12.4.11

DEUS NAS TRAGÉDIAS

Em solidariedade às crianças de Realengo, Rio de Janeiro

Tragédias como a que acabamos de ver em Realengo, no Rio de Janeiro, além de nos deixar profundamente chateados com a vida e consternados com o fato, levanta, inevitavelmente, questionamentos sobre Deus e sua atuação no mundo. Em momentos como esse se faz teologia a partir de um fato, colocando na conta de Deus mais uma fatalidade, e como a religiosidade do brasileiro tem uma imagem de Deus a partir da sua soberania, do conceito de Todo-poderoso, se coloca a possibilidade de ter ou não “permitido” a tragédia. Quando não é aqui a catástrofe, mas em outro lugar como a que ocorreu no Japão recentemente, se atribui ao fato do país/povo não ser cristão, uma ideia que não corresponde com uma imagem saudável de Deus.

Não é de hoje que o problema do mal assola a humanidade. O filósofo grego Epicuro já alertava para o grande dilema: “ou Deus quer tirar o mal do mundo, mas não pode; ou pode, mas não quer tirá-lo; ou não pode nem quer; ou pode e quer. Se quer e não pode, é impotente; se pode e não quer, não nos ama; se não quer nem pode, não é o Deus bom, e, além do mais, é impotente; se pode e quer – e esta é a única alternativa que, como Deus, lhe diz respeito – de onde vem, então, o mal real e por que não o elimina de uma vez por todas?” A convivência com o mal e suas consequências sempre trouxeram dificuldades com relação a Deus. Ora se entende como sendo sua permissão, como se ele fosse um ser sádico que sentisse prazer no sofrimento; ora como parte dos seus infinitos e insondáveis planos, como que quisesse nos ensinar algo lá na frente, não importando muito com perdas de vidas; outros ainda concebem como castigo mesmo.

No triste caso do Rio de Janeiro, vi uma avó desesperada questionando Deus: “por que meu Deus, minha neta, saiu para vir à escola?” Uma cena triste que eu, particularmente, chorei. Mas o que dizer para essa avó? Deus deixou o assassino atirar em todos por que ele quis? Se ele é Todo-poderoso (compreensão que não se encontra na Bíblia) por que permitiu?

É difícil digerir isso, mas o fato é que o mal se dá na própria finitude do ser humano. A finitude implica imperfeição, e o que sofre de imperfeição é passível do mal porque está em processo de construção. Em qualquer realidade finita e limitada o mal é uma possibilidade. Neste sentido o mal não está em Deus, mas sim na limitação e finitude do mundo e do ser humano. Além do mais, o ser humano já provou que quem conduz a sua história é ele mesmo, e em importantes momentos dela, ele deixou Deus de fora.

As pessoas que questionam Deus diante das tragédias, não podem esquecer que o próprio Deus já presenciou e participou de algumas. Dois exemplos marcantes: 1). Israel no exílio: quando da invasão do exército de Nabucodonosor (2Rs 24-25), destruiu a cidade de Jerusalém e o Templo, centro de referência para a presença de Deus no meio do povo, as pessoas perderam suas terras, religião, família e sentimento de nação e foram habitar em terras estranhas (Sl. 137). Deus padece com o seu povo, sofre com suas dores. Diante da tragédia do exílio, profetas como o Segundo-Isaías irá transportar as histórias de Deus com o povo de Israel para o futuro (Is. 40) e delas tirar esperança de dias melhores; 2). O Calvário: outra tragédia que Deus participa e sofre junto é a cruz, expressão máxima de seu amor, mas também confirmação de que a humanidade pode construir a sua própria história sem se ater a sua vontade. No Gólgota, transparece a impotência divina sendo sucumbida pelo mal. Deus não planeja, muito menos permite, mas suporta a morte como algo inevitável por amor. Ele sofre com Jesus na cruz. É por isso que ele sabe muito bem o que é passar por tragédias.

Diante da tragédia do Rio de Janeiro, não questiono Deus se permitiu ou não. Penso que ele padece juntamente com aquelas pessoas que perderam seus filhos numa idade que se constrói o futuro e se planeja a vida. O fato é que vamos conviver com o mal enquanto aqui estivermos porque ele faz parte da nossa condição de criaturas finitas e limitadas. Mas é importante salientar, temos Jesus que nos ensinou a compreender a vida.

Um comentário:

Anônimo disse...

Deus está no controle? Essa é a dúvida de Ricardo Godin, R.Kivts e outros seguidores do Teísmo aberto ou teologia relacional, onde Deus não é tão deus, não tem o controle sobre os acontecimentos catastróficos. Porém nós cremos no Deus Todo Poderoso, presente, conhecedor de tudo e que não muda. Deus é o mesmo ontem, hoje e para sempre será. Deus é Poder para curar, libertar e transformar. Seu poder não cessou. Quanto a teoria de Epicuro o apóstolo Paulo já o combateu em ATos 19, tanto Epicuro quanto Zenon (estoicismo) foram combatidos porque não criam num Deus Todo Poderoso. Eram carnais pensavam somente nos prazeres. Nós não, nós cremos e somos daqueles que confiam no Poder de Deus.
PEDRO AUGUSTO BONNA