22.2.18

BILLY GRAHAM: HOMEM DE DEUS, MAS TAMBÉM DA WHITE HOUSE

O universo evangélico recebeu a notícia do falecimento de Billy Graham (1918-2018) com um certo ufanismo e regozijo. Afinal de contas, ele já estava com 99 anos e havia quem esperasse que pudesse completar 100 anos, um século de vida. Uma marca indelével para um ser humano, com certeza. A mídia, quando noticiou a sua morte, fez questão de citar que ele atraiu multidões em seus sermões e esteve bem próximo dos presidentes norte-americanos, sendo, inclusive, por décadas, conselheiro de vários deles. 

Sem dúvida, Billy Graham, um pastor batista que ganhou status de celebridade religiosa em uma cruzada em 1949 na cidade de Los Angeles, se tornou um dos homens mais conhecidos do mundo. Há quem diga que ele logrou êxito e maior notoriedade na proclamação do Evangelho ao ponto de superar o Apóstolo Paulo, com as devidas proporções, obviamente. O sucesso das suas cruzadas só foi possível porque houve um apoio maciço da mídia, alcançando os meios de comunicação convencionais da época como rádio, televisão e jornais. Tudo isso graças aos empresários que viu no jovem loiro, alto e de olhos azuis o símbolo de uma América do Norte em exportação. Com esse sucesso, a sua proximidade com o poder político foi uma mera consequência conveniente. Assim, Billy Graham se configurou como um “homem de Deus”, alguém que, com a mensagem de Cristo, poderia entrar e sair de países comunistas, como fez, por exemplo, na então URSS e depois na Coréia do Norte.

Com uma oratória cativante e eloquente, Graham não apenas se destacou no cenário nacional, mas também mundial. Na guerra da Coréia, ele foi uma das principais figuras que ficou responsável pela implantação do conhecido american way of life no sul da península. Na Guerra Fria, o evangelista se tornou uma figura central para o governo norte-americano, principalmente na América Latina.

Qual o legado de Billy Graham para o protestantismo latino-americano?

Billy não era apenas um homem de Deus, como bem o conheciam e o chamavam, mas também um exímio observador e influenciador dos assuntos de governo da Casa Branca, portanto, um homem também da White House. Mesmo admitindo que o governo político não transformava o mundo, por conta da sua escatologia fatalista – ou seja, somente a iminente segunda vinda de Cristo poderia pôr fim às misérias e conflitos no mundo –, ainda assim Graham exerceu uma enorme influência nas políticas de Estado em países latino-americanos no auge da Guerra Fria, falando abertamente contra o comunismo num tempo em que o mundo se dividia em dois blocos.

Por meio da Associação Evangelística Billy Graham (AEBG), houve maciço apoio às igrejas que apoiavam governos militares na América Latina. Nos momentos cruciais dos regimes militares, que tinham como vocação purgar o temível “espírito comunista” na América Latina, não se importando se havia ou não Diretos Humanos, Graham estava lá com suas conferências de teor apenas evangelístico e não, necessariamente, político. Mesmo que isso fosse um fato, apenas a sua presença em um país sob o regime militar só conotava apoio norte-americano ao que estava em curso.

A América Latina estava entre os continentes que mais chamavam a atenção de Graham. Quando há uma convocação para o primeiro congresso mundial sobre evangelização em Berlim (1966), sob os auspícios da AEBG e a revista fundada por Graham, Christianity Today, houve uma resolução no congresso cujo teor era a implantação de congressos de evangelização na América Latina (1). Algo que foi recebido prontamente por lideranças do protestantismo latino-americano, por conta da herança e do histórico laço com o protestantismo estadunidense. Há, portanto, uma clara relação entre as campanhas evangelísticas e os governos militares na América Latina. Não por acaso que a Associação de Graham não levará adiante os ideais do Pacto de Lausanne, havendo um claro antagonismo de direção e teologia. Enquanto o Pacto impulsionou o que ficou conhecido na América Latina como Teologia da Missão Integral, Graham se moveu deliberadamente para esvaziar o discurso e a práxis de Lausanne. Principalmente quando ainda em Lausanne, René Padilla fez duras críticas ao imperialismo norte-americano.

No Brasil, os batistas “apoiam” o golpe civil-militar e orientam as igrejas por meio do “O Jornal Batista” – “Os acontecimentos políticos militares de 31 de Março e 1º de Abril que culminaram com o afastamento do presidente da República vieram, inegavelmente, desafogar a nação. Porque estávamos vivendo num clima pesado de provocações, de ameaças, de agitações, que nos roubavam o mínimo de tranquilidade necessária para poder trabalhar e progredir. Necessária inclusive para a pregação do Evangelho. Agora as coisas mudaram. Era tempo” (2). É nesse contexto que Graham aparece no Estádio do Maracanã em 1960 (Aliança Batista Mundial), no Pacaembu em 1962 e, novamente no Maracanã, em 1974. Em 1974 o Brasil estava sob o comando de um general de tradição luterana, Ernesto Geisel. A presença de Billy Graham acentua ainda mais o apoio norte-americano aos anos de repressão e as Igrejas Batistas se dedicam a campanha de evangelização “Jesus Cristo é a Única Esperança”.

A influência de Billy Graham na formação missionária e pastoral da América Latina protestante é inegável. Fruto de seu tempo e portador de uma teologia salvacionista (ganhar almas) e imbuído do “destino manifesto” – ou seja, a ideia de que os EUA é a nação que colocará o mundo em ordem –, Graham deixou um legado marcado por uma escatologia pré-milenista e fatalista; uma antropologia pessimista; uma visão política que emudece a voz profética.

Notas
(1) NETO, LONGUINI, Luiz. O novo rosto da missão: os movimentos ecumênico e evangelical no protestantismo latino-americano. Viçosa: Ultimato, 2002, p. 155-156.
(2) REILY, Ducan Alexander. História documental do protestantismo no Brasil. 3. ed. São Paulo: ASTE, p. 315 e 322.

2 comentários:

Ananias Picanço disse...

A questão que levanto diante dessas informações preliminares sobre a influência da política americana nas cruzadas evangelísticas promovidas pela AEBG pode ser considerada como sendo uma estratégia do evangelista Billy Graham para alcançar outros países onde o evangelho nunca havia sido pregado!? Eu sempre ouvir dizer que o evangelista Billy Graham mesmo diante de tamanha influência mundial nunca teve sua vida exposta a qualquer tipo de escândalo que viesse a comprometer seu caráter enquanto homem de Deus; diante da sociedade e entre seus famíliares. Esse tipo de comentário acima sobre ser ele não apenas um homem de Deus mas também da "Casa Branca" de alguma forma revela algo que abone sua honrada reputação!? E por fim, qual na verdade foi o interesse de quem escreveu esse "artigo" ao nos revelar o Billy Graham que talvez muitos não conheceram!?

Anônimo disse...

"Palavras ao vento"...geralmente existem pessoas que depreciam o que JAMAIS outros poderão fazer, como o fez Billy.