Ainda que essa discussão sobre a reforma da
Previdência seja um tanto técnica, o atual texto enviado pelo governo ao
Congresso Nacional tem sérias questões discutíveis. Um deles, que saltam aos
olhos do leitor mais atento, se refere ao BPC (Benefício de Prestação
Continuada). “Pela proposta, a partir dos 60 anos, os idosos receberão apenas 400,00 reais de BPC. A partir de 70 anos, o valor sobe para um salário mínimo. Atualmente, o BPC é pago para pessoas com deficiência, sem limite de idade, e idosos, a partir de 65 anos, no valor de um salário mínimo. O benefício é concedido a quem é considerado em condição de miserabilidade, com renda mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo”. O governo quer manter o texto a qualquer custo,
mesmo admitindo que algo assim sofrerá mudanças na Comissão Especial da reforma da
Previdência. Ou seja, o governo até admiti rever o texto no caso do BPC, mas
foi o governo que elaborou algo tão maléfico. Quando o governo formula algo assim, diz muito que não está nem um pouco preocupado com os mais pobres. O governo
diz que cortará privilégios, mas não diz quais os privilégios e como fará isso.
A sua maior preocupação não se dá com o bem estar e a eficiência da seguridade
social daqueles que mais precisam dela, os pobres. A sua obsessão é economizar algo em
torno de mais de 1 trilhão de reais em 10 anos em cima de pessoas. Para quê economizar essa
quantia? Quem seriam os beneficiados, o povo? Há dúvidas quanto à isso.
O fato é que a preocupação do governo até o
momento com a “nova Previdência” é economizar dinheiro com gente, e gente
pobre. É claro que todos nós gostaríamos de ver o país crescendo economicamente
e sendo alvo de investimentos e a reforma da Previdência contribui e muito para
que isso aconteça. Mas ao que parece, os menos favorecidos, os desprivilegiados
da sociedade brasileira, irá pagar a conta. No Brasil não há estabilidade no
trabalho e isso implica em que a maioria dos trabalhadores não terão suas
aposentadorias integrais, porque é praticamente impossível contribuir por 45
anos com a Previdência. Além disso, o governo está colocando a contribuição
mínima de 20 anos (hoje é de 15 anos), o que torna a possibilidade de se
aposentar por tempo de contribuição nula, apenas por idade. A proposta do
governo é de 62 anos para mulheres e de 65 anos para homens. No caso das
mulheres, que exercem uma vida laboral maior que os homens, essa idade mínima é
um acinte, na falta de outra palavra.
Diante desse quadro, o que os Batistas têm a
dizer?

Agora o “jogo” mudou. É outro governo e muitos
batistas expressaram apoio irrestrito ao então candidato à Presidência da
República, o senhor Jair Bolsonaro (PSL/RJ). Houve pastores que, pela primeira
vez em campanhas majoritárias para presidente, colocou um candidato no púlpito
e lhe deu a palavra. Os batistas ao longo da sua história, prezou pela isonomia
em temas nacionais, mas nos últimos três anos ficou recorrente entre os
batistas apoio à candidatos. O presidente da CBB, apareceu em vídeo conclamando
os batistas a orarem e fazerem jejum quando o STF estava julgando a
possibilidade ou não de prisão em segunda instância, o que favoreceria um candidato à presidente nas eleições de 2018.
Podemos esperar que essas mesmas lideranças
denominacionais emitirão suas opiniões quanto à proposta do governo para a
Previdência Social?
Os batistas ainda que tenha a separação de Igreja
e Estado como um dos Princípios mais caros da sua história, não se omite quanto
a ética social. Na Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira
(CBB), há o item “XVI – ORDEM SOCIAL”. Ali diz claramente que o “cristão tem o
dever de participar em todo esforço que tende ao bem comum da sociedade em que
vive”. O texto traz a palavra “esforço”, ou seja, é preciso fazer algo quando
necessário para que o “bem comum da sociedade” seja levado em consideração. Além
disso, o texto reforça algo que está ficando cada vez mais escasso no país, a
justiça social. Por isso reitera enfaticamente: “Como cristãos, devemos
estender a mão de ajuda aos órfãos, às viúvas, aos anciões, aos enfermos e a
outros necessitados, bem como a todos aqueles que forem vítimas de quaisquer
injustiça e opressões”. Qualquer desavisado iria considerar essa declaração “esquerdista”
porque traz as palavras “injustiça” e “opressão”. Palavras que se tornaram
subversivas e indicadoras de “socialismo” no atual contexto polarizado em que
vive o país, onde o ódio cegou o entendimento de muitos, principalmente irmãos.
Acontece que a Declaração Doutrinária da CBB foi elaborada em 1986, e a nossa
Constituição cidadã foi promulgada em 1988. Portanto, a Constituição que vigora
no país garante esses direitos aos necessitados e a Declaração Doutrinária da
CBB antecipou isso profeticamente. Agora os batistas estão envolvidos na
reelaboração de uma “nova” Declaração Doutrinária, o que entendo ser
desnecessária. Parece que essa preocupação com o “revisionismo” se dá,
infelizmente, com a questão da homoafetividade. Haverá alguma alteração para
melhor no item “Ordem Social”? Não sei. Veremos em 2020 quando a CBB se reunirá
em Goiânia/GO para tratar do tema.
Os batistas, comprometidos com o reino de Deus,
têm a tradição e a oportunidade de dizer profeticamente que o que está proposta
aí com a “nova Previdência” fere de morte os menos favorecidos. Além da tradição,
os batistas têm texto denominacional (a Declaração) que diz expressamente qual
a missão com os mais pobres: estender as mãos para ajudar o órfão, a viúva e vítimas
de injustiça e opressão. Nesse sentido, os batistas estão consoante com os profetas do Antigo
Testamento, mas, principalmente, estão seguindo as pegadas do Nazareno – “Bem
aventurado os que têm fome e sede de justiça” (Mt 5,6).