10.10.23

LIMINAR AFASTA PASTOR BATISTA DA LIDERANÇA DA IGREJA

“A Convenção Batista Brasileira (CBB) é o órgão máximo da denominação batista no Brasil. É ela quem define o padrão doutrinário e unifica o esforço cooperativo dos Batistas do Brasil”.

Esse enunciado está no documento da CBB que tratou de um Concílio Decisório envolvendo a Igreja Batista da Praia do Canto (Vitória/ES) e um pequeno grupo de pessoas (25) que foram até a justiça para retirar da liderança da igreja o pastor Usiel Carneiro, que tem o apoio da maioria dos membros da igreja [para saber mais].

A partir de uma concepção equivocada quanto aos limites da liderança da CBB e dos conciliáveis que emitiram o documento “Decisão do Concílio Decisório”, o juiz da área cível expediu uma liminar determinando o afastamento do pastor da liderança da igreja tendo como base este documento. Isto porque ele entendeu que a CBB tem a legitimidade da última palavra para determinar se uma igreja é ou não é Batista. O juiz, desconhecendo o funcionamento de uma Igreja Batista (o magistrado deveria consultar alguém que entendesse sobre a denominação Batista antes de proferir a liminar), julgou que a CBB é uma espécie de instituição-sede das “igrejas Batistas” que funciona a partir de um sistema episcopal ou hierárquico. Isso se deu porque no preâmbulo do documento diz textualmente que a CBB “é quem define o padrão doutrinário”. Uma vez que é ela, a CBB, quem define a doutrina, e ela acolheu as alegações do grupo litigioso, o juiz entendeu que a CBB está certa em relação aos requerentes.

Quem foi que deu essa prerrogativa para a CBB? Quando foi que a CBB passou a ser aquela entidade que “define o padrão doutrinário” dos batistas no Brasil?

Não é de hoje que boa parte da liderança da CBB quer seguir os mesmos passos da Convenção Batista do Sul dos EUA: ser um órgão escrutinador para dizer quem é e quem não é “batista”. Uma instituição paraeclesiástica quer arrogar para si a palavra final quanto a temas doutrinários de uma igreja local. Alguns alegam que isso é possível porque a CBB tem uma “Declaração Doutrinária”. Será que é isso mesmo?

É importante lembrar a CBB dos seus limites:

1. Como já dizia o saudoso pastor Isaltino Gomes Coelho Filho, “a Declaração Doutrinária da CBB não é normativa, mas indicativa do que a maioria dos batistas creem”. Caso fosse normativa, nenhuma igreja poderia ter pastores “calvinistas”, uma vez que a Declaração Doutrinária não é “reformada”.

2. A Declaração Doutrinária da CBB não funciona, precisamente, como um mecanismo de uniformidade doutrinária. São os Princípios Batistas cotados como fundamentais para o modo de ser batista e não o sistema doutrinário, uma vez que os batistas não têm, na sua história, nenhum credo ou confissão que possa ser considerado como definitivo para a maioria dos batistas. Não será a CBB quem irá mudar isso.

3. O Estatuto da CBB, em cláusula pétrea, registra: “A Convenção reconhece como princípio doutrinário a autonomia das igrejas filiadas, sendo as recomendações que lhes são feitas decorrentes do compromisso de mútua cooperação por elas assumido”. Onde está escrito que é a CBB “quem define o padrão doutrinário”? Consta aí que é a igreja local e jamais a CBB. E não poderia ser diferente, uma vez que a tradição Batista tem na igreja local o seu início e o seu fim e não um órgão cooperativo como é a CBB.

4. A Convenção Batista Brasileira não tem como função ser a “guardiã da doutrina” entre os batistas. A CBB não tem competência burocrática e muito menos legitimidade bíblica por uma razão muito simples: a CBB não é uma igreja. Por esse fato, não pode usurpar a autoridade da igreja local e decidir por ela. Já dizia 𝐀. 𝐁. 𝐋𝐚𝐧𝐠𝐬𝐭𝐨𝐧, um dos autores que mais compreendia a denominação em 1933: “A Convenção Batista Brasileira não é uma super-Igreja ou espécie de Igreja-mãe, mas simplesmente uma organização auxiliadora das Igrejas locaes”.

5. O critério de verificação quanto a temas bíblicos e sua aplicação hermenêutica se dá, exclusivamente, pela igreja! 𝐉𝐨𝐡𝐧 𝐋𝐚𝐧𝐝𝐞𝐫𝐬, influente professor no Seminário Batista do Sul do Brasil (Rio de Janeiro) quando pesquisou os Princípios Batistas e escreveu um livro com o título “Teologia dos Princípios Batistas”, assegurou: “Em caso de diferença de interpretação bíblica, cada igreja batista tem que ler e interpretar a Bíblia para si mesma. De acordo com este princípio, cada igreja define sua própria maneira de proceder em questões duvidosas”.

Com isso, fica difícil entender como que uma liderança assume o “órgão máximo da denominação batista no Brasil” e não compreende os seus limites, atribuições, espírito cooperativo e não belicoso e desconhece o básico da tradição Batista quanto ao alcance da Declaração Doutrinária da CBB.

Estamos diante de um fato curioso e, no mínimo, desonroso para os batistas brasileiros: um juiz entendeu que a CBB é um órgão julgador por excelência em disputas entre membros de uma Igreja Batista e, uma vez tomada uma decisão em um Concílio Decisório que não seguiu todos os ritos previstos, o juiz entendeu que a CBB tem autoridade para desconsiderar a vontade de quase 400 membros que caminha apoiando o seu pastor e não desistirão de recorrer de uma decisão que foi induzida ao erro [resposta do pastor da IBPC].

13 comentários:

Anônimo disse...

Excelente texto. A situaçõ, que chamo de " acao medieval", ocorrida contra a IBPC além de desreipeitar seus membros e participantes, reforça a ideia negativa e distorcida que muitos da sociedade têm acerca das igejas evangelicas e do evangelho.

Anônimo disse...

Não cabe à justiça laica decidir algo na esfera religiosa e doutrinária.

Anônimo disse...

Infelizmente, a motivação do grupo de 25 pessoas foi política.

Fernanda Nunes disse...

Levando em consideração que “a briga” é de 25 contra 500, porque a Convenção deu VOZ à minoria? Por que a Convenção ao invés de decidir que passará a ser a dona/gestora desta igreja, por causa de 25 pessoas, ao inves disso nao EXPULSA esta igreja de sua associação, pra que ela siga caminhando com seu pastor e os demais 500. Por que será?

Anônimo disse...

Politicagem e evangelho não combinam, pelo contrário desmoralizam as boas novas, ao meu vê à igreja já que a maioria apoia seu pastor deveria sair da CBB até pq. são autônomas em decisão quem poderia a convenção.

Anônimo disse...

Justiça laica julgando sem conhecimento.

Anônimo disse...

Quando da expulsão da Igreja Batista do Pinheiro em 2016, o Pr. Alonso Gonçalves disse que aquela decisão era um tiro no pé. Diante do silêncio de muitas pessoas e lideranças o tiro voltou a acontecer. Toda solidariedade a IBPC.

Anônimo disse...

Sempre entendi que a Convenção (CBB) é "serva" da igreja e não a igreja "serva" da Convenção isto é: não lhe cabe ditar padrões doutrinários para a igreja. Argumento suficiente para derrubar essa liminar.

Anônimo disse...

Nesse tempo de confusão de interpretação de uma série questões que envolvem a nossa sociedade, quando uns se auto intulam representante de segmentos ligados ao povo evangélico, é que levou essa interpretação totalmente equivocada desse magistrado, por desconhecimento latente do funcionamento de uma igreja batista. Que esse episódio sirva de ensinamento para um grupo de pastores que se julgam donos de igrejas (me refiro somente as filiadas a CBB), quando promovem mudanças no estatuto buscando o auto benefício, tirando força do forum máximo da instituição, que é a assembleia geral e também para os membros estarem atentos, para se deixarem levar por conversas sedutoras e manipuladoras desses líderes. A igreja local é livre, é autônoma para tomar as decisões, desde que sejam respiradas as orientações estatutárias. Órgão externo nenhum podem interferir nas decisões da congregação, desde de que sejam elas tomadas observando plenamente o estatuto.

Anônimo disse...

A CBB é o STF dos Batistas, cabe a ela decidir questões desse tipo. O Juiz agiu corretamente. Se a maioria local apoia o líder contencioso, que saiam com ele para organizar outro aprisco.

Ilton Santana disse...

Olá pastor,

Realmente é estranho a CBB se colocar como "órgão máximo da denominação batista no Brasil" e também como "quem define o padrão doutrinário". Ela apenas reúne as igrejas que subscrevem sua declaração doutrinária. No caso da igreja não mais fazê-lo, caberia tão somente à CBB o desligamento desta igreja.

O que entendi pelas notícias é que a igreja começou a caminhar numa via mais liberal e progressista (inclusive aceitando a prática homossexual); isso daria legitimidade à parte reclamante. Uma vez que o próprio Estatuto deles dá razão à parte fiel às doutrinas batistas, mesmo sendo a minoria.

Se estou errado em algo, pr favor, esclareça.

Ilton Santana (Pastor batista)
https://teologiaeoutrascoisas.wordpress.com/

Anônimo disse...

Há mais de 50 anos na Denominação Batista, Aprendi que em seus Estatutos, devem constar que havendo desvio de fidelidade à Doutrina e Princípios Batistas, a minoria que seja fiel, permanecerá no seu direito de dar continuidade naquilo que crê.

Prof. Valdinei disse...

Este episódio é a demonstração dos novos tempos que vivemos, a CBB se arroga no direito de intervir na administração de uma igreja, por falta de afinidade política do seu líder(adoração ao mito).