosso problema não é a estrutura que existe há no mínimo dez anos, mas o fato de não ser colocado em prática. Temos contado com o trabalho incansável do GPVE (Grupo de Planejamento e Visão Estratégica). Alguns exemplos:


a) Um Conselho Geral que realmente acompanha e supervisiona o trabalho das Áreas, dando trabalho para cada membro da diretoria e para todos os membros do Conselho, inclusive para os presidentes de Associações. O relatório agora é enviado para cada conselheiro, com 10 dias de antecedência, para ser discutido nas Câmaras Setoriais.

b) Capacitação para os executivos, staff e todos os conselheiros.

c) Empenho em democratizar a escolha dos próximos conselheiros, através de reunião com a comissão de renovação de áreas e com ênfase na qualificação. Mudança de mentalidade visando uma visão sistêmica e sinérgica, inclusive na busca constante do estreitamento das relações interinstitucionais.

d) Revisão e ampliação do Manual para a Semana Batista.

e) Construção do primeiro Planejamento Estratégico global com macrodiretrizes, e que deverá ficar pronto em novembro próximo, visando gestão em todas as áreas por princípios de administração.

f) Em elaboração pelo GPVE, instrumentos de avaliação para as áreas, o Regimento Operacional e o Manual para Confecção de Relatórios.

4 – Em análise pelo GPVE os resultados do Censo Batista, cujos resultados serão base para o Planejamento Estratégico da CBESP. Duas providencias foram aprovadas na última reunião do Conselho Geral, dada a sua urgência:


a) Autorização para o GPVE planejar e buscar ações que visem a capacitação urgente de pastores, líderes e igrejas, na busca de fortalecer o desenvolvimento da membresia das igrejas à maturidade e serviço cristão, como um dos meios de buscar solução para diversos dilemas apontados no Censo Batista.

b) O CETM, com apoio do GPVE, buscará meios de orientar os Seminários e Instituições de formação Teológica Batista do Estado, para que inclua em seu processo de ensino a formação de pastores e líderes, de modo a serem ministros que saibam lidar com o poder, que desenvolvam liderança descentralizada e cuidem de seu desenvolvimento pessoal, familiar e da igreja.

5 – Realização do Congresso de Eclesiologia, o inicio de uma profunda reflexão sobre a doutrina da igreja em nosso Estado, com elaboração de um documento para discussões futuras. Novos congressos deverão ser realizados para atender as macrorregiões.

Meus prezados e queridos irmãos, muito foi realizado, mas muito ainda está por ser feito. Todos os pedidos, sugestões e críticas foram encaminhados, e estão registrados para serem passados à nova diretoria, em especial, aquilo que estiver pendente de uma resposta.

Teremos uma grande Semana Batista em Ribeirão Preto, num local excelente, com mudanças grandes em relação às anteriores. Oremos para que a Assembleia tenha a direção de Deus, inclusive na eleição daqueles que darão continuidade ao processo iniciado.

No amor de Cristo.

De seu conservo e amigo,

Pr. Manoel Ramires Filho

21.6.12

I CONGRESSO DE ECLESIOLOGIA - CBESP

Alonso Gonçalves[1]
Membro da Comissão do I Congresso de Eclesiologia (CBESP)

Pensar a igreja é sempre um desafio, ainda mais neste tempo em que assuntos como crise institucional, secularização e globalização são recorrentes na sociedade. Aliar a identidade denominacional e relevância na sociedade é um dos grandes desafios da igreja contemporânea. O I Congresso de Eclesiologia promovido pela Convenção Batista do Estado de São Paulo (CBESP) aceitou este desafio e procurou promover a reflexão, levantar questionamentos e provocações sobre um tema tão peculiar para os batistas – igreja.[2]

Para gerar uma reflexão que não fosse tendenciosa, a escolha dos palestrantes contou com Israel Belo de Azevedo,[3] Isaltino Gomes Coelho Filho[4] e David B. Riker.[5] Cada um abordou alguma faceta da realidade eclesial. Israel falou sobre O que é igreja e sua missão em relação a Deus, o mundo e a ela mesma; Isaltino O governo da igreja e as lideranças eclesiásticas; Riker O culto e os seus princípios. Dentro de cada perspectiva as palestras foram direcionadas a fim de instigar, refletir e provocar reações. A tarefa da Comissão[6] do I Congresso de Eclesiologia foi colher as palestras e pontuar temas que são pertinentes à realidade eclesiástica do Estado de São Paulo. Dentro desse intento apresento minhas reações ao que foi abordado e aponto temas que merecem ser considerados, a partir de observações pessoais.

Israel Belo de Azevedo abordou temas que mexem com alguns paradigmas que estão impregnados no imaginário Batista como: disciplina na igreja; liderança feminina; recebimento de pessoas como membros que vivem em união estável; cooperação Batista; prospectivas quanto ao futuro da CBB. Israel mostrou de como os Batistas, ao longo da sua história, preservou os seus princípios e esses não podem ser esquecidos e nem mesmo desvirtuados, embora alguns já tenham sido como foi o da autonomia. A natureza plural dos Batistas, a facilidade de assimilar coisas contemporâneas (como foi o caso da liturgia) e a autonomia da igreja local, são pilares de uma identidade Batista que não podem ser ignorados quando se entra em diálogo com a sociedade. Por outro lado a Missão Integral (= Reino de Deus) da igreja precisa ser uma prioridade. No seu entender não cabe mais a igreja querer fazer ação social visando o proselitismo. Essa insistência se dá devido ao landmarkismo continuar vivo no substrato Batista.

Isaltino Gomes Coelho Filho abordou as diferentes compreensões que o Novo Testamento traz sobre a figura do pastor. Fazendo uma leitura bíblica sobre os conceitos de bispo, presbítero e pastor, Isaltino demostra que a liderança eclesiástica no Novo Testamento é plural, nunca definida plenamente, embora haja elementos que indiquem uma institucionalização da função pastoral nas Cartas Pastorais; a liturgia recebe influencia da sinagoga havendo, portanto, no Novo Testamento a essência do culto e não a imposição de uma única maneira ou forma de cultuar.

David B. Riker pensou o culto e seus princípios. Embora fosse nítido a sua dificuldade em traçar uma linha argumentativa para definir o que seja culto pela perspectiva bíblica e teológica, o reitor do STBE procurou definir culto a partir de conceitos etimológicos e não de ajuntamento tanto no Antigo quanto no Novo Testamento. Assim procedendo, ele quis delinear três momentos do culto – o que cultuar, a quem cultuar e como cultuar. Fazendo uma leitura principalmente dos conflitos enfrentados por Paulo em Corinto, o preletor alegou, dentre os seus princípios gerais do culto – que contou com o amor, edificação, reverência, inteligibilidade – o princípio que provocou questionamentos foi o da autoridade, onde o preletor defendeu, com base em 1Co 11, que a proeminência no culto deve ser do homem e a mulher sendo coadjuvante.

De um modo geral as reflexões serviram para fomentar ideias e começar a discutir conceitos e problemas. A iniciativa da liderança da CBESP foi ótima, pois criou uma oportunidade de se ter um fórum de debates com temas que, de fato, estão na agenda das igrejas.


Importante:
O texto com as considerações e reações da Comissão sairá em breve.

[1] Pastor da Igreja Batista Memorial em Iporanga/SP – Vale do Ribeira.
[2] Evento que ocorreu no dia 16 de Junho no Salão Nobre do Colégio Batista Brasileiro – Perdizes/SP.
[3] Pastor da Igreja Batista em Itacuruçá/RJ.
[4] Pastor da Igreja Batista Central de Macapá/AP.
[5] Reitor do Seminário Teológico Batista Equatorial, Belém/PA.
[6] Os membros dessa Comissão são os pastores: Alonso Gonçalves,  Antonio Lazarini Neto e Carlos Eliseu Dias da Rocha (Relator). 

13.6.12

ECOLOGIA E PROTESTANTISMO

Certa vez ouvi de um jovem membro de uma Igreja Batista de que foi visitar outra igreja e lá o assunto era sobre o lixo e de como as pessoas deveriam cuidar do meio ambiente. Isso foi no ano de 2004, aproximadamente. O que mais me impressionou no rapaz foi o comentário dele: “por que vou a uma igreja para ouvir sobre o lixo e o meio ambiente? Igreja não é lugar para se falar disso!” Infelizmente a compreensão daquele jovem de que meio ambiente e igreja não tem qualquer relação é compartilhada por muitos. Por alguns motivos.

A Era Moderna, patrocinada por Bacon e Descartes quando coloca a relação do ser humano com o mundo sob o paradigma de sujeito-objeto, inaugurou uma ideologia, a de que a ciência triunfa sobre a natureza, ignorando os seus limites e espaços. A proposta foi subjugar a natureza ao conhecimento científico, não se importando com as consequências. A questão ecológica é deixada de lado e o mundo é objeto a ser desvendado. Teve seus resultados benéficos, mas muito mais maléficos como presenciamos hoje.

O protestantismo, de modo geral, é fruto da modernidade, portanto, compartilhou dessa ideologia. Com a ênfase no indivíduo e o processo de dessacralização do mundo (planeta Terra), este passou a ser visto como útil apenas. A natureza passa a ser matéria-prima para a atividade humana. Decorre disso, a completa omissão para com a Criação e a falta de uma espiritualidade ecológica. O protestantismo, como um dos protagonistas do sistema capitalista (analises feitas por Weber), contribuiu e muito para o atual sistema exploratório da Terra, quando adotou a cosmovisão utilitarista ao invés da bíblica que apresenta a noção de mordomia e corresponsabilidade para com o meio ambiente.

A atividade econômica do sistema globalizado capitalista quando se atém ao lucro e não respeita a diversidade da vida, a formação geográfica natural de um lugar, a nascente de um rio, a biodiversidade do planeta, está ignorando a presença de Deus na Criação, além de negar, peremptoriamente, de que o ser humano não é parte integrante desse ecossistema.


Soma-se a isso a noção salvacionista do protestantismo que prega, canta e incuti apenas o céu como redenção para o gênero humano enquanto as catástrofes ambientais são vistas como sinais da segunda vinda de Cristo. Como decorrência disso, o protestantismo ignorou completamente uma espiritualidade integral do ser humano, concentrando apenas na leitura bíblica como devocional e na oração. É por este fato que no mercado editorial evangélico há escassez de livros que tratam sobre o tema da Ecologia, porque o assunto foi deixado de lado por anos e outros, totalmente triviais, tiveram a proeminência.

O mundo para agora nos próximos dias para discutir o desenvolvimento sustentável na cidade do Rio de Janeiro, é a Rio+20. As Nações Unidas quer dar um rumo para o planeta e chama a todos para o diálogo para traçar metas, abrir caminhos para um mundo onde o meio ambiente seja respeitado e valorizado como fundamento da Vida. Nas diversas palestras, discussões, debates e diálogos haverá um desses pastores televisivos em algum encontro? Acredito que não. Até porque a sociedade não conta ainda com uma Teologia Pública promovida por evangélicos (se é que essa nomenclatura ainda cabe aqui). É claro que teólogos como Leonardo Boff, a maior autoridade em meio ambiente no Brasil e fora dele, estará presente, juntamente com Marina Silva que, concretamente, não tem a sua denominação pentecostal envolvida, mas porque ela é uma militante do clima no país.

É uma pena que ainda não tenhamos o protestantismo envolvido de corpo e alma na defesa do meio ambiente. O que já existe ainda é muito paliativo.

8.6.12

O PASTOR – UMA PEQUENA TRAJETÓRIA DE UM CONCEITO

A diversidade, em todos os âmbitos, do Segundo Testamento (2º Test = NT) é senso comum entre os pesquisadores da Teologia Bíblica.
A cristologia tem suas variações dependendo do lugar em que as Boas Novas (proclamação – kerigma) chegam. Dois contextos importantes na leitura da cristologia do 2º Test se dão em ambiente judaico (uma cristologia de cunho escatológica) e helenista (uma cristologia mais cosmológica). Sem falar na cristologia de Hebreus, das Pastorais e do Apocalipse, que tem uma diversidade de conceitos e ideias incrível.

Na questão eclesiológica não é diferente. O 2º Test traz uma pluralidade quanto à organização, desenvolvimento e liderança dessas comunidades, ocasionando um ambiente rico e profícuo de entender e viver como igreja. Quem faz um trabalho competente e imprescindível neste sentido, é Jürgen Roloff (erudito alemão) com o seu texto A igreja do Novo Testamento, onde ele aborda as diferentes matrizes da eklésia do 2º Test.

No caso do pastor, o 2º Test apresenta uma evolução no conceito dependendo da situação (Sitz im Leben) em que o texto está inserido.

Nos sinóticos, por exemplo, Jesus pastoreia o povo de Israel. O seu cuidado se dá porque aquele povo era como ovelhas que não tinham pastor (Mc 6,34). Um povo abandonado pela classe religiosa, marginalizados pela ala mais radical da religião judaica, o farisaísmo; um povo que estava à espera do Messias e nutria a sua esperança nele. A esse povo Jesus se dá como pastor, como alguém que tem compaixão da multidão.

Em Paulo, o pastor é chamado por Deus para ensinar a comunidade, para ser despenseiro dos mistérios de Deus (1Co 4,1-2); para consolar, exercer cuidados como os de pai e mãe (1Tess 2,7 e 11).

É claro que Jesus não ensinou a hierarquia. Aliás, ele mesmo deu o exemplo quando lavou os pés dos discípulos. Nele somos todos um. Paulo irá completar isso em Gl 3,26-29 de que em Cristo não há homem ou mulher, escravo ou livre. Sendo assim não haveria distinção; não há quem seja mais importante que outro. É claro que essa concepção foi compreendida de diferentes maneiras dentro da diversidade do 2º Test. Nas igrejas paulinas o líder era uma figura carismática, exercendo sua liderança a partir de pressupostos espirituais e não institucionais. Razão porque ele tinha em cada cidade pessoas que abrigavam a igreja em sua casa (conhecidas como igrejas domésticas). Seus auxiliares no ministério pastoral foram Tito e Timóteo e, não sempre mais ajudou Corinto, Apolo. Nas comunidades domésticas a liderança era variada e não havia diferença entre homem ou mulher. Paulo reconhece a liderança de Febe na igreja de Cencréia, de Evódia e Síntique em Filipos e Áquila e Priscila como obreiros de redobrada dignidade.

Já em Jerusalém a liderança era sinagogal, um conselho de presbíteros que exercia o pastoreio principalmente na cidade de Jerusalém.

Quanto às Cartas Pastorais a função do pastor ou bispo é institucionalizada. Ele agora recebe esse ofício pela imposição de mãos e tem a responsabilidade de proteger a comunidade de ataques internos (disputas entre irmãos) e externos (as heresias). A ênfase recai sobre a “sã doutrina” como um depósito que precisa ser protegido a qualquer custo. Essa perspectiva que predominou no conceito de pastor, principalmente o capítulo três de 1Tm que nem mesmo Paulo (para aqueles que advogam que as Pastorais são da pena de Paulo) cumpriu todas as exigências ali expostas.

Com a Reforma Protestante a figura do pastor ficou reduzida ao ensino e a ministração das ordenanças (sacramentos). Pastor deixa de ser um conceito polivalente para conotar a uma pessoa.

Pastor tem a ver com a missão da igreja; pastor é sinônimo de cuidado e não de título; pastor não tem gênero, é tanto homem quanto mulher.

Olhemos para o supremo pastor, Jesus.