12.8.13

E SE FOSSE ASSIM...

“Gastamos todo o tempo em que estamos juntos passando a ferro as inúmeras e pequenas questões que dizem respeito à perpetuação da instituição (igreja)” – Paulo Brabo.[1]

Quando li essa frase de Brabo pensei: e se fosse diferente?

Hoje as pessoas na igreja (como instituição), gastam um tempo enorme discutindo questões triviais e supérfluas em torno de temas que, na sua grande maioria, não tem nada a ver com o Reino de Deus, com o fazer discípulas e discípulos de Jesus. É gente que adora ficar em reuniões intermináveis querendo saber se a cor do templo será azul ou amarelo; é gente que gosta de discutir se o programa X irá mesmo ocorrer e se ele não acontece alguém é o culpado, geralmente o pastor, para não fugir a regra; é gente que se preocupa muito mais com o horário do culto do que propriamente com o culto; é gente que gosta de cobrar a presença de pessoas nos encontros de estudos bíblicos, nossa famosa EBD, mas não consegue vivenciar no dia a dia a tolerância, o amor fraternal e o perdão.

É por essas e outras razões que levou Paulo Brabo a dizer: “o lugar (templo) em que o cristão está servindo passa a significar mais do que o modo (a exemplo de Jesus) como ele está servindo”. O templo, o ajuntamento, não é visto como um lugar de festa, mas sim de obrigações. Quando se entende que igreja é mais um lugar de obrigações do que de ajuntamento, o legalismo e o tradicionalismo tem assento permanente.

E se fosse assim...

 - Um lugar onde as pessoas ficassem chateadas, aborrecidas e, até mesmo magoadas, se não ocorresse aquele abraço no momento do culto;
 - Um lugar onde todos reclamassem em alto e bom som se a reflexão bíblica não tentasse imprimir na vida o agir de Jesus e sua maneira de enxergar o Reino de Deus;
 - Um lugar onde as pessoas observassem bem os participantes da celebração e quando notassem que aquele irmão ou irmã não estava presente, quando em casa a primeira coisa que fariam era pegar o telefone e ligar para saber se estava tudo bem e se precisa de algo;
 - Um lugar onde as pessoas pudessem se amar ao ponto de se importar menos com as regras e mais com o ser humano.

Esse lugar existe e o Novo Testamento chama de IGREJA.

Igreja existe para adorar a Deus e procurar vivenciar o mais próximo possível a caminhada de Jesus. Ele, Jesus, mantinha a agenda livre porque estava disponível às pessoas. A igreja de hoje mantém-se ocupada, mas tão ocupada com os seus programas e reuniões importantes que não pode estar disponível nem mesmo para os próprios irmãos. Essa, com certeza, não é a igreja que Jesus pretendia ter.

O livro do teólogo alemão Gerhard Lohfink[2] tem um título interessante: Como Jesus queria as comunidades? Ele diz que as comunidades de Jesus, por terem o seu Espírito, seriam comunidades de seguidoras e seguidores de Jesus. Comunidades em que o principal objetivo é amar, incondicionalmente, amar.

Ah se fosse assim...
             

[1] BRABO, Paulo. Instituições, disciplinas e a geografia da devoção. In. GOUVÊA, Ricardo Quadros (Org.). O que eles estão falando da igreja. São Paulo: Fonte Editorial, 2011, p. 61-70.    
[2] LOHFINK, Gerhard. Como Jesus queria as comunidades?: a dimensão social da fé cristã. São Paulo: Paulinas, 1986. 

1.8.13

APONTAMENTOS EM TORNO DO CONGRESSO DE ECLESIOLOGIA 2013 DA CBESP

A Convenção Batista do Estado de São Paulo (CBESP) vem se notabilizando com uma iniciativa interessante, repensar conceitos eclesiológicos a partir da teologia, história e cultura, ou seja, a iniciativa é refletir sobre o papel da igreja em uma cultura mutante e uma religiosidade plural.

O Congrego de Eclesiologia 2013 teve como participantes/preletores Josué Melo Salgado e meu amigo Jorge Pinheiro. No primeiro Congresso (em 2012) tive o prazer de ser parte da Comissão de Parecer. Neste Congresso teve, atendendo ao pedido da Comissão do primeiro Congresso, apenas dois palestrantes para um maior tempo de reflexão e debate. Neste foram abordados temas que no primeiro já haviam sido ventilados: pastorado feminino, representatividade batista, teologia salvacionista, modelos eclesiológicos e afins. Confesso que esperava algo mais apurado neste último Congresso, até porque tinha como palestrante Jorge Pinheiro, um dos teólogos batistas que, juntamente com Alessandro Rocha (do Rio de Janeiro), vem se destacando pela profícua produção teológica e intelectual no protestantismo brasileiro e no meio batista.

Em relação ao Congresso 2013, algumas questões ficaram mais evidentes. É bem-vinda a orientação quanto ao recebimento de pessoas que querem ser batizadas e a legalização do casamento impede. Quantas pessoas não se tornaram membros de uma igreja porque o cônjuge não quer oficializar o casamento e essa pessoa, na maioria mulheres, não pode participar da comunhão (ceia) porque ainda não foi batizada. O Documento do Congresso traz:

Batismo de pessoas não casadas civilmente - O batismo é uma ordenança bíblica que a igreja deve cumprir e todos aqueles que decidem se tornar discípulos de Cristo devem ser batizados (como ordenança não cumpri-la é pecado). O casamento é instituição divina antes do estabelecimento das culturas, da igreja e do Estado. Cada cultura e período da história (embora com suas próprias variações) demonstraram reconhecimento social do casamento formal, como compromisso de companheirismo para toda a vida. A igreja deve reafirmar o casamento e a família como instituição divina e como ideal divino para o bem estar da pessoa e da sociedade. Deve também ministrar o batismo para todo aquele que professa sua fé em Cristo e apresenta sinais de novo nascimento através de um novo modo de pensar e agir em conformidade com a vontade de Deus. Não deve, entretanto, descumprir esta ordenança, deixando de batizar aqueles que, não estando casados civilmente também estejam impossibilitados de resolver sua situação (como nos casos em que o cônjuge não crente resiste à formalização do compromisso). Neste sentido, cada caso deve ser avaliado com cuidado pela igreja.

Esse é um passo importante. Apesar de saber que algumas igrejas já vêm procedendo desta forma, o Congresso (lê-se CBESP), apenas contribuiu para disseminar algo que muitas igrejas do Estado de São Paulo vêm realizando, ou seja, dá a oportunidade de pessoas que entregaram as suas vidas à Cristo, passaram a frequentar a comunidade de fé, a contribuir e participar de atividades e eventos na igreja, mas não podiam participar daquilo que nos define e nos torna igreja, a Ceia do Senhor, ou seja, a Celebração da Comunhão. O que impedia? Um casamento consolidado há anos, mas não formalizado, mas que o Estado entende como União Estável.

Excetuando isso, a eclesiologia que se mostrou no Documento do Congresso ainda toca em assuntos que são comuns a um grupo fechado com uma linguagem hermética que apenas os iniciados dominam.

Infelizmente ainda existem discussões em torno da “unção com óleo”, algo tão irrisório para o contexto atual do mundo e da igreja. Outra tolice sem precedentes é a questão de novos “apóstolos” e “bispos” no ambiente batista. Isso é baixo. Chega a ser ridículo. Já não basta às bizarrices do neopentecostalismo mais tacanha que há no país com sua vertente midiática protagonizando uma disputa de poder pelo campo religioso e agora ter que ver em ambiente batista alguns que se acham portadores de uma “espiritualidade” que chega a ser gnóstica se chamando de “apóstolo” ou “bispo”! Francamente isso demonstra ainda mais a ausência de uma agenda que realmente importa para a sociedade e o Evangelho.

Infelizmente o Congresso vem demostrar que questões miúdas ainda ocupam púlpitos e mentes de pastores e líderes que não estão nutrindo uma teologia holística, mas sim uma microfísica do poder (Michel Foucault) dentro de seus guetos eclesiásticos.


É uma pena que assuntos como “unção com óleo” e “clube apostólico” com sede nos Estados Unidos (e nem mesmo em Jerusalém é) tenha ocupado o tempo e a reflexão de gente que deveria estar contribuindo ainda mais para uma leitura contemporânea do Evangelho de Cristo na nossa cultura. Enquanto isso, continuamos cultivando uma igreja fechada em si mesma travando disputas de poder (“unção com óleo” e “apóstolos”), enquanto Cristo deixou o exemplo: quem quiser ser “grande”, seja escravo.