Esse foi o tema do Encontro
da Ordem dos Pastores Batistas do Brasil – Seção São Paulo no dia 28 de Março
de 2016 na Primeira Igreja Batista do Brás (São Paulo).
Um tema profundamente
propício para um tempo como o nosso onde perdemos a definição de justiça, ou estamos em busca de uma
síntese e não encontramos.
A proposta em atrelar o
reino de Deus e a sua justiça faz todo o sentido desde os profetas, como
Jeremias, Amós, até Jesus de Nazaré. A justiça está presente na proclamação do
reino de Deus.
Na abertura do Evangelho
de Mateus, a primeira palavra de Jesus é justiça
(3,15).
No Evangelho de Mateus justiça é uma fidelidade nova e radical
à vontade de Deus. Isso podemos ver no texto de Mateus 6,33 como em todo o
Evangelho de Mateus.
Ocorre que temos sérias
dificuldades para compreender o reino de
Deus assim como está nos evangelhos.
Isso se deve, acredito, pelas concepções escatológicas que cultivamos. Uma dessas
razões, foi colocar o tema do reino de
Deus na seção “Escatologia” das teologias
sistemáticas.
A teologia sistemática olhou para Jesus a partir das doutrinas estabelecidas
nos Concílios e não focou na caminhada de Jesus entre o povo. A grande maioria
das Teologias Sistemáticas não se
preocupam com aspectos do cotidiano de Jesus, mas sim em doutrinas
estabelecidas no decorrer da história da igreja. Com isso, deixaram o tema do reino de Deus como sinônimo de milênio. Um equívoco.
Em outro momento, o reino de Deus passou a ser subjetivo –
dentro do coração da pessoa.
A exegese bíblica
recuperou a concepção de reino de Deus no
Novo Testamento e biblistas são unânimes em afirmar: o centro da mensagem de Jesus foi o reino de Deus.
Nos esquecemos disso
quando, usamos “a teologia da volta de Cristo como despiste para não se cumprir
as exigências do evangelho do reino” (Israel Belo de Azevedo).
A realidade do reino de Deus no
Evangelho de Mateus
O reino de
Deus é uma realidade divina e
humana. Tem origem em Deus e entra no mundo para alcançar o ápice em Deus.
É futuro, e ao mesmo
tempo, presente (Lc 17,21-22).
Cresce sozinho, sem lutar
contra os inimigos; sem observância meticulosa da Lei.
Requer a colaboração
humana (da igreja).
Dissemina-se de modo
extraordinário pelo dinamismo e requer uma decisão radical para que se possa
instaurá-lo e retê-lo.
Não aponta para uma
extensão territorial, mas designa uma força divina – é o próprio Deus enquanto
Senhor.
O tempo do reino de Deus se inicia não no cronos, mas no kairós – objeto de confiante expectativa, por isso a oração “venha
a nós o teu reino”.
No Evangelho de Mateus há uma estreita relação entre o reino de Deus (céus) e a justiça.
A busca do reino de
Deus se concretiza na busca da justiça. É a participação naquilo que Jesus
propõe, ou seja, concretizar o reino de
Deus. Por isso, seguir Jesus, torna-se para os discípulos, seguir o caminho
da justiça (21,32).
Essa justiça precisa ser superior aos dos fariseus (5,20). Os
reconhecidos discípulos de Jesus têm fome e sede de justiça (5,6). Por causa
sela, eles serão perseguidos (5,10).
Se há a prática da justiça atrelada ao reino de
Deus em Mateus, há também a figura do justo.
Quem são os justos?
Os justos são aqueles que praticam a justiça como
agentes do reino de Deus; aqueles que
procuram agradar a Deus.
Os justos, para Mateus, não ficarão surpresos com
o julgamento (25,35-40), pois realizaram obras de justiça sem contabilizarem o
que estavam fazendo.
Para Mateus a prática da justiça é realizar o reino de
Deus, e os justos são os agentes
dessa prática que antecipa o reino de
Deus no meio da sociedade.
Conclusão
Os batistas já foram mais comprometidos com a
sociedade e a prática da justiça.
Os batistas produziram um documento (Manifesto
dos Ministros Batistas do Brasil – 1963) em que o tema da justiça era
contemplado.
Nesse documento
no item Justiça Social, diz:
Reconhecemos a
inadequação da presente estrutura social, política e econômica para a
realização plena da justiça social, pelo que insistimos na necessidade de um
reexame corajoso, objetivo e despreconcebido da presente realidade brasileira,
com vistas à sua estruturação em moldes que possibilitem o atendimento das
justas aspirações e necessidades do povo.
Essa necessidade
ressalta da constatação da ineficiência dos institutos assistenciais do Estado,
que transformam num favor concedido a custo, direitos líquidos dos
trabalhadores; da irracional aplicação dos recursos públicos, que deveriam
antes de se destinar, mais liberalmente, aos ministérios da Saúde, Educação e
Agricultura, para a solução de problemas sociais angustiantes; da sobrevivência
de regimes feudais de propriedade e exploração da terra; da generalizada
pobreza das populações carentes mesmo do alimento indispensável à sobrevivência;
da injustiça na distribuição das riquezas, e da utilização destas para o
cerceamento das liberdades essenciais; da inadequada exploração das nossas
riquezas naturais, cujo aproveitamento não só deveríamos intensificar, como
fazer revestir-se de significação social; do crescente empobrecimento do
patrimônio nacional pela remessa para o exterior dos lucros, extraordinários
auferidas em nosso país; da corrupção que tem campeado nos pleitos eleitorais,
na prática policial (quer preventiva, quer corretiva), na previdência social,
no preenchimento de cargos públicos, na aplicação dos recursos sindicais, etc.
São ainda
evidências daquela afirmação o tratamento meramente policial dado aos
movimentos populares da cidade e do campo, que mereciam ser antes objetiva e
carinhosamente estudados, para que viessem a ser orientados construtivamente
para o bem geral, através do atendimento das suas justas reivindicações; como
também aos movimentos de greve, que, se muitas vezes desvirtuados, se
constituem, entretanto, num instrumento legítimo de reivindicação social e de
preservação dos direitos dos trabalhadores, e que deveriam, por isso mesmo, ser
objeto de uma cuidadosa regulamentação.
Embora afirmemos
ser a renovação do homem, mediante a transformação da personalidade, operada
por Jesus (visto, o fundamento básico sobre que terá de se alicerçar uma
sociedade realmente nova, propugnamos também pela realização de reformas de
base na vida nacional, de sorte a possibilitar à criatura a concretização de seus
legítimos anseios terrenos).
Por isso,
preconizamos a promoção urgente de reformas tais como: a) reforma agrária, que
venha atender às reivindicações do homem do campo explorado; b) reforma
eleitoral, que venha liquidar as circunstâncias que possibilitam e estimulam os
nossos maus costumes políticos; c) reforma administrativa, que ponha termo ao
nepotismo, ao filhotismo e à ineficiência tão generalizada quanto onerosa dos
serviços públicos; d) reforma da previdência social, que venha pôr em
funcionamento as nossas leis sociais com o pleno reconhecimento e o efetivo
atendimento dos direitos dos que trabalham.
(O Jornal Batista – 14 de Setembro
de 1963)
Hoje presenciamos notas públicas com o
intuito de amenizar discussões irrelevantes entre calvinistas e arminianos,
enquanto poderíamos ser mais proféticos e promotores da justiça do reino de Deus.
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