Parece
que o “inimigo” que setores conservadores da “Igreja Brasileira” elegeu para
combater não é outro, somente no filme “Tropa de Elite 2” que o “inimigo era outro”.
O “velho e conhecido inimigo” é o “comunismo”, dizem alguns. Outros falam no “socialismo”.
Há quem diga “esquerdopatas”, uma mistura de esquerda política com psicopatia, qualificação
usada por Silas Malafaia. Recentemente o pastor e deputado federal Marco
Feliciano, não conseguiu chocar a todos quando contou uma “piada” quando
perguntado sobre a morte da vereadora Marielle e do motorista Anderson em um
programa de rádio. Disse: “O cérebro do
esquerdista é do tamanho de uma ervilha. Há pouco tempo fiquei sabendo que
deram um tiro num esquerdista no Rio de Janeiro e levou uma semana para morrer
porque a bala não achava o cérebro”.
A polarização política no país vem somando imbecilidades, ao
ponto que os conceitos “comunismo” ou “socialismo” são empregados nas Redes
Sociais indiscriminadamente, desconsiderando as devidas conexões ou desconexões
com os termos. Quem
nunca ouvira falar de Karl Marx passou a odiá-lo, mesmo sem ter lido uma linha
sequer das suas ideias. Assim, o “inimigo” a ser combatido no país é a “esquerda”,
com o seu “satânico” intento de implantar medidas libertinas e fazer com que o
país se transforme em uma “Cuba” ou em uma “Venezuela” economicamente. Essa é a
narrativa, sem as devidas desproporções e limites, obviamente.
A
narrativa do Golpe de 2016 se deu, para esse universo político-religioso, a
partir do “combate ao comunismo”, assumindo o slogan de grupos de identificação política de “direita” na frase
imperiosa: “Nossa bandeira nunca será vermelha”. Somou-se esforços para retirar
do poder central do país o Partido dos Trabalhadores, acionando os
parlamentares da conhecida “Bancada Evangélica”, também conhecida como a “bancada
BBB” (da Bíblia, da bala e do boi), fazendo coro com o então “homem de Deus”, o
pseudo-evangélico Eduardo Cunha. Quando o PT sai do governo, de maneira
vexatória, o segmento evangélico conversador seguiu ignorando os inúmeros casos
de corrupção explícita do atual governo, o embusteiro Michel Temer. Antes considerado
“satanista”, Temer passou a ser uma espécie de “Ciro”, o rei da Pérsia que
permitiu o povo de Israel voltar à Jerusalém. Se antes a corrupção sistêmica
era causada e criada pelo PT, agora é preciso colocar nas mãos de Deus o
próximo Presidente, que parecem que já “elegeram” (#SQN) um dos maiores engodos
da democracia brasileira, o senhor Jair “Messias” Bolsonaro.
Para
esses setores conservadores da “Igreja Brasileira”, a “esquerda” precisa ser
combatida e isso se dá com um discurso doutrinário efusivo, ou seja, em grandes
eventos, grandes igrejas, seminários, blogs,
livros e Redes Sociais. Fazem um bom trabalho de articulação e marketing. O “inimigo” a ser encarado
são os representantes da então “Missão Integral”, como se essa abrigasse os
pastores e teólogos da “esquerda” (algo inverossímil). Mas o foco mesmo se dá
em torno de nomes como Ariovaldo Ramos e Ricardo Gondim, por exemplo. As referências
a esses dois é feita de modo velado em algumas ocasiões, mas em outras se dá de
maneira aberta e audível. Esse setor alega que a Teologia da Missão Integral (TMI)
é uma ramificação do marxismo cultural e, portanto, precisa ser extirpado da
igreja, essas ovelhas pretas, quer dizer, vermelhas. Com isso, o discurso político vem alinhado ao
discurso doutrinário, de tendência agostiniana-calvinista.
Para
legitimar a pregação do evangelho sem, necessariamente, o comprometimento
social (tensão que perdura no movimento evangelical), os pregadores e expoentes
do setor conservador alegam estar de posse da “verdade” bíblica. A fim de ilustrar,
recordo que uma vez estava ouvindo Jonas Madureira, um dos principais proponentes
do conservadorismo evangélico, e ele dizia que a “igreja não deveria estar sendo guiada
por uma agenda social, mas sim pela agenda de Deus”. Ao final da sua fala,
abriu-se para perguntas. Indaguei: “Qual a agenda de Deus hoje?”. A sua resposta
foi muito interessante: “A agenda de Deus é a palavra (Bíblia)”. E completou: “Na
época que o ex-Presidente Lula foi indiciado pela ‘Lava-Jato’, no domingo
preguei um sermão bíblico que veio de maneira certeira no atual momento que o
país estava passando”. Uma pena não ter tido o direito da réplica. Nesse caso,
a agenda de Deus funcionou assim: o pregador (Jonas) fez uso de um texto
bíblico que, por coincidência divina (porque se tratava de uma série de
mensagens), calhou com o indiciamento do ex-Presidente e, desta forma, o texto
bíblico foi lido com as lentes da ocasião, ou melhor, serviu para dizer que os
fatos estavam sendo, de alguma maneira, conduzidos por Deus. Não deixa de ser uma agenda.
Ocorre
que para legitimar o discurso doutrinário, é preciso combater o “inimigo”. O “inimigo”
são pessoas e igrejas que professam um discurso aberto e integrador, com uma incidência
político-social, identificados, porém, com uma perspectiva política à “esquerda”
(com todas as dificuldades que esse termo acarreta e suas consequências
políticas em discussão até hoje). Por isso, frases como “Não encontramos Deus na face do
pobre, encontramos Deus na face de Cristo”, de Igor Miguel, por exemplo, são frequentes. É uma
maneira de dizer que essa leitura dos evangelhos está equivocada (Deus na face
do pobre), quando o correto mesmo é olhar para o Cristo, apenas ele, porque ele
é a face de Deus (revelação). Isso é bom! Mas o Cristo que revela o Pai seria
aquele de Mateus 25,34-40?
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