19.5.08

QUANDO O PASTOR NÃO É O ÚNICO PASTOR DAS OVELHAS

Estamos presenciando uma avalanche de programas tidos como "evangélicos" na televisão brasileira. Há uma rede de televisão que em certo dia da semana começa às 6h da manhã e vai até às 14h da tarde com programação evangélica. Tem de tudo um pouco e para todos os gostos. A verdade, é que os evangélicos estão tendo oportunidade na televisão brasileira como nunca teve - aliás, diga-se de passagem, algum tempo atrás, para uma certa denominação, televisão era coisa do "diabo", tida como o "baal eletrônico". Hoje é uma questão de afirmação no "mercado" religioso.

O fato é que os programas "evangélicos" (e católicos - uma reação ao crescente número de programas evangélicos obrigou a Rede Vida de Televisão a expandir seu sinal para o resto do país, porque até então, 1996, era um canal fechado) estão aí divulgando seus encontros, reuniões, congressos, cultos, pastores "cheios do poder" pregando e arrebanhando pessoas; é o "mover de Deus", o tempo do avivamento; é hora de dizer que o Brasil será (ou é) uma nação evangélica... e o discurso exclusivista não pára. Recentemente foi realizada uma pesquisa para saber quem ficava mais tempo no ar. O resultado, não surpreendeu. Ganhou um certo missionário que não sai da TV.

Não resta dúvida de que a TV é um meio de comunicação importante para a propagação do evangelho neste país. Mas o que estamos vendo é a pretensão de alguns (como já estamos presenciando a obsessão de um certo grupo sectário, que detém uma das maiores rede de televisão, buscando, a qualquer custo, a "liderança" na mídia) em construir impérios - começando com a opulência dos grandes templos, canais de TV e a recente proliferação de políticos para garantir a "sobrevivência" do povo cristão no país. O pior disso tudo, é que a legitimação envolve a manipulação do sagrado com chavões conhecidos como: "Deus nos chamou para sermos cabeça e não calda". Enquanto isso... no lado dos "míseros mortais" e retrógrados midiáticos, há a necessidade de cuidar para que os "pregadores televisivos" não afete a comunidade com modismos e crendices vindas pelo cubo "mágico".

Certo dia estava fazendo turismo na TV quando passei em um canal onde um certo programa, que na verdade é um show, dessa igreja que tem em todo lugar, de fato internacional, chamou a minha atenção uma senhora que estava dando seu "testemunho". Ela dizia que contribuía com todos esses "pastores televisivos" inclusive sendo "patrocinadora" do determinado programa. Mas o que realmente prendeu a minha atenção foi aquela senhora, piedosa até, dizer que colaborava com a Junta de Missões Mundiais há muito tempo e que, atualmente, sustentava um missionário no campo. Presumi de que a senhora, possivelmente, era batista. E era mesmo, pois no final ela confirmou. E bastou isso para o "testemunho" se encerrar por ali.

Esse é um exemplo de que nenhum pastor está isento de ter a(s) sua(s) ovelha(s) pastoreada por "outro pastor". E se não foi, poderá ser questionado sobre certas questões que o "missionário" disse; o pastor sem papas na língua falou; o "homem" do avivamento "profetizou"... Somando ainda a deficiência doutrinária e denominacional, que muitos dos membros de nossas igrejas têm, temos pessoas confusas e em crise porque a igreja da qual faz parte não faz isso ou aquilo.

Há, ainda, os que não se submetem a autoridade do pastor porque o "pastor televisivo" prega melhor; ele sim tem "unção"; é o "homem de Deus". O pastor deixa de ter credibilidade para certas pessoas que acompanham o programa do pastor tal, e se por um acaso ele, em seu sermão dominical, dizer algo parecido com o que disse o "pastor televisivo" é porque esta copiando, mesmo que não assista o tal programa.

O pastor está envolvido em uma questão dupla: a sua integridade pastoral e a identidade denominacional da qual faz parte e precisa zelar. Por um lado o tido "mercado religioso" quer obrigá-lo a se enquadrar no que está fazendo sucesso. Quando isso não ocorre (e seria bom que não ocorresse mesmo), as mensagens do pastor sobre concerto de vida, vida com Deus, arrependimento não é aceita. Afinal de contas não é mais isso que se ouve por aí. Não existe cristianismo desinteressado, mas utilitário. Os fundamentos da Reforma estão sendo solapados por uma mensagem triunfalista que tem como base a experiência individual que confirma o "mover" de Deus quando desejos, na sua maioria de consumo, são atendidos.

O pastor não está sozinho na sua árdua, mais prazerosa, tarefa de pastorear o rebanho. Há "outros" que estão 24h colocando os mais bizarros conceitos e práticas na cabeça de um povo, que por natureza, não gosta muito de refletir, mas pegar tudo pronto.

A era do teatro, templo e mercado não produzirá mais homens como o pastor Martin Luther King (assassinado em 1968). Alguém que marcou a sua época com ideais igualitários e princípios cristãos. E só para citar um exemplo latino-americano, dom Oscar Ranulfo Romero (assassinado em 1980) mártir de uma luta contra a opressão em San Salvador. Homens que marcaram profundamente não pelo "sucesso", mas pela vivência de vida e ideais humanitários e espirituais.

Pastores foram chamados para pastorear, e não precisa, necessariamente de holofotes para marcar as pessoas com o ministério. O maior desejo do pastor é ver Cristo sendo formado na Igreja (Gl. 4,19).

Um comentário:

Pedro disse...

Amado,
Observo que alguns líderes modernos (pastores)de Igrejas imaginam-se, a si mesmos, como homem de negócios, personalidades da mídia, promovedores de entretenimento, psicológos, filósofos e advogados. E nunca como pescadores de almas que vão até os oprimidos e necessitados. Esses novos ideais de esplendor contrasta com a idéia de Paulo nas cartas pastorais que é labor, sacríficio e arduidade. Hoje, temos potentados (Phd, DD, Masters) e poucos homens de Deus que pregam a palavra e o Poder. Jesus usou a metáfora "pastor"referindo-se a alguém que cuida do rebanho, em todas as necessidades. O povo, que espera o Poder de Deus, não achando o alimento necessário procura aqueles que fazem o show. E são iludidos. Um abraço. Pedro Augusto Bonna.