É bom que se diga: sacerdote no Antigo Testamento não é vocação e sim uma função,
ou seja, diferente do rei e do profeta que havia uma espécie de escolha divina, o mesmo não ocorre com o
sacerdote. É claro que a “classe
sacerdotal” começa com a tribo de Levi para o serviço do santuário, mas não
significa, em nenhum momento, um carisma especial
para o exercício do sacerdócio. Por essa
razão que o rei poderia destituir sacerdotes e colocar outros no lugar.
A classe sacerdotal se estabelece em Israel
e se alinha, inevitavelmente, ao rei, porque dele depende. Ligado ao santuário,
o sacerdote vive para o tempo sagrado
e é responsável por dirigir o culto à Javé. Dentro do culto, havia,
naturalmente, a função de mediação entre
o povo e Javé tendo nos sacrifícios o elemento de maior importância dentro da
liturgia.
A classe sacerdotal terá a sua supremacia
conquistada no transcorrer das invasões e sucessão de impérios. No tempo de
Jesus é uma classe que detém o discurso religioso e o “poder” de dispensar a
bondade de “Deus” e decidir quem pode ou não ser digno das misericórdias de
“Deus”. O acesso ao sagrado passa pelo sacerdote inevitavelmente. A crise de Jesus é
com esse sistema religioso estabelecido e legitimado pelo poder romano na Palestina.
Interessante que depois da Reforma
Protestante preconizou um dos principais princípios do protestantismo, o sacerdócio universal de todos os crentes.
Parece que isso não foi levado tão a sério. Digo isso, porque sofremos as
influencias sacerdotais até hoje em diversos sentidos. Cito alguns exemplos.
Os pastores são vistos como gente mais
próxima de Deus, aquele que tem de alguma forma, um “acesso especial” com Deus
e aí daquele que se levanta contra um “ungido” do Senhor. A oração do pastor-sacerdote
tem mais “poder”, pois ele tem alguma “intimidade” com Deus que outros, pobres
mortais, não têm. Àqueles que promovem essa concepção exagera na sua condição
de “semidivino” manipulando o povo com o seu “poder sacerdotal”.
Ainda sobre o pastor-sacerdote, cabe a ele,
com muito prazer, “zelar pela doutrina” – lê-se sistema religioso que sustenta
o seu próprio papel de mediador do sagrado
– ele detém o discurso que salva, ainda mais se ele citar grego e hebraico
do púlpito, as línguas tidas como sacras.
Sem “doutrina” o povo perece dirá alguns. Nesse caso o livre exame das Escrituras, outro princípio protestante, não é levado a sério, o que vale mesmo é a doutrina, um código de leis que não podem ser violadas, do contrário a punição de
“Deus” será imediata, mesmo que ele dependa da atuação política de cerceamento
da liberdade de consciência.
Outra coisa de sacerdote que impregnou é a
concepção de culto. Ele precisa ser sério. As regras
indumentárias e litúrgicas precisam ser intocáveis, do contrário não é culto, é outra coisa, precisa ser no templo e ele já é por si só, sacro. Isso sem falar na classe sacerdotal que precisa se reunir
antes do culto, juntamente com os
chamados erroneamente de levitas,
para orar antes do culto. Sem àquela
oração não sai nada certo, parece que há uma classe mais que especial porque
está diante da comunidade cantando ou pregando. Essa classe precisa se preparar
“espiritualmente” como se as demais pessoas que estão ali para a celebração não
estivessem espiritualmente capacitadas para o ato de culto. Há uma confusão
entre habilidade musical ou qualquer outra coisa com a “direção de Deus” para o
culto. Isso sem falar que quem mais precisa de culto são as pessoas e não,
necessariamente, Deus. Mais deixa isso pra lá.
Assim como os sacerdotes deixavam bem claro
que a punição era algo divino, há um
patrulhamento em torno de pessoas que erram dentro da comunidade porque o
“pecado” precisa ser expiado de
alguma maneira, assim como no Antigo Testamento. Tomando aqui as intuições de
René Girard, é preciso sacrificar alguém,
do contrário coloca-se em risco a existência da comunidade atingindo todos os
seus membros e a legitimação da ordem fica comprometida, ou seja, é o sistema religioso
que pune e absolve não na mesma proporção, mais pune que absolve.
Outra coisa de sacerdote é a ideia de que
Deus, mesmo depois da Graça, se agrada mesmo é da lei, das regras. No fim o que
define mesmo é se obedeceu ou não a lei. Aí nesse caso não importa muito o que
Jesus ensinou sobre perdão e amar as pessoas e se o sábado foi feito para o ser
humano e não ao contrário.
Viva a classe sacerdotal que está nos
púlpitos e na televisão, eles continuam obnubilando a mensagem do Reino de Deus
tão enfatizada por Jesus.
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