Religião é rede simbólica perpassada por memórias, metáforas, ritos e narrativas, cujo sistema interpreta o mundo e a realidade a partir do conjunto de valores e saberes partilhados por determinado grupo. Por vezes, o fiel se sente na obrigação de defender seus dogmas e verdades irredutivelmente, ao mesmo tempo em que precisa proteger seus líderes, dos quais aceitam acriticamente suas informações sagradas. No Brasil, temos testemunhado um tipo novo de fenômeno religioso: a bolsorreligiosidade. Em termos gerais, essa nova expressão de fé tem algumas características: moralismo intolerante, messianismo acrítico, monofonia, sacrificialismo violento, antipatia à ciência, dualismo e verborragia com indícios de pós-verdade.

Comum nas expressões religiosas mais fundamentalistas, costuma relativizar o valor da ciência ou mesmo negá-la. Em sintonia com discursos e mentalidade medievais, essa expressão religiosa repetidamente desqualifica o saber científico. Na bolsorreligiosidade o obscurantismo e a ignorância são tratados como provas de fé e fidelidade. Naturalmente, nessa perspectiva, o mundo deixa de ser social e historicamente complexo, pois é dividido de maneira maniqueísta e dualista: nós x eles, bons x maus, cidadãos de bem x comunistas, fiéis ao Messias x marxistas. E, como estratégia de blindagem de suas contradições e legitimação das incoerências, usam-se expressões verborrágicas perpassadas por tendências comuns da “pós-verdade”: o real e verdadeiro serão sempre modelados pelas crenças do seu líder, mesmo que não haja qualquer fonte legítima ou plausível. Por ser fortemente retórica, as afirmações aceitas pelos seus fiéis não dependem de comprovação, bastam repetir discursivamente suas crenças.
Por essa razão, precisamos, mais do que nunca, preservar no Brasil a inegociável separação entre religião e Estado.
Kenner Terra
Jornal A Gazeta
6 comentários:
Texto espetacular, obrigado professor.
Nossa! Muito bom,um texto que expressa de uma maneira geral o que estamos vivenciando... Excelente!!!
Bom. Danke. Texto corajoso pra época...
Parabéns bem completo ,e eu que pensei que a kukuklam era só em filmes estrangeiros
Todo fanatismo e perigoso,
Vejo a questão bolsonaro com preocupação,
Postar um comentário