Por esses
dias, todas as vezes que um carrão vem relinchando atrás de minha Kombi, vem
piscando desesperadamente pedindo passagem em ruas onde não há saídas, apenas
espera, penso na publicitária que foi espancada no trânsito por, justamente,
não ter desaparecido da frente de um desses apressados em último grau parido
pela modernidade.
Ser
gentil, paciente, compreender a realidade alheia, ampliar o campo de visão para
além dos domínios do próprio ar-condicionado são fundamentos humanos em franca
decadência. Nessa toada, bárbaros que aguardem!
Mais
assustador ainda é que a aura de bondade do brasileiro também está se apagando.
Ranking mundial de solidariedade entre 135 países colocou o país na rabeira,
91ª posição. Não se doa dinheiro a instituições, não se ajuda o desconhecido e
voluntários continuam sendo heróis, e não regra.
Por esses
dias, todas as vezes em que vejo um cão mais magrinho dentro de automóvel,
imediatamente me lembro da cena do casal que jogou um vira-lata pela janela de
seu possante em movimento, em plena avenida que nunca descansa, em São Paulo.
O bicho,
terrivelmente inconveniente e incrédulo, rodeava o veículo com desespero
tentando entender aquela atitude humana. Não, não dá para acreditar que valores
como apego, compaixão e amizade estão sendo mais bem compreendidos por…
cachorros?
A conta
custa a fechar em minha cachola frenética e inquieta. O brasileiro não está
ganhando mais? O desemprego não caiu? Os supermercados não estão vendendo
televisores como pão quente?
Mesmo com
tudo isso, o brasileiro piora naquilo que enriqueceria o caráter, enobreceria
as relações entre os viventes e tornaria o país, talvez, menos Graciliano Ramos
e suas “Vidas Secas”, menos Aluísio de Azevedo e seu “O Cortiço”.
Por esses
dias, todas as vezes que leio gente fazendo chacota abertamente ou mesmo
agredindo a céu aberto grupos e indivíduos que manifestam diferenças no modo de
pensar, de agir ou de atuar em sociedade, penso que minha vez pode chegar. Salvem
o povão quebrado, por favor!
No balaio
de incompletudes desse “serumano” brasileiro do século 21, a tolerância, que
tanto se cobrou aqui de norte-americanos em relação aos clandestinos, de
franceses em relação aos refugiados da fome africana, tem ficado ausente com
médicos de Cuba, com costureiros bolivianos.
O povo que
mais celebra o Carnaval no mundo, a festa do “todosjuntos”, está pendurando no
pescoço placas de “não se aproxime”. Caso contrário, mata-se, xinga-se,
chuta-se, joga-se no lixo e, depois, taca-se no fogo.
Por esses
dias, todas as vezes que alguém diz “nossa, como o ano passou rápido, já é
Natal!”, imagino que, embora galopante, o tempo sempre permite momentos de
calmaria ao pensamento para que se revejam rumos, ações e atitudes.
Como diria
minha tia Filinha, “difinitivamente” a felicidade vai habitar o um de maneira
completa e em cores. Ela precisa e exige o dois, o dez, os 10 milhões para
reverberar, para se multiplicar e se fortalecer. A felicidade é solidária.
Jairo Marques
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