29.8.18

OS BATISTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO APOIAM CANDIDATO?

Não é de hoje que os evangélicos no Brasil abandonaram aquela velha concepção de separação igreja-mundo, ou seja, a igreja é o lugar do bem, do povo santo e achado por Deus; o mundo é o lugar do mal, do povo perdido. Logo, quem está na igreja (lugar mesmo, templo), está protegido e guardado por Deus e quem está no “mundo”, está abandonado por Deus, perdido mesmo. Além disso, a concepção moral se dava na esfera individual, ou seja, pensava-se nas “coisas do céu”, e as “coisas terrenas” não interessavam muito. Quando “Jesus voltar”, tudo isso vai acabar e nós, os salvos e protegidos pela igreja, seremos levados e tudo isso de ruim vai ter um julgamento fulminante de Deus. A escatologia era extremamente pessimista e vingativa, da parte de Deus, é claro. Essa escatologia mudou. Hoje, o melhor “dessa terra é meu” e quem antes pregava contra a famigerada “teologia da prosperidade”, já editou Bíblia “Batalha Espiritual e Vitória Financeira”.

Há vários estudos dando conta da mudança desse comportamento nas últimas duas décadas no universo evangélico. Mudanças impulsionadas pelos (termo inapropriado e ambíguo) “neo-pentecostais” que aliou igreja e partido político de maneira pragmática e midiática. Ricardo Mariano, por exemplo, estudou esse processo muito bem no seu texto Neo-pentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. Outro pesquisador, Paul Freston, demonstrou como o voto dos evangélicos sofreu mutações ao longo do processo democrático do país e como as mentiras ditas por evangélicos ajuda ganhar votos em eleições majoritárias.

Hoje, a mensagem da igreja da “salvação da alma”, embora ainda esteja no jargão evangélico como um discurso de atração e abandono de uma vida pregressa para uma vida santa, não corresponde à realidade no seu âmbito político. Se antes uma das principais proibições se dava com o famoso “crente não se mete em política”, agora essa máxima virou fumaça. Crente se mete em política e, além de tudo, voto em crente. É dessa maneira que a bancada evangélica na Câmara Federal não diminui, só aumenta. A discussão quanto ao espaço público e sua disputa com outras expressões religiosas, não é nosso tema aqui. Quanto à isso há estudos muito bem documentados e trabalhados jornalisticamente. Interessados, indico o texto de Magali Cunha: Do púlpito às mídias sociais: evangélicos na política e ativismo digital (Curitiba: Primas, 2017).

Dentro desse quadro maior, os batistas, notadamente da Convenção Batista Brasileira, a CBB, parece que resolveram apoiar candidatos formalmente. No plano majoritário, Presidente da República e Governador do Estado, não há uma expressão maior por parte de lideranças da denominação, embora os apoios sejam velados. No contexto regional, isso ficou mais visível, principalmente depois de 2010, no Estado de São Paulo, quando a Convenção Batista do Estado de São Paulo tentou impulsionar a candidatura do pastor José Vieira Rocha, do Partido Social Cristão (PSC), quando este tentou ocupar uma cadeira na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. O pastor não obteve êxito.

Parece que nessas eleições 2018, para o legislativo do Estado de São Paulo, lideranças batistas do Estado querem reeleger Marcos Damásio (PR). Como pastor, já tive a oportunidade de estar com o deputado em um encontro de pastores. Na ocasião, ele conversou com os pastores, mas não pediu apoio formalmente na sua fala, mas nos bastidores do encontro, isso foi ventilado.

Os batistas se notabilizam por não fazer campanha para o candidato “A” ou “B”. Não é possível uma Igreja Batista, que entenda os Princípios, induzir os membros a votarem em candidatos que a liderança pastoral considera o mais viável, na sua opinião. Recentemente, um pastor batista no Rio de Janeiro chamou à frente da igreja um candidato à Presidente. Depois da repercussão negativa, ele veio à público procurar amenizar sua atitude.

Diante de um quadro político que inspira cuidados e atenção, onde a polarização ganha expressão raivosa nas redes sociais, o comprometimento de uma igreja local (Batista) ou uma denominação, ainda que seja na sua fração estadual, é de extrema responsabilidade. Com o apoio aberto, se acontecer, compromete-se com as pautas do candidato em questão. Uma Igreja Batista, ainda que isso seja possível, não deveria atrelar a sua trajetória a nenhum candidato, uma vez que cada igreja é autônoma e o pastor da igreja não tem nenhum direito de exigir isso dos membros da comunidade. Se acontecer algo assim em uma igreja local, isso já seria agravante no sentido de violar, pelo menos, dois princípios dos Batistas, separação entre Igreja e Estado e Liberdade de Consciência e Opinião. Uma denominação, na sua fração estadual, torna ainda mais inadmissível algo assim. Isso acontecendo, o candidato está dizendo que, de alguma maneira, está com os “batistas do Estado de São Paulo” e que eles, os batistas, estão acompanhando o candidato e concordando com ele, o que se constituí inverossímil, até mesmo pela própria estrutura e sistema denominacional. Seria apenas uma maneira de chamar a atenção do eleitor “evangélico” para a condição de um candidato que recebe ou que está junto a um dos poucos segmentos da Igreja Brasileira que, ainda, usufruiu de alguma respeitabilidade no cenário evangélico brasileiro? Talvez...

Em tempos como esses, é bom lembrar um pastor batista que tem a sua memória preservada pela admirável maneira como lidou com as questões da denominação, mesmo quando discordava dela. Estou me referindo à Isaltino Gomes Coelho Filho. Ele dizia: “Não imponho candidato às minhas ovelhas. Tenho percepção política, e minhas convicções são claras. Mas são minhas. Não as imponho. Meu rebanho não é minha propriedade”.

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