Uma reflexão a partir de Friedrich Nietzsche (1844-1900)
A vida é incertezas, ela não é matemática, ela é superação, desespero, esperança, amor, ódio... Eu não sei por que há pessoas que param na rua para aquelas ciganas lerem as mãos; há ainda àqueles que vão à cartomante para jogar os búzios e as cartas de tarô; sem contar os “profetas” que estão por aí dizendo o que vai acontecer. A vida é projeção, construção, nada pronto, é imperfeição e isso é uma bênção.
No aspecto religioso nossas igrejas estão cheias de pessoas procurando saber qual é a “vontade de Deus” para as suas vidas. É o jovem que diz que esta orando para ver se o namoro com a moça é da “vontade de Deus”; é uma família que esta com um enfermo em casa e sempre esta orando para saber qual é a “vontade de Deus”; a saída ilesa de um acidente é interpretada como “livramento de Deus”, portanto, não era da sua “vontade” a morte naquele momento, como se ele tivesse um relógio celestial em que marcasse a hora das pessoas morrerem. Apegamo-nos em algo que possa compensar a fragilidade, e a religião é uma dessas formas, ou um código simbólico para fazer uma leitura, ainda que ilusória em alguns momentos, da realidade.
Lembro-me de um caso que vi na tevê (escrevi um texto no dia 13/06/09 “Era possível um milagre?”) sobre o acidente do avião francês da companhia Air France. Bem, um programa de TV entrevistou um rapaz que no último minuto foi impedido de embarcar porque o avião já estava taxiando. Estavam no programa mais dois convidados: um astrólogo e um teólogo da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Eles tentavam entender porque o jovem não morreu com todos os outros. Para encurtar aquelas bobagens, que nem mesmo tive paciência de acompanhar até o fim, o professor universitário afirmou que o jovem não entrou no voo porque ele precisava acertar alguma coisa em sua vida, por isso Deus o poupou. Simplesmente um absurdo. Uma postura recheada de conceitos calvinistas. Mas que Deus seria esse que poupou apenas uns e não mais de 200 pessoas? Se pudesse impedir, para quem entende que Deus permite tudo e se permite pode impedir, por que não segurou a aeronave no ar?
O fato, e podem discordar, é que, para não aceitar a vida e suas vicissitudes, as pessoas se valem de subterfúgios. Prova disso é a sociedade que vivemos onde o vazio existencial é preenchido por drogas, moda, compras, violência. Talvez as minhas reflexões não sejam interpretadas no sentido de alguém que quer buscar outros discursos para ler a vida, mas quando proponho Friedrich Nietzsche é porque ele foi filho de pastor luterano, portanto conhecia a Bíblia e até pensou em seguir o mesmo caminho do pai, mas que num dado momento percebeu que o cristianismo em voga era insatisfatório para responder aos anseios humanos, e parece que hoje a história se repete quando há um cristianismo que acentua seus valores, suas regras, suas receitas, em detrimento da vocação humana para a liberdade.
Nietzsche é influenciado, num primeiro momento, por Schopenhauer e sua obra O mundo como vontade e representação, uma filosofia pessimista da vida, mas ainda, no entender de Nietzsche uma metafísica da vontade. O que ficou dessa leitura foi a convicção de que o homem é um eterno insatisfeito. Um ser que comunga dor e prazer, e que, portanto, é ilusão conceber a vida sem dor.
As leituras em Schopenhauer e Dostoiévski levaram o jovem Nietzsche a ver a vida, a cultura e, principalmente, a ciência com outros olhos. Numa época em que o pensamento filosófico era impregnado de conceitos científicos, e, portanto, a vida tinha a sua causa e efeito, Nietzsche valoriza a vida e suas contingências desconsiderando o aspecto cientifico com a pretensão de explicar tudo a partir da razão. Ele via a vida não como lamentação; a tragédia não como expiação, mas como necessária ao crescimento vital da vida. A vida é uma constante transformação, e por isso, deve-se estar preparado para o inesperado, para a surpresa, para as batalhas que ela oferece.
Alguém que experimentou a solidão profundamente; experimentou a rejeição da sua bela Lou Salomé, aluna russa que não quis casar-se com ele; acometido de uma doença mental incurável, Nietzsche, mesmo doente, era saudável. Ele tirava proveito dos momentos mais dolorosos da vida.
Nietzsche concebe a tragédia como algo que ocorre, naturalmente, à vida. Ele aceita as contingências da vida de forma aberta, sem mediações, quer cientifica ou religiosa, pois a vida é assim, incertezas, vicissitudes.
Continuo...
2 comentários:
Puxa cara, vc escreveu algo que eu estava para escrever, rs. A contingência! Acredito que o não ver a vida pela ótica da contingência é viver sem liberdade, é apelar para um fatalismo ou uma ação pedagógica de Deus. Não consigo mais ver Deus dessa forma. Belo texto. Um abração
Hi! Cheguei primeiro (rrssrr). Acho que nossas ideias batm , por isso a mesma temática e disposição teológica. O segundo texto irá tratar da inquietação religiosa, acredito que vc vai gostar.
Obrigado pela gentileza de acompanha meus textos, se puder divulgue o blog com seus contatos.
Valeu!
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