O
Jornal Batista (CBB) de 05.07.2015 foi histórico.
Diante
de um acontecimento desagradável com a menina Kaillane (11 anos) que sofreu
agressão por estar saindo de uma cerimônia religiosa do candomblé, irmãos e
pastores batistas fizeram uma manifestação contra a intolerância religiosa, repudiando não apenas o ato agressivo
contra a menina Kaillane, como também qualquer discriminação e preconceito a
religiosidade do outro. A manifestação ocorreu no Rio de Janeiro, cidade da
Kaillane, e, além de outros pastores presentes, o Pr. João Luiz Sá Melo (pastor
na Primeira Igreja Batista em Vila da Penha, bairro da menina Kaillane), marcou
a sua presença nesse ato em prol a liberdade
religiosa. O Jornal Batista dedicou uma edição para não só tratar desse
tema, liberdade de crença, como
também questões ligadas ao movimento LGBT, Ensino Religioso e Racismo. Definitivamente
uma edição que representa a trajetória dos batistas
e a defesa de seus princípios,
entre eles a liberdade religiosa, para
todos.
Os
batistas, historicamente, surgem na
Inglaterra do século XVII. Em meio à efervescência de movimentos emancipatórios
que tem na filosofia de John Locke, por exemplo, um discurso libertário, os batistas têm traços constituídos por princípios, sendo que, em meio a
princípios teológicos, os principais princípios
são político-filosóficos.
Somos
filhos do liberalismo inglês.
O
liberalismo é uma reação ao
absolutismo.
Um
dos principais expoentes do liberalismo político
foi, indubitavelmente, John Locke.
Na
Inglaterra o apogeu do absolutismo se
deu com o rei Henrique VIII, que com o apoio do Parlamento inglês, que na sua
maioria eram burgueses, concentrou o poder nas mãos do rei.
Nesse
cenário político, Locke foi um ferrenho defensor da liberdade civil e
religiosa. Para ele “os homens são todos, por natureza, livres, iguais e
independentes, e ninguém pode ser despossuído de seus bens nem submetido ao
poder político sem seu consentimento”.
Os
batistas são herdeiros desse
pensamento e, como tal, em seus princípios
a liberdade religiosa (para si
mesmo, num primeiro momento como recurso de sobrevivência) e a separação entre Igreja e Estado se tornam
duas lutas que custaram vidas, entre elas a de Thomas Helwys. Arguto para o seu
tempo, Helwys foi um defensor da liberdade
religiosa e, por isso, enfrentou o rei.
Isso nos mostra de como os batistas não podem abrir mão de sua gênese, daquilo que fizeram os
ancestrais enfrentar a prisão e a morte. O autor de Uma breve declaração do mistério da iniquidade endereçou seu texto
ao rei Tiago I e por isso a prisão foi sua última “casa”. Razão para isso? Em um
regime absolutista nenhum rei gostaria
de ver alguém propagando ideias como essas: “o rei é um homem mortal, e não
Deus [...] não tem poder sobre as almas imortais dos seus súditos”.
Helwys defendeu até o último momento de sua vida
a liberdade religiosa para todos: “que
sejam heréticos, turcos, judeus ou o que quer que sejam, não compete a qualquer
poder terreno puni-los na menor medida que seja”. Helwys morre em uma prisão em
1616.
Não podemos ser apenas tolerantes com a religião do
outro. Há uma diferença entre liberdade
religiosa e tolerância religiosa.
É Walter B. Shurden quem esclarece isso: “a tolerância religiosa é apenas uma concessão; a liberdade religiosa é um direito”.
A manifestação envolvendo batistas no Rio de
Janeiro está perfeitamente dentro do movimento batista em prol da liberdade
religiosa na história.
É preciso, honestamente, reconhecer e lutar
para que cada um tenha o seu direito garantido
de viver a sua fé e religiosidade. Não é possível, principalmente entre os batistas que priorizam os seus princípios, respeitar e fazer respeitar
a religião do outro.
Com isso não se afirma que nenhuma
religião está fora da crítica ética e teológica, nem mesmo a nossa. Mas não é concebível
a partir de uma perspectiva de liberdade
religiosa o falar mal da outra religião
por ser religião, insultando seus
pressupostos. Dentro de um Estado democrático
e republicano, cabe à crítica, a avaliação argumentativa, a pesquisa das
estruturas religiosas, mas não cabe a dicotomia religiosa onde um acha que a sua religião é melhor do que a do outro.
Como batistas que tem
uma tradição em defesa da liberdade do indivíduo e religiosa,
poderíamos ser protagonistas não apenas em situações como da menina Kaillane,
mas em um Estado democrático de direito levantar essa bandeira o mais alto que
puder.
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