8.7.15

LIBERTAS, OMNIUM: OS BATISTAS E A LIBERDADE RELIGIOSA

O Jornal Batista (CBB) de 05.07.2015 foi histórico.

Diante de um acontecimento desagradável com a menina Kaillane (11 anos) que sofreu agressão por estar saindo de uma cerimônia religiosa do candomblé, irmãos e pastores batistas fizeram uma manifestação contra a intolerância religiosa, repudiando não apenas o ato agressivo contra a menina Kaillane, como também qualquer discriminação e preconceito a religiosidade do outro. A manifestação ocorreu no Rio de Janeiro, cidade da Kaillane, e, além de outros pastores presentes, o Pr. João Luiz Sá Melo (pastor na Primeira Igreja Batista em Vila da Penha, bairro da menina Kaillane), marcou a sua presença nesse ato em prol a liberdade religiosa. O Jornal Batista dedicou uma edição para não só tratar desse tema, liberdade de crença, como também questões ligadas ao movimento LGBT, Ensino Religioso e Racismo. Definitivamente uma edição que representa a trajetória dos batistas e a defesa de seus princípios, entre eles a liberdade religiosa, para todos.

Os batistas, historicamente, surgem na Inglaterra do século XVII. Em meio à efervescência de movimentos emancipatórios que tem na filosofia de John Locke, por exemplo, um discurso libertário, os batistas têm traços constituídos por princípios, sendo que, em meio a princípios teológicos, os principais princípios são político-filosóficos.

Somos filhos do liberalismo inglês.

O liberalismo é uma reação ao absolutismo.

Um dos principais expoentes do liberalismo político foi, indubitavelmente, John Locke.

Na Inglaterra o apogeu do absolutismo se deu com o rei Henrique VIII, que com o apoio do Parlamento inglês, que na sua maioria eram burgueses, concentrou o poder nas mãos do rei.

Nesse cenário político, Locke foi um ferrenho defensor da liberdade civil e religiosa. Para ele “os homens são todos, por natureza, livres, iguais e independentes, e ninguém pode ser despossuído de seus bens nem submetido ao poder político sem seu consentimento”.

Os batistas são herdeiros desse pensamento e, como tal, em seus princípios a liberdade religiosa (para si mesmo, num primeiro momento como recurso de sobrevivência) e a separação entre Igreja e Estado se tornam duas lutas que custaram vidas, entre elas a de Thomas Helwys. Arguto para o seu tempo, Helwys foi um defensor da liberdade religiosa e, por isso, enfrentou o rei.

Isso nos mostra de como os batistas não podem abrir mão de sua gênese, daquilo que fizeram os ancestrais enfrentar a prisão e a morte. O autor de Uma breve declaração do mistério da iniquidade endereçou seu texto ao rei Tiago I e por isso a prisão foi sua última “casa”. Razão para isso? Em um regime absolutista nenhum rei gostaria de ver alguém propagando ideias como essas: “o rei é um homem mortal, e não Deus [...] não tem poder sobre as almas imortais dos seus súditos”.

Helwys defendeu até o último momento de sua vida a liberdade religiosa para todos: “que sejam heréticos, turcos, judeus ou o que quer que sejam, não compete a qualquer poder terreno puni-los na menor medida que seja”. Helwys morre em uma prisão em 1616.

Não podemos ser apenas tolerantes com a religião do outro. Há uma diferença entre liberdade religiosa e tolerância religiosa. É Walter B. Shurden quem esclarece isso: “a tolerância religiosa é apenas uma concessão; a liberdade religiosa é um direito”.

A manifestação envolvendo batistas no Rio de Janeiro está perfeitamente dentro do movimento batista em prol da liberdade religiosa na história.

É preciso, honestamente, reconhecer e lutar para que cada um tenha o seu direito garantido de viver a sua fé e religiosidade. Não é possível, principalmente entre os batistas que priorizam os seus princípios, respeitar e fazer respeitar a religião do outro.

Com isso não se afirma que nenhuma religião está fora da crítica ética e teológica, nem mesmo a nossa. Mas não é concebível a partir de uma perspectiva de liberdade religiosa o falar mal da outra religião por ser religião, insultando seus pressupostos. Dentro de um Estado democrático e republicano, cabe à crítica, a avaliação argumentativa, a pesquisa das estruturas religiosas, mas não cabe a dicotomia religiosa onde um acha que a sua religião é melhor do que a do outro.  

Como batistas que tem uma tradição em defesa da liberdade do indivíduo e religiosa, poderíamos ser protagonistas não apenas em situações como da menina Kaillane, mas em um Estado democrático de direito levantar essa bandeira o mais alto que puder. 

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