“A Convenção Batista Brasileira (CBB) é o órgão máximo da denominação batista no Brasil. É ela quem define o padrão doutrinário e unifica o esforço cooperativo dos Batistas do Brasil”.
Esse enunciado está no documento da CBB que tratou de um Concílio Decisório envolvendo a Igreja Batista da Praia do Canto (Vitória/ES) e um pequeno grupo de pessoas (25) que foram até a justiça para retirar da liderança da igreja o pastor Usiel Carneiro, que tem o apoio da maioria dos membros da igreja [para saber mais].
A partir de uma concepção equivocada quanto aos limites da liderança da CBB e dos conciliáveis que emitiram o documento “Decisão do Concílio Decisório”, o juiz da área cível expediu uma liminar determinando o afastamento do pastor da liderança da igreja tendo como base este documento. Isto porque ele entendeu que a CBB tem a legitimidade da última palavra para determinar se uma igreja é ou não é Batista. O juiz, desconhecendo o funcionamento de uma Igreja Batista (o magistrado deveria consultar alguém que entendesse sobre a denominação Batista antes de proferir a liminar), julgou que a CBB é uma espécie de instituição-sede das “igrejas Batistas” que funciona a partir de um sistema episcopal ou hierárquico. Isso se deu porque no preâmbulo do documento diz textualmente que a CBB “é quem define o padrão doutrinário”. Uma vez que é ela, a CBB, quem define a doutrina, e ela acolheu as alegações do grupo litigioso, o juiz entendeu que a CBB está certa em relação aos requerentes.
Quem foi que deu essa prerrogativa para a CBB? Quando foi que a CBB passou a ser aquela entidade que “define o padrão doutrinário” dos batistas no Brasil?
Não
é de hoje que boa parte da liderança da CBB quer seguir os mesmos passos da
Convenção Batista do Sul dos EUA: ser um órgão escrutinador para dizer quem é e
quem não é “batista”. Uma instituição paraeclesiástica quer arrogar para si a
palavra final quanto a temas doutrinários de uma igreja local. Alguns alegam
que isso é possível porque a CBB tem uma “Declaração Doutrinária”. Será que é isso mesmo?
É importante lembrar a CBB dos seus limites:
1. Como já dizia o saudoso pastor Isaltino Gomes Coelho Filho, “a Declaração Doutrinária da CBB não é normativa, mas indicativa do que a maioria dos batistas creem”. Caso fosse normativa, nenhuma igreja poderia ter pastores “calvinistas”, uma vez que a Declaração Doutrinária não é “reformada”.
2. A Declaração Doutrinária da CBB não funciona, precisamente, como um mecanismo de uniformidade doutrinária. São os Princípios Batistas cotados como fundamentais para o modo de ser batista e não o sistema doutrinário, uma vez que os batistas não têm, na sua história, nenhum credo ou confissão que possa ser considerado como definitivo para a maioria dos batistas. Não será a CBB quem irá mudar isso.
3. O Estatuto da CBB, em cláusula pétrea, registra: “A Convenção reconhece como princípio doutrinário a autonomia das igrejas filiadas, sendo as recomendações que lhes são feitas decorrentes do compromisso de mútua cooperação por elas assumido”. Onde está escrito que é a CBB “quem define o padrão doutrinário”? Consta aí que é a igreja local e jamais a CBB. E não poderia ser diferente, uma vez que a tradição Batista tem na igreja local o seu início e o seu fim e não um órgão cooperativo como é a CBB.
4. A Convenção Batista Brasileira não tem como função ser a “guardiã da doutrina” entre os batistas. A CBB não tem competência burocrática e muito menos legitimidade bíblica por uma razão muito simples: a CBB não é uma igreja. Por esse fato, não pode usurpar a autoridade da igreja local e decidir por ela. Já dizia 𝐀. 𝐁. 𝐋𝐚𝐧𝐠𝐬𝐭𝐨𝐧, um dos autores que mais compreendia a denominação em 1933: “A Convenção Batista Brasileira não é uma super-Igreja ou espécie de Igreja-mãe, mas simplesmente uma organização auxiliadora das Igrejas locaes”.
5. O critério de verificação quanto a temas bíblicos e sua aplicação hermenêutica se dá, exclusivamente, pela igreja! 𝐉𝐨𝐡𝐧 𝐋𝐚𝐧𝐝𝐞𝐫𝐬, influente professor no Seminário Batista do Sul do Brasil (Rio de Janeiro) quando pesquisou os Princípios Batistas e escreveu um livro com o título “Teologia dos Princípios Batistas”, assegurou: “Em caso de diferença de interpretação bíblica, cada igreja batista tem que ler e interpretar a Bíblia para si mesma. De acordo com este princípio, cada igreja define sua própria maneira de proceder em questões duvidosas”.
Com isso, fica difícil entender como que uma liderança assume o “órgão máximo da denominação batista no Brasil” e não compreende os seus limites, atribuições, espírito cooperativo e não belicoso e desconhece o básico da tradição Batista quanto ao alcance da Declaração Doutrinária da CBB.
Estamos
diante de um fato curioso e, no mínimo, desonroso para os batistas brasileiros:
um juiz entendeu que a CBB é um órgão julgador por excelência em disputas entre
membros de uma Igreja Batista e, uma vez tomada uma decisão em um Concílio
Decisório que não seguiu todos os ritos previstos, o juiz entendeu que a CBB tem
autoridade para desconsiderar a vontade de quase 400 membros que caminha
apoiando o seu pastor e não desistirão de recorrer de uma decisão que foi induzida ao erro [resposta do pastor da IBPC].