Saiu no jornal denominacional do Estado de
São Paulo. O título da reportagem: “uma igreja tradicionalmente batista”.
Na referida reportagem a igreja se “orgulha”
em ser tradicionalmente “batista” por entender algumas questões que, na sua
visão, as igrejas batistas não fazem ou não são mais do jeito que essa igreja é.
Daí a ênfase no “tradicionalmente”, por entender que há outras igrejas coirmãs
que não são “tradicionalmente” batistas. Por isso a necessidade de serem
distinguidos, diferenciados em relação às igrejas que são batistas, mas não são
tradicionalmente batistas.
O que define o “ser” batista? O que uma
igreja batista deveria ter e fazer? Há um parâmetro para uma Igreja ser de fato
Batista? Existe uma norma, um código doutrinário que a define como Batista? Sim
existe, mas isso não é uma régua eliminatória que exclui outras comunidades que
não entende e não veja da mesma forma.
Para a igreja da reportagem, que se define
como uma igreja tradicionalmente batista, ser batista é:
Permanecer ao longo do tempo como uma igreja realmente
batista, na pregação bíblica, na preservação e busca da música sacra com
excelência na letra e melodia, [...] a escola (leia-se EBD) funciona sem
inovações, seguindo a agenda tradicional, que é muito eficiente, com a abertura
tradicional de antigamente, em que são recitados o tema e o texto básico, e os
aniversariantes são chamados à frente. São utilizadas as revistas da
denominação.
Para essa igreja que se proclama tradicionalmente batista a sua definição
do ser batista passa, exclusivamente,
pelo modus operandi da estrutura
eclesiástica.
Não apenas essa igreja, mas igrejas e
pastores tem reivindicado o “tradicionalmente” para dizer que não é igual às
outras igrejas. Como um sinal de identidade, igrejas como essas da reportagem
buscam uma definição identitária e, se for possível (e é), desqualificar outras
comunidades que não prezem pelos mesmos valores e comportamentos defendidos por
uma igreja “tradicionalmente” batista.
Se o que seja “antigo” funciona como sinal
de vitalidade e coerência, os batistas ingleses são os tradicionais, pois o
movimento batista surge na Holanda/Inglaterra tendo sua gênese no movimento liberal inglês, eles participam dos
anseios e perspectivas de sua época, ou seja, liberdade religiosa e separação
entre Igreja e Estado. Esse ímpeto por liberdade levou o filósofo inglês John
Locke a dizer que “os batistas foram
os primeiros proponentes de uma liberdade absoluta, justa e verdadeira
liberdade, liberdade igual e imparcial”. Esse intenso debate em torno da liberdade notabilizou os batistas como um grupo que lutou – a priori para a sua própria
sobrevivência – contra absolutismos e posturas dogmáticas. E isso teve
consequências para a sua eclesiologia,
entendendo que esta deveria ser congregacional,
ou seja, igrejas livres e autônomas
sem vínculo com a igreja oficial. Os batistas
ingleses são partidários desses ideais. Assim, seguindo uma lógica de que o
antigo é o tradicional, uma igreja tradicionalmente batista deveria lutar pela
liberdade em todas as esferas, política, social e teológica. Não poderia haver
nenhuma tutela em termos de controle eclesiológico, político ou teológico que
determinasse a dinâmica de uma comunidade.
Se a igreja da referida reportagem quer ter
(e continua tendo) uma seleção musical que agrade a sua membresia; uma “escola”
que siga a “agenda tradicional”, uma agenda que apenas a igreja entende, não há
problema algum.
A questão é colocar a igreja como uma
autêntica representante da denominação e trazer para si a marca de uma igreja
que seja realmente batista por fazer e entender coisas do cotidiano de uma
comunidade e seu comportamento cúltico e ético.
Sendo assim, não há nenhuma igreja que seja
tradicionalmente batista.
Os batistas são fruto do seu tempo e são chamados
a serem relevantes para esse tempo, assim como foram os batistas ingleses e os
norte-americanos e tantos outros batistas espalhados pelo mundo. Reivindicar uma
“continuidade” com o movimento batista tendo como critério maneiras de ver o
culto, a liturgia e a maneira de aplicar o ensino religioso, não dá
legitimidade para dizer que seja uma igreja diferentemente de outras por
entender e fazer as coisas dessa ou de outra forma.
A grande marca do ser batista é a liberdade.
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