1.11.09

NOVOS TEMPOS - II

Somos herdeiros de uma história. Nossa tradição é batista, fruto do protestantismo de missão que, inegavelmente, ajudou e muito a construir este país. Ideais políticos (sistema republicano com estado laico), filosóficos (positivismo), econômicos (liberalismo), religiosos (anti-clericalismo e anti-catolicismo) e educacionais (inovando com o método de leitura e ferramentas de ensino), ajudou na formação do país. A passagem do Brasil - Império para o Brasil - República, teve como participação efetiva dos protestantes que influenciaram homens como Rui Barbosa e Prudente de Moraes.

Como podemos contribuir para a nossa sociedade nesses novos tempos?

Aponto aqui alguns temas que considero relevantes.

Princípios: a defesa e a promoção dos princípios batistas são inegociáveis, eles definem quem nós somos. A autoridade da Bíblia na comunidade; a formação eclesiológica autônoma e democrática; a liberdade religiosa, moral e consciência; a separação Igreja-Estado. São bandeiras esquecidas no nosso meio. O fundamentalismo bíblico ofuscou os princípios batistas e nem mesmo os pastores conhecem eles, quanto mais os membros da igreja! Em novos tempos é imprescindível acentuar a identidade, e os batistas não são a Declaração Doutrinária da CBB, antes dela há os princípios defendidos com a vida, como, por exemplo, Thomas Helwis que morreu na prisão pela liberdade religiosa.

Pastoral: em vez de uma pastoral burocrática e administrativa, uma pastoral solidária e integral. A formação teológica não prepara o pastor/teólogo para lidar com os problemas da vida que afetam a todos. Há uma insistência na evangelização a todo o custo, e a pessoa no seu sentido mais integral é marginalizada. A mentalidade reinante é “ganhar almas para Cristo”, como se o homem fosse apenas “alma”. A sociedade, com suas mazelas e desafios éticos, não é considerada. Falta ainda uma visão holística; uma espiritualidade que não seja proselitista, mas humana.

Estrutura denominacional: a organização denominacional é empresarial. Analiso as condições da estrutura da CBESP. Na última assembleia o tom foi empreendedorismo. Não há problema nenhum em ouvir profissionais da área de finanças e imprensa, o problema esta em querer transportar conceitos empresariais para a Igreja. Já sofremos muito com o modelo eclesiástico-organizacional baseado na industrialização, dividindo a igreja por departamentos, desconsiderando completamente a liberalidade dos dons espirituais. Sendo os batistas autônomos e democráticos, e a CBESP/CBB sendo instituições a serviço da Igreja, essas poderiam promover um amplo debate sobre as questões que preocupam o país. O que os batistas têm a dizer sobre células-tronco? Qual a opinião dos batistas sobre o aborto? Como reagimos frente ao descaso do poder público com algumas necessidades vitais da promoção humana? Qual nossa postura com políticos envolvidos em escândalos financeiros? Alguém aí já viu os batistas entregando um projeto de lei no Congresso Nacional com no mínimo um milhão de assinaturas? Onde está a nossa capacidade de comunicação? Até quando os batistas iram ver os neopentecostais fazendo uma lavagem cerebral na cabeça do povo com este evangelho marqueteiro? Não é apenas um pastor que representa a opinião dos batistas, por isso a necessidade de discussão e apontamentos que falem pelos batistas de modo geral. Para isso ocorrer a estrutura denominacional precisa estar atenta a isso, não é apenas campanhas missionárias que resolveram o problema.

Essas são algumas provocações que faço. Respeito aqueles que pensam de forma diferente, mas insisto nisso: novos tempos exigem novas leituras. A minha preocupação é se estamos prontos ou quando estaremos prontos para refletir com seriedade esses temas.

4 comentários:

Claudinei Paulino disse...

Ao ler seu texto me veio a mente que todas as mudanças, reformas, foram movimentos periféricos. O próprio Senhor Jesus viveu esse movimento, trilhou pela Galiléia. A Reforma também foi assim, o que era a Germânia naquele momento da história? No entanto, Lutero foi protagonista ali. Além dos anabatistas e outros. As CEBS na América Latina nasceu nas periferias. O sistema sempre se manteve, mas as periferias é que olhavam o mundo com mais vida e consciência, talvez porque sempre sentiu mais a necessidade de novas possibilidades. Talvez por isso eu seja um tanto pessimista quanto a mudanças no sistema, acredito, porém, em mudanças à margem.
Mas é isso aí, parabéns pelo texto. Muito claro e propício.
Um abraço

Alonso S. Gonçalves disse...

Concordo com vc, visto que a denominação não se preocupa em mudar o seu status quo. É e lugares distantes do poder que poderemos fazer teologia, mas não custa nada provocar um pouco. A minha chatiação é ver que os mesmos que estão envolvidos no sistema são os mesmos que vivem falando nas periferias, isso sim precisa mudar.

Valeu!

jerielbrito disse...

Lamento pela denominação que insiste neste modelo empresarial enferrujado como as primeiras maquinas de produção. É muito desgastante pensar numa nova estrutura para a denominação. Creio que virá um novo tempo, mas para a igreja local do que para a denominação, ela está engessada. Ela é importante mas no momento parece insignificante. Se fossemos pentecostais estariamos falando sobre a necessidade de um novo derramamento do Espírito Santo com fogo, mas como somos históricos falamos de uma nova estrutura com um novo modelo. Penso que devemos sair deste mundo pré-histórico denominacional para avançarmos quem sabe para um novo tempo.
Belo texto, parabéns!

Alonso S. Gonçalves disse...

Ainda bem que não somos pentecostais senão a primeira coisa que viria seria a divisão, coisa inadmissivel, sem cogitação.
Agradeço pelo comentário, e esperamos que a denominação seja mais relevante para o noss o tempo.

Um abraço!