Em Lucas 16: 1-9 Jesus conta a parábola do Administrador Infiel. Era um homem que roubava dos bens de seu patrão e foi descoberto. Ao ser descoberto ele chama os devedores de seu patrão e cobra destes menos do que deveria e assim ganha a simpatia deles que poderiam apoiá-lo num futuro próximo. Então no verso 8 Jesus elogia, não a desonestidade, mas a astúcia deste administrador, ressaltando que podemos aprender algo com as atitudes de incrédulos.
Veja bem, Jesus não aprova a desonestidade e esta pastoral não é uma apologia e nem julgamento a quem ingere bebidas alcoólicas (apesar de crer que Deus nos chamou à abstinência de álcool!), o objetivo dela é só traçar um curioso paralelo entre o pessoal que fica nos botecos e os que ficam na Igreja! Vamos lá:
Quando está frio o pessoal vai para o boteco “tomar uma” e esquentar, o pessoal da Igreja fica embaixo das cobertas em casa!
Quando está quente o pessoal do boteco vai “tomar uma” para refrescar, o pessoal da Igreja vai passar o fim de semana na praia!
O pessoal do boteco sempre tem um dinheiro para tomar mais uma, o pessoal da Igreja está sempre sem dinheiro para a cantina da Igreja, o dízimo, o passeio com o pessoal, etc...
O pessoal do boteco conversa bastante, o pessoal da Igreja chega atrasado e sai adiantado do Culto e nem cumprimenta ninguém!
O pessoal do boteco vai lá todo dia e quando viaja de férias acha um boteco pra ir. O pessoal da Igreja vem uma vez por semana e quando viaja foge de ir à Igreja, porque afinal está de férias!
O pessoal do boteco quando o amigo ou o parente vai visitar leva ele pro bar, o pessoal da Igreja quando tem visita falta no Culto!
O pessoal do boteco não tem pressa de ir embora, o pessoal da Igreja quer cultos mais curtos!
O pessoal do boteco trabalha durante o dia e encerra o expediente no bar, o pessoal da Igreja falta no Culto porque tem que trabalhar.
O pessoal do boteco quando tem problema em casa, no serviço, de dinheiro, de saúde ou o que for, vai pro bar para “esquecer”, o pessoal da Igreja quando tem os mesmos problemas falta nos Cultos porque tem mais o que fazer!
O namoro, os amigos, o trabalho, os estudos, o jogo de futebol, a família, ter que limpar a casa e lavar o carro, visitar os parentes, ir na festa de aniversário ou descansar não tira o pessoal do boteco, mas tira o pessoal da Igreja!
O pessoal do boteco trabalha duro a semana toda e vai pro boteco, o pessoal da Igreja trabalha duro a semana toda e falta na Igreja!
O pior de tudo: o pessoal do boteco não freqüenta a Igreja, o pessoal da Igreja freqüenta o boteco!!!
Dá para aprender algo com esta “teologia do boteco”?
Pr. Rodrigo de Frias Fontana
Igreja Batista em Sousas, Campinas (SP)
"Escrever é construir, através do texto, um modelo específico de leitor" (Humberto Eco)
13.7.08
MAIS UM POUCO SOBRE IGREJA
Para muitas pessoas, "igreja" é um lugar aonde ir. Ou uma instituição ou uma organização. Alguém que dizia seguir a Jesus referiu-se assim à igreja: "não tenho mais nenhum interesse nesta instituição". Recebi um e-mail de um ignoto, falando mal da igreja e se despedindo, pois se afastava. Sua carta, além de inconsistente, cheirava a ódio. Respondi a quem me encaminhou o e-mail: "já vai tarde. Não fará falta alguma". Nunca entendeu o que seja igreja.
Mas também recebi bom e-mail de uma ex-ovelha de Brasília, advogada, afeiçoada à nossa família e nós à dela. Ela se lembrava de uma frase que eu disse num sermão: "se você procura uma igreja perfeita, quando a encontrar, não entre nela para não estragá-la".
As pessoas cobram da igreja o que elas não são. É um paradoxo. Igreja não é instituição nem organização, nem lugar. Segundo a Bíblia, "igreja é gente". Quem fala mal dela fala mal de si. E é arrogante, portando-se como se fosse superior aos outros. Não sou um oráculo de Iahweh, mas em 36 anos de ministério notei que os crentes que mais falam mal da igreja são problemáticos. Nunca vi um crente piedoso, engajado, equilibrado, combater a igreja. Só os insubmissos, amargos e desagregadores. Que quando saem, a igreja melhora.
Os críticos da igreja são críticos do corpo de Cristo. Há pessoas que têm uma visão de cristianismo muito pessoal, para a qual querem adesão. Não a tendo, se revoltam e acham que todos estão errados. Cobram de outros o que elas não dão: perfeição moral, vida amorosa, absoluta integridade espiritual.
A igreja é um grupo de pessoas que provou a graça de Deus em Jesus, creu nele, comprometeu-se com ele e o segue. Não é perfeita. Deus não terminou sua obra em nós. Temos falhas e somos imperfeitos. E precisamos uns dos outros. Não existe cristianismo privado. O cristianismo exige compartilhamento e mutualidade. A igreja é um grupo de pessoas com suas vidas interligadas em Cristo, procurando viver em solidariedade e apoio espiritual.
A igreja precisa de amantes, não de apedrejadores. Ame a igreja.
Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho
Pastor da Igreja Batista do Cambuí – Campinas/SP
Publicado no "O Jornal Batista" - 02/03/08
Mas também recebi bom e-mail de uma ex-ovelha de Brasília, advogada, afeiçoada à nossa família e nós à dela. Ela se lembrava de uma frase que eu disse num sermão: "se você procura uma igreja perfeita, quando a encontrar, não entre nela para não estragá-la".
As pessoas cobram da igreja o que elas não são. É um paradoxo. Igreja não é instituição nem organização, nem lugar. Segundo a Bíblia, "igreja é gente". Quem fala mal dela fala mal de si. E é arrogante, portando-se como se fosse superior aos outros. Não sou um oráculo de Iahweh, mas em 36 anos de ministério notei que os crentes que mais falam mal da igreja são problemáticos. Nunca vi um crente piedoso, engajado, equilibrado, combater a igreja. Só os insubmissos, amargos e desagregadores. Que quando saem, a igreja melhora.
Os críticos da igreja são críticos do corpo de Cristo. Há pessoas que têm uma visão de cristianismo muito pessoal, para a qual querem adesão. Não a tendo, se revoltam e acham que todos estão errados. Cobram de outros o que elas não dão: perfeição moral, vida amorosa, absoluta integridade espiritual.
A igreja é um grupo de pessoas que provou a graça de Deus em Jesus, creu nele, comprometeu-se com ele e o segue. Não é perfeita. Deus não terminou sua obra em nós. Temos falhas e somos imperfeitos. E precisamos uns dos outros. Não existe cristianismo privado. O cristianismo exige compartilhamento e mutualidade. A igreja é um grupo de pessoas com suas vidas interligadas em Cristo, procurando viver em solidariedade e apoio espiritual.
A igreja precisa de amantes, não de apedrejadores. Ame a igreja.
Pr. Isaltino Gomes Coelho Filho
Pastor da Igreja Batista do Cambuí – Campinas/SP
Publicado no "O Jornal Batista" - 02/03/08
SOMOS DIFERENTES?
Conheço pessoas, e você também deve conhecer, que pratica coisas que discordamos e que achamos um absurdo. Alguém que compra algo mas não paga; alguém que sempre busca levar vantagens em tudo; discute com alguém e fala palavras horrendas para a outra pessoa; alguém que passa anos sem conversar com a outra pessoa porque em algum momento ela foi magoada e ofendida, e como não têm a prática de pedir desculpas ou perdão, fica ruminando aquilo por anos. Você deve conhecer pessoas assim. Na sua maioria são pessoas que não tiveram uma experiência com Deus por meio de Jesus Cristo, e para elas não faz a menor diferença fazer o contrário ou pensar diferente.
E nós, membros da Igreja que postulamos uma fé e afirmamos com o nosso hábito de vir ao templo de que participamos do Corpo de Cristo e que portanto temos uma "experiência" com Deus por meio de Cristo, somos realmente diferentes?
Em um dos textos do evangelho de Mateus, é nos apresentado uma ética ou um comportamento que deveria exceder ao daquelas pessoas que não têm um relacionamento com Deus. "Se vocês amam somente aqueles que os amam, por que esperam uma recompensa de Deus? (...) Se vocês falam somente com os seus amigos, o que é que fazem de mais?" (Mt. 5,43-48 - leia o texto inteiro).
Parece que não somos tão diferentes dos outros, que costumamos chamar de "incrédulos". Quando não gostamos de um irmão não falamos com ele, ainda mais se ele nos "ofendeu" de alguma maneira. Ele passa a não mais merecer a minha mão, nem mesmo os meus olhos em sua direção. E não há diálogo porque uma pessoa (irmão) assim não se pode conversar.
É sempre mais fácil conversar com quem não têm problema nenhum; amar alguém em que não há nenhum tipo de conflito. As pessoas que não postulam a mesma fé que nós fazem isso de uma maneira bem tranqüila, afinal de contas elas não têm Cristo como referencial de vida.
Estou me convencendo de que não somos diferentes. Às vezes fazemos a mesma coisa que aqueles que não conhecem a Deus, aliás se fazemos a mesma coisa, será que conhecemos este Deus apresentado por Jesus - tenho dúvidas. Acredito que seria mais sensato admitir de que não somos tão diferentes daqueles que não estão na Igreja, e que por isso não precisamos disfarçar uma "comunhão" medíocre e pecaminosa - pois é isso que é - quando participamos do Corpo de Cristo (Ceia do Senhor) e não reconhecemos aquele irmão como parte da comunhão o ignorando.
Amamos quem nos amam; falamos com quem são nossos amigos; e quem não é... dá licença! Porque por algum momento a pessoa deixou de ser digna do meu sorriso, aperto de mão e de um olhar. Se for assim não sei o que Cristo representa para nós - Cristo? Quem é este?
O que vemos são pessoas acostumadas com a Igreja e com a rotina do culto. É gente fria com Deus e imperceptíveis ao seu mover, mas se apega ao vir ao templo e isso basta. A reunião dos santos já não produz nenhum significado vivo. Senta-se no mesmo banco, pensa-se da mesma forma e age da mesma maneira sempre. Por isso a incapacidade de agir diferentemente daqueles que não conhecem a Cristo, se é que um dia o conheceram.
E nós, membros da Igreja que postulamos uma fé e afirmamos com o nosso hábito de vir ao templo de que participamos do Corpo de Cristo e que portanto temos uma "experiência" com Deus por meio de Cristo, somos realmente diferentes?
Em um dos textos do evangelho de Mateus, é nos apresentado uma ética ou um comportamento que deveria exceder ao daquelas pessoas que não têm um relacionamento com Deus. "Se vocês amam somente aqueles que os amam, por que esperam uma recompensa de Deus? (...) Se vocês falam somente com os seus amigos, o que é que fazem de mais?" (Mt. 5,43-48 - leia o texto inteiro).
Parece que não somos tão diferentes dos outros, que costumamos chamar de "incrédulos". Quando não gostamos de um irmão não falamos com ele, ainda mais se ele nos "ofendeu" de alguma maneira. Ele passa a não mais merecer a minha mão, nem mesmo os meus olhos em sua direção. E não há diálogo porque uma pessoa (irmão) assim não se pode conversar.
É sempre mais fácil conversar com quem não têm problema nenhum; amar alguém em que não há nenhum tipo de conflito. As pessoas que não postulam a mesma fé que nós fazem isso de uma maneira bem tranqüila, afinal de contas elas não têm Cristo como referencial de vida.
Estou me convencendo de que não somos diferentes. Às vezes fazemos a mesma coisa que aqueles que não conhecem a Deus, aliás se fazemos a mesma coisa, será que conhecemos este Deus apresentado por Jesus - tenho dúvidas. Acredito que seria mais sensato admitir de que não somos tão diferentes daqueles que não estão na Igreja, e que por isso não precisamos disfarçar uma "comunhão" medíocre e pecaminosa - pois é isso que é - quando participamos do Corpo de Cristo (Ceia do Senhor) e não reconhecemos aquele irmão como parte da comunhão o ignorando.
Amamos quem nos amam; falamos com quem são nossos amigos; e quem não é... dá licença! Porque por algum momento a pessoa deixou de ser digna do meu sorriso, aperto de mão e de um olhar. Se for assim não sei o que Cristo representa para nós - Cristo? Quem é este?
O que vemos são pessoas acostumadas com a Igreja e com a rotina do culto. É gente fria com Deus e imperceptíveis ao seu mover, mas se apega ao vir ao templo e isso basta. A reunião dos santos já não produz nenhum significado vivo. Senta-se no mesmo banco, pensa-se da mesma forma e age da mesma maneira sempre. Por isso a incapacidade de agir diferentemente daqueles que não conhecem a Cristo, se é que um dia o conheceram.
30.6.08
JESUS: O PREGADOR DO REINO DE DEUS
Nem sempre se soube lidar com a figura de Jesus. Para alguns no cristianismo primitivo ele tinha aparência de humano, mas não era – concepção conhecida como docetismo; outros postularam sua humanidade, mas que em algum momento ele foi adotado por Deus e elevado a condição divina – concepção conhecida como adocionismo. Sempre houve polêmica em relação a Jesus. Os debates nos Concílios sobre as duas naturezas e a luta contra o gnosticismo sempre levaram a igreja a formular doutrinas a respeito dele. Quando tornaram Jesus parte da Trindade, a teologia católica viu a necessidade em se buscar outro símbolo para ocupar o lugar daquele que deixa de ser humano para se tornar divino. O subterfúgio vem com a teologia mariana na Idade Média e o dogma da Assunção de Maria sancionado pelo Papa Pio XII em 1950. No século XIX e XX os fundamentalistas do norte acentuaram mais ainda a natureza divina de Jesus como reação e resposta a chamada teologia liberal nascida no velho continente. Esse Jesus desenhado pelos fundamentalistas estava envolto em três temas: o berço, a cruz e o túmulo. A grande preocupação era com a sua divindade e sua obra salvífica. Enquanto a teologia, ora denominada de liberal, apregoava de que era preciso resgatar os ensinos de Jesus, uma vez que a teologia ortodoxa sempre se preocupou em formular doutrinas teológicas sobre ele.
O fato é que o Jesus de Nazaré que chorou, riu, sofreu, alegrou-se e morreu, foi substituído por um Jesus transcendente e inacessível. A sua humanidade deu lugar a sua divindade utilitária apenas para fim soterilógico. Não esta se negando a divindade de Jesus, o que poderia ser abordada em outra ocasião, esta se expondo a necessidade de atentar para aquele homem que viveu e morreu em função de sua mensagem: o Reino de Deus. Hoje, a maioria de nossos irmãos desconhece o centro da mensagem de Jesus. Para muitos ele é o salvador “das nossas almas” e sua vida e ensino se resume nisso; outros ainda o confundem com um santo milagreiro; sem mencionar nos novos modismos teológicos, se é que podemos assim chamar, em que Jesus não passa de um meio para se receber bênçãos, na sua maioria de consumo. A mensagem de Jesus sobre o Reino de Deus não é muito lembrada por aqueles que fazem profissão de fé em nossas igrejas; o “venha nós o teu Reino” quase ninguém entende. Não há comprometimento com o Reino de Deus pelo fato de desconhecerem as exigências da mensagem pregada por Jesus.
A grande obsessão de Jesus foi com o Reino de Deus. Sei que nem todos ficam contentes com isso, mas a verdade é que Jesus em nenhum momento quis fundar o cristianismo. Este só surgiu depois da vida, morte e ressurreição. O cristianismo é mais um resultado do que um propósito. Ele pregou o Reino de Deus e em lugar dele veio a Igreja. Jesus não fundou a Igreja, mas acabou sendo fundamento dela, como dizia Karl Rahner.
Ao iniciar sua caminhada naquelas terras áridas de um povo que não agüentava mais esperar pela intervenção de Deus; gente sofrida e calejada pela vida, mas que nutria a esperança em ver novamente seu povo livre da dominação estrangeira e a instauração do tão esperado Reino de Deus, o filho do carpinteiro, que vem de uma cidadezinha que quase ninguém conhecia direito, começa pregando o Reino de Deus.
Era esperado que aquele povo se empolgasse novamente. Seria este que assentaria no trono de Davi? Aquele que iria expulsar os impuros da terra santa? Eram tempos de expectativas (Lc. 3,15). Os discípulos de João Batista manda logo perguntar: “é você mesmo ou havemos de esperar outro?” (Lc. 7,18-22). A questão toda era a natureza deste Reino que Jesus estaria para propor. Não era um reino político, territorial ou guerreiro, mas era um Reino que exigia mudanças na maneira de agir e pensar. Este Reino não poderia ser reduzido a meras expectativas políticas e nacionalistas dos judeus, ele tem outra natureza.
Com esta mensagem Jesus decepciona a todos: discípulos, povo e autoridades judaicas. Perguntam a ele: “quando vem o reino de Deus?” Ele responde: “não poderão vê-lo ali ou acolá, pois ele esta entre vós” (Lc. 17,20-21). O Reino de Deus está aí, é preciso decidir por ele. Há uma nova ordem a ser instaurada por Deus e ela está à disposição de todos. A maior característica do Reino de Deus é a libertação do próprio eu. Era deixar-se ser guiado e tomado por Deus, ser conduzido pelos seus cuidados e estender as mãos para o outro. Este Reino só poderia ter sentido para aqueles que entrassem nele como crianças (Lc. 18,15-17). Agora para aqueles que tinham outro reino dentro de si, como o homem rico, o Reino de Deus não acharia lugar (Lc. 18,18-24).
Jesus de Nazaré. Nasceu entre animais; andou preferindo a companhia dos maus cheirosos, publicanos, zelotes e leprosos. Acabou sendo executado como herege religioso, blasfemo e político subversivo, porque, supostamente, estava tentando ser rei de um povo que o pendura na cruz. Morreu porque se comprometeu com sua mensagem até o último momento de sua vida: o Reino de Deus.
A sua mensagem em nenhum momento foi imposta, é por isso que ele ensina a orar: “venha nós o teu Reino”. Ele não queria criar um novo mundo, mas transformar este velho e conhecido mundo com os valores do Reino. Procurou ser a resposta divina para as mazelas desta vida; ensinou-nos que quando nos abrimos para receber o Reino de Deus mudanças ocorrem, como no caso do pequeno Zaqueu (Lc. 19,1-9).
O fato é que o Jesus de Nazaré que chorou, riu, sofreu, alegrou-se e morreu, foi substituído por um Jesus transcendente e inacessível. A sua humanidade deu lugar a sua divindade utilitária apenas para fim soterilógico. Não esta se negando a divindade de Jesus, o que poderia ser abordada em outra ocasião, esta se expondo a necessidade de atentar para aquele homem que viveu e morreu em função de sua mensagem: o Reino de Deus. Hoje, a maioria de nossos irmãos desconhece o centro da mensagem de Jesus. Para muitos ele é o salvador “das nossas almas” e sua vida e ensino se resume nisso; outros ainda o confundem com um santo milagreiro; sem mencionar nos novos modismos teológicos, se é que podemos assim chamar, em que Jesus não passa de um meio para se receber bênçãos, na sua maioria de consumo. A mensagem de Jesus sobre o Reino de Deus não é muito lembrada por aqueles que fazem profissão de fé em nossas igrejas; o “venha nós o teu Reino” quase ninguém entende. Não há comprometimento com o Reino de Deus pelo fato de desconhecerem as exigências da mensagem pregada por Jesus.
A grande obsessão de Jesus foi com o Reino de Deus. Sei que nem todos ficam contentes com isso, mas a verdade é que Jesus em nenhum momento quis fundar o cristianismo. Este só surgiu depois da vida, morte e ressurreição. O cristianismo é mais um resultado do que um propósito. Ele pregou o Reino de Deus e em lugar dele veio a Igreja. Jesus não fundou a Igreja, mas acabou sendo fundamento dela, como dizia Karl Rahner.
Ao iniciar sua caminhada naquelas terras áridas de um povo que não agüentava mais esperar pela intervenção de Deus; gente sofrida e calejada pela vida, mas que nutria a esperança em ver novamente seu povo livre da dominação estrangeira e a instauração do tão esperado Reino de Deus, o filho do carpinteiro, que vem de uma cidadezinha que quase ninguém conhecia direito, começa pregando o Reino de Deus.
Era esperado que aquele povo se empolgasse novamente. Seria este que assentaria no trono de Davi? Aquele que iria expulsar os impuros da terra santa? Eram tempos de expectativas (Lc. 3,15). Os discípulos de João Batista manda logo perguntar: “é você mesmo ou havemos de esperar outro?” (Lc. 7,18-22). A questão toda era a natureza deste Reino que Jesus estaria para propor. Não era um reino político, territorial ou guerreiro, mas era um Reino que exigia mudanças na maneira de agir e pensar. Este Reino não poderia ser reduzido a meras expectativas políticas e nacionalistas dos judeus, ele tem outra natureza.
Com esta mensagem Jesus decepciona a todos: discípulos, povo e autoridades judaicas. Perguntam a ele: “quando vem o reino de Deus?” Ele responde: “não poderão vê-lo ali ou acolá, pois ele esta entre vós” (Lc. 17,20-21). O Reino de Deus está aí, é preciso decidir por ele. Há uma nova ordem a ser instaurada por Deus e ela está à disposição de todos. A maior característica do Reino de Deus é a libertação do próprio eu. Era deixar-se ser guiado e tomado por Deus, ser conduzido pelos seus cuidados e estender as mãos para o outro. Este Reino só poderia ter sentido para aqueles que entrassem nele como crianças (Lc. 18,15-17). Agora para aqueles que tinham outro reino dentro de si, como o homem rico, o Reino de Deus não acharia lugar (Lc. 18,18-24).
Jesus de Nazaré. Nasceu entre animais; andou preferindo a companhia dos maus cheirosos, publicanos, zelotes e leprosos. Acabou sendo executado como herege religioso, blasfemo e político subversivo, porque, supostamente, estava tentando ser rei de um povo que o pendura na cruz. Morreu porque se comprometeu com sua mensagem até o último momento de sua vida: o Reino de Deus.
A sua mensagem em nenhum momento foi imposta, é por isso que ele ensina a orar: “venha nós o teu Reino”. Ele não queria criar um novo mundo, mas transformar este velho e conhecido mundo com os valores do Reino. Procurou ser a resposta divina para as mazelas desta vida; ensinou-nos que quando nos abrimos para receber o Reino de Deus mudanças ocorrem, como no caso do pequeno Zaqueu (Lc. 19,1-9).
POR UMA NOVA IMAGEM DE DEUS
Refletindo sobre oração
Alguns anos atrás um amigo faleceu com câncer. Era um garoto, tinha apenas dezenove anos; bonito; bom emprego; estava sempre na Igreja; gostava de uma garota; tinha uma vida pela frente. No sofá de casa assistindo TV sentiu uma forte dor na altura da barriga e foi para o hospital. Em questão de dias o diagnóstico acusou câncer. Seu nome era Alberto.
A Igreja ora, os jovens choram, a mãe se desespera. Estava avançando rápido demais.
Naquele dia das mães, num hospital frio um jovem de olhos azuis encerra sua trajetória nesta realidade.
Foi por falta de oração? Será que a oração da Igreja não foi suficiente? Os irmãos não tinham fé? Os pentecostais teria tido êxito? Ou Deus quis levá-lo porque era da “sua vontade”? Será este Deus tão cruel ao ponto de dar cabo de uma vida na flor da idade? Se esta era, de fato, a “sua vontade”, como entender esta “vontade” que machuca e abre um vazio no peito de quem fica? Perguntas e mais perguntas. Foi aí que tive uma nova experiência com Deus. Ele não apareceu no meu quarto em “visão” para dizer o que tinha feito. Minha experiência foi de dentro. Aprendi alguma coisa sobre oração e uma nova imagem de Deus emergiu.
Aquela imagem de um Deus que esta fazendo a sua vontade de maneira implacável – e de que tudo o que ocorria nada mais era do que o seu controle sendo exercido – não era mais concebível. Conceber um Deus que agia por meio do determinismo, e que, portanto, permitia mortes horrendas, catástrofes, doenças, guerras pelo mundo enquanto o homem, passivamente, assistia a sua atuação era insustentável. Ainda tinha que ouvir crentes influenciados por uma teologia calvinista e exclusivista de que aos crentes em Jesus Cristo a misericórdia de Deus era constante. Sem contar a novidade estabelecida pelos neopentecostais de que a oração que não produzia resultados práticos – na sua maioria de consumo – não era oração de verdade. Oração mesmo é aquela em que se manipula a “mão de Deus” para receber recompensas. E os subterfúgios são diversos para constatar a resposta de Deus ao “clamor” dos 318.
Encontrei o sentido de oração no interior de minha existência. Foi na experiência com o Deus de Jesus que encontrei aquele fundamento de base. Naquele em que a oração se fez tão presente: preparou-se para a morte orando e morreu orando.
Concebi uma nova imagem de Deus. Não daquele que controla a história de maneira determinista e inexorável. Nesta nova imagem, ele não esta fora esperando ser acionado para agir de maneira intervencionista. Ele esta dentro e agindo no mundo, mas no e com os seres humanos. A estes foi lhes dada à capacidade de perceber essa Realidade que a tradição judaica chamou de Iahweh e Jesus com profunda intimidade chamou de Abbá.
Oração foi o meio que encontrei para se captar esta nova realidade de Deus; foi perceber de que estava sendo sustentado pela sua presença viva e que por isso não havia necessidade de se achegar a ele, uma vez que ele sempre esteve aí, mas carecia apenas aperceber-se de sua presença atuando, falando, perdoando, animando e interpelando.
Talvez orar seja isso – procurar ser a presença de Deus em cada relacionamento, em cada gesto e atitude concreta. É respirar a Vida e vivê-la de maneira intensa.
Não espero mais que Deus aja numa doença terminal ou mude o curso natural das coisas. A vida é assim: vírus atacam, guerras matam, tumores se formam, veias sangüíneas se desgastam e se rompem, pessoas são mortas por embriagados... Dor e sofrimento são coisas da vida. E vida vivida com suas debilidades e incertezas e é isso que a torna vida. Hoje posso dizer que Deus não está em um câncer, mas no tratamento; ele não está no desemprego, mas na cesta básica; ele não está no seqüestro, mas no telefonema anônimo denunciando o cativeiro. Quando perguntaram a Billy Graham onde estava Deus no fatídico 11 de setembro, ele respondeu: “nos bombeiros”.
Confundimos a nossa vida com Deus. Ele é bom, poderoso e justo, e por isso achamos que nossa vida deveria ser assim também. Nossa compreensão de fazer a vontade de Deus esta muito associada com a ausência de problemas na vida. Deus se torna uma muleta para explicar as mazelas da vida e as coisas inexplicáveis. E a oração como meio para conseguir algo da parte de Deus. Não é orar por simplesmente orar, é orar para se obter alguma coisa. O que não dá para explicar, é que oração é oração, ou seja, é aquela oportunidade de sentir Deus no dia-a-dia, e para isso não é necessariamente falando, pode ser meramente aquele silêncio que torna a nossa realidade cheia de significados.
Oro? Sim oro, mas não como antes. Eu convido todos os dias o doador da Vida para estar comigo, mas não apenas dizendo frases que começam e terminam com o “em nome de Jesus amém”. É uma oração que me remete aquela dimensão mais profunda de se ter “consciência de eu estar em Deus, e ele em mim” (R. S. Thomas, poeta galês do século XX). Talvez seja isso que Paulo quis dizer com o “orai sem cessar”.
Pr. Alonso Gonçalves
Iporanga/SP
Alguns anos atrás um amigo faleceu com câncer. Era um garoto, tinha apenas dezenove anos; bonito; bom emprego; estava sempre na Igreja; gostava de uma garota; tinha uma vida pela frente. No sofá de casa assistindo TV sentiu uma forte dor na altura da barriga e foi para o hospital. Em questão de dias o diagnóstico acusou câncer. Seu nome era Alberto.
A Igreja ora, os jovens choram, a mãe se desespera. Estava avançando rápido demais.
Naquele dia das mães, num hospital frio um jovem de olhos azuis encerra sua trajetória nesta realidade.
Foi por falta de oração? Será que a oração da Igreja não foi suficiente? Os irmãos não tinham fé? Os pentecostais teria tido êxito? Ou Deus quis levá-lo porque era da “sua vontade”? Será este Deus tão cruel ao ponto de dar cabo de uma vida na flor da idade? Se esta era, de fato, a “sua vontade”, como entender esta “vontade” que machuca e abre um vazio no peito de quem fica? Perguntas e mais perguntas. Foi aí que tive uma nova experiência com Deus. Ele não apareceu no meu quarto em “visão” para dizer o que tinha feito. Minha experiência foi de dentro. Aprendi alguma coisa sobre oração e uma nova imagem de Deus emergiu.
Aquela imagem de um Deus que esta fazendo a sua vontade de maneira implacável – e de que tudo o que ocorria nada mais era do que o seu controle sendo exercido – não era mais concebível. Conceber um Deus que agia por meio do determinismo, e que, portanto, permitia mortes horrendas, catástrofes, doenças, guerras pelo mundo enquanto o homem, passivamente, assistia a sua atuação era insustentável. Ainda tinha que ouvir crentes influenciados por uma teologia calvinista e exclusivista de que aos crentes em Jesus Cristo a misericórdia de Deus era constante. Sem contar a novidade estabelecida pelos neopentecostais de que a oração que não produzia resultados práticos – na sua maioria de consumo – não era oração de verdade. Oração mesmo é aquela em que se manipula a “mão de Deus” para receber recompensas. E os subterfúgios são diversos para constatar a resposta de Deus ao “clamor” dos 318.
Encontrei o sentido de oração no interior de minha existência. Foi na experiência com o Deus de Jesus que encontrei aquele fundamento de base. Naquele em que a oração se fez tão presente: preparou-se para a morte orando e morreu orando.
Concebi uma nova imagem de Deus. Não daquele que controla a história de maneira determinista e inexorável. Nesta nova imagem, ele não esta fora esperando ser acionado para agir de maneira intervencionista. Ele esta dentro e agindo no mundo, mas no e com os seres humanos. A estes foi lhes dada à capacidade de perceber essa Realidade que a tradição judaica chamou de Iahweh e Jesus com profunda intimidade chamou de Abbá.
Oração foi o meio que encontrei para se captar esta nova realidade de Deus; foi perceber de que estava sendo sustentado pela sua presença viva e que por isso não havia necessidade de se achegar a ele, uma vez que ele sempre esteve aí, mas carecia apenas aperceber-se de sua presença atuando, falando, perdoando, animando e interpelando.
Talvez orar seja isso – procurar ser a presença de Deus em cada relacionamento, em cada gesto e atitude concreta. É respirar a Vida e vivê-la de maneira intensa.
Não espero mais que Deus aja numa doença terminal ou mude o curso natural das coisas. A vida é assim: vírus atacam, guerras matam, tumores se formam, veias sangüíneas se desgastam e se rompem, pessoas são mortas por embriagados... Dor e sofrimento são coisas da vida. E vida vivida com suas debilidades e incertezas e é isso que a torna vida. Hoje posso dizer que Deus não está em um câncer, mas no tratamento; ele não está no desemprego, mas na cesta básica; ele não está no seqüestro, mas no telefonema anônimo denunciando o cativeiro. Quando perguntaram a Billy Graham onde estava Deus no fatídico 11 de setembro, ele respondeu: “nos bombeiros”.
Confundimos a nossa vida com Deus. Ele é bom, poderoso e justo, e por isso achamos que nossa vida deveria ser assim também. Nossa compreensão de fazer a vontade de Deus esta muito associada com a ausência de problemas na vida. Deus se torna uma muleta para explicar as mazelas da vida e as coisas inexplicáveis. E a oração como meio para conseguir algo da parte de Deus. Não é orar por simplesmente orar, é orar para se obter alguma coisa. O que não dá para explicar, é que oração é oração, ou seja, é aquela oportunidade de sentir Deus no dia-a-dia, e para isso não é necessariamente falando, pode ser meramente aquele silêncio que torna a nossa realidade cheia de significados.
Oro? Sim oro, mas não como antes. Eu convido todos os dias o doador da Vida para estar comigo, mas não apenas dizendo frases que começam e terminam com o “em nome de Jesus amém”. É uma oração que me remete aquela dimensão mais profunda de se ter “consciência de eu estar em Deus, e ele em mim” (R. S. Thomas, poeta galês do século XX). Talvez seja isso que Paulo quis dizer com o “orai sem cessar”.
Pr. Alonso Gonçalves
Iporanga/SP
17.6.08
A BUSCA PELO HUMANO NA TEOLOGIA CONTEMPORÂNEA
Quando se coloca a revelação para além do Cristianismo, é no sentido de distinguir aquele movimento iniciado por um homem de Nazaré, que a história conheceu como Jesus, onde sua mensagem, morte e ressurreição serão os elementos fundamentais da fé dos primeiros cristãos, daquele corrompido pelo século IV em que força os centros cristãos a se posicionar frente às “heresias” como o gnosticismo. Uma primeira formulação dogmática e centralizadora se dá com o Credo Apostólico, o início da chamada ortodoxia. É a partir daí que o Cristianismo terá que responder a algumas perguntas que eram levantadas, dentro do universo filosófico grego, sobre alguém que viveu longe dali e provavelmente nunca tenha ouvido falar de Sócrates ou Aristóteles. O Concílio de Nicéia (325) formula o conceito de Trindade com uma inútil discussão sobre substância e essência de Jesus Cristo com o Deus Pai. Agostinho e Pelágio irão litigar e o primeiro desenvolve a doutrina do Pecado Original, colocando o sexo como algo pecaminoso e quase uma aberração da natureza humana. O teísmo foi sendo construído em cima de postulados autoritários.
A Idade Média passa quando a Renascença e o Iluminismo chega com um discurso de maturidade humana. A era negra exercida pela Igreja chega ao seu fim com a busca incansável do homem por conhecer a sua realidade. Galileu e Copérnico desbancam a pretensão da Igreja em ser portadora do conhecimento científico e o sistema geocêntrico dá lugar ao heliocêntrico, o teocêntrico perde terreno para o antropocêntrico. O homem é dotado de capacidade racional e sistemas filosóficos como racionalismo surge no lugar da escolástica tomista e agostiniana. O Estado torna-se laico. O Homem se sente no controle de sua história. Com este cenário, a revelação se vê a procura de novos postulados, porque aqueles sustentados pelo sistema eclesiástico já não satisfazia o homem em constante descobrimento. O discurso teria que ser outro. Era preciso ter uma temática que buscasse o ser humano em seu sentido mais intimo, uma vez que a maturidade humana conseguiu produzir duas guerras de dimensões catastróficas. É aqui que gostaria de pontuar algumas soluções apresentadas pelo vocabulário teológico ao homem moderno.
Ainda neste período de descobertas e autonomia humana, surge o deísmo com a tentativa de acentuar a liberdade humana frente ao intervencionismo divino no mundo. Deus concebido como um relojoeiro que depois de dar cordas deixa o mundo aos cuidados do Homem no uso de suas atribuições morais.
A busca pelo humano dentro da revelação leva a consideração por outras tradições religiosas, que não seja, exclusivamente, o Cristianismo. Começa uma constatação pelo fenômeno religioso, o que faz alguém como Durkheim investigar formas religiosas na Oceania.
A teologia contemporânea busca essa dimensão do humano com um Barth e sua insistência de que é sempre Deus que procura pelo Homem; um Schleiermacher e seu processo indutivo em que o Homem olhando para si encontra Deus; Ritschl e sua preocupação ética como maneira de encontrar Deus; Bonhoeffer e seu cristianismo não religioso, criticando essa dicotomia sagrado/profano.
Como nada poderia escapar dessa incansável procura, depois da Reforma Protestante e sua centralização no texto bíblico, os olhos se voltam para a Bíblia – o que é isto? Rudolf Bultmann deixa sua contribuição: demitologização. É uma maneira de ver Deus no texto bíblico, mas não ficar espantado com o vocabulário mitológico e pré-científico. A Crítica da Forma coloca dúvidas que até então eram sacralizadas, como a autoria do Pentateuco, Evangelhos Sinóticos e suas fontes, as Cartas de Paulo, e o texto é desqualificado como produto final de Deus para o Homem. A contribuição foi inestimável. Tirou-se aquela ingenuidade de pensar que os homens e mulheres da Bíblia viviam sua ética, culto e religiosidade como algo expressamente revelado. O povo de Israel viveu sua fé que incluiu, naturalmente, vicissitudes como tramas, conquistas, derrotas, alegrias, tristezas. Sua história foi ganhando corpo escrito depois do exílio babilônico. E se há revelação no texto, como há de fato, ela surgiu como conseqüência de um processo de fé que modelou seu pensamento e experiência. O texto não surgiu como palavra feita e dada no nada e no vazio, pelo contrário, o texto recolhe sagas, mitos, festas, lendas, folclore para dar claridade ao passado de Israel e sua experiência originária com o conhecido Iahweh.O mesmo com os escritos neotestamentários: a experiência com o Deus de Israel e sua manifestação no Jesus de Nazaré e a ressurreição como confirmação de que ele era o Filho de Deus; dentro do imaginário religioso e cultural, a comunidade vivencia a sua fé sem pretensão alguma de construir dogmas e fazer doutrinas. O texto ganha status revelacional depois; as disputas com Marcião e seu cânon teve a reação da Igreja e como conseqüência a definição do cânon neotestamentário como escritos autorizados para reforçar a unidade centralizadora dos bispos e a fé expressa no Credo Apostólico, formulando a partir daí a doutrina da inspiração.
Mas a reação a tudo isso veio. O movimento fundamentalista, que prefere ser chamado de conservadorismo, surge nos Estados Unidos com uma postura contrária à teologia liberal (se é que podemos usar este termo), e a crítica bíblica. Como paladinos da ortodoxia e apologista da fé, o fundamentalismo assevera a inspiração das Escrituras como revelação literal da Palavra de Deus, retomando posturas da Patrística como as de Jerônimo e sua posição de que as Escrituras, em cada palavra, sílaba, acento e ponto há significado.
A teologia contemporânea ainda produz teólogos preocupados com o humano e sua relação com o Absoluto. Da Alemanha nazista aparece Karl Rahner com sua antropologia transcendental. A procura é pela dimensão originária. A religião, instituída com seus credos e dogmas, é relegada como tentativa de aproximação do humano com Deus, um meio que procura criar uma linguagem e um vocabulário que expresse a dimensão mais profunda do ser humano. Neste caso, formula Karl Rahner, o Homem é um Ouvinte da Palavra e que, portanto, todo ele está impregnado pela presença da revelação. Em sua estrutura é constituída a vocação para ser este ouvinte. De um lugar que viu duas guerras e um lunático, Paul Tillich busca o fundamento do ser. O profundo, o abismo, o fundo do ser são símbolos do divino. Quando está busca pelo ser emerge, surge a revelação.
Deixando a teologia existencialista da Europa e o fundamentalismo pragmático norte-americano, pensemos em nosso continente: a America Latina.
Um continente subjugado pelo capitalismo selvagem e o colonialismo, condenado a ser sempre especulativo. Mas de um povo festeiro que consegue passar do soluço à gargalhada em minutos; um povo arraigado em suas tradições religiosas. Anos de dominação colonial não tiraram a diversidade cultural e religiosa de nosso continente – como bem diz um poema de nossa terra: “arrancaram nossos frutos, cortaram nossos galhos, queimaram nosso tronco, mas não puderam matar nossas raízes”. Povo hospitaleiro e possuidor de uma espiritualidade herdada pelos índios e seu apego à mãe Terra, a nossa Pacha Mama. Aqui, de fato, não há lugar para o secularismo religioso produzido na Europa, pelo contrário, é a fé em Deus que dá força para lutar contra a opressão social, a desigualdade e a miséria. Em um contexto como esse não poderia surgir outra coisa senão uma teologia da libertação.
Aqui, a revelação só pode ter seu rosto na comunidade que se chama Igreja. Não que ela seja a portadora da revelação e seu limite. Deus está aí – sempre dentro do mundo, em casa, transcendente, imanente e transparente, não necessita vir de fora, a sua presença já permeia toda a criação. Em nosso continente, a Igreja é a sinalização da graça de Deus já presente no mundo. Ela torna patente o plano de amor de Deus; torna realidade, nela mesma, a presença amorosa de Deus. A Igreja é a consciência mais profunda do manifestar de Deus. O nosso Jesus tem um rosto humano demais; a nossa oração é carregada de sentimentalismo; a nossa ética procura o desvalido e o necessitado; a nossa Bíblia é testemunho-exemplo do amor de Deus por um continente marcado pela esperança e o otimismo, a nossa leitura é libertadora – quem disse que o profeta Amós não era latino-americano?
Pr. Alonso Gonçalves
Iporanga/SP
A Idade Média passa quando a Renascença e o Iluminismo chega com um discurso de maturidade humana. A era negra exercida pela Igreja chega ao seu fim com a busca incansável do homem por conhecer a sua realidade. Galileu e Copérnico desbancam a pretensão da Igreja em ser portadora do conhecimento científico e o sistema geocêntrico dá lugar ao heliocêntrico, o teocêntrico perde terreno para o antropocêntrico. O homem é dotado de capacidade racional e sistemas filosóficos como racionalismo surge no lugar da escolástica tomista e agostiniana. O Estado torna-se laico. O Homem se sente no controle de sua história. Com este cenário, a revelação se vê a procura de novos postulados, porque aqueles sustentados pelo sistema eclesiástico já não satisfazia o homem em constante descobrimento. O discurso teria que ser outro. Era preciso ter uma temática que buscasse o ser humano em seu sentido mais intimo, uma vez que a maturidade humana conseguiu produzir duas guerras de dimensões catastróficas. É aqui que gostaria de pontuar algumas soluções apresentadas pelo vocabulário teológico ao homem moderno.
Ainda neste período de descobertas e autonomia humana, surge o deísmo com a tentativa de acentuar a liberdade humana frente ao intervencionismo divino no mundo. Deus concebido como um relojoeiro que depois de dar cordas deixa o mundo aos cuidados do Homem no uso de suas atribuições morais.
A busca pelo humano dentro da revelação leva a consideração por outras tradições religiosas, que não seja, exclusivamente, o Cristianismo. Começa uma constatação pelo fenômeno religioso, o que faz alguém como Durkheim investigar formas religiosas na Oceania.
A teologia contemporânea busca essa dimensão do humano com um Barth e sua insistência de que é sempre Deus que procura pelo Homem; um Schleiermacher e seu processo indutivo em que o Homem olhando para si encontra Deus; Ritschl e sua preocupação ética como maneira de encontrar Deus; Bonhoeffer e seu cristianismo não religioso, criticando essa dicotomia sagrado/profano.
Como nada poderia escapar dessa incansável procura, depois da Reforma Protestante e sua centralização no texto bíblico, os olhos se voltam para a Bíblia – o que é isto? Rudolf Bultmann deixa sua contribuição: demitologização. É uma maneira de ver Deus no texto bíblico, mas não ficar espantado com o vocabulário mitológico e pré-científico. A Crítica da Forma coloca dúvidas que até então eram sacralizadas, como a autoria do Pentateuco, Evangelhos Sinóticos e suas fontes, as Cartas de Paulo, e o texto é desqualificado como produto final de Deus para o Homem. A contribuição foi inestimável. Tirou-se aquela ingenuidade de pensar que os homens e mulheres da Bíblia viviam sua ética, culto e religiosidade como algo expressamente revelado. O povo de Israel viveu sua fé que incluiu, naturalmente, vicissitudes como tramas, conquistas, derrotas, alegrias, tristezas. Sua história foi ganhando corpo escrito depois do exílio babilônico. E se há revelação no texto, como há de fato, ela surgiu como conseqüência de um processo de fé que modelou seu pensamento e experiência. O texto não surgiu como palavra feita e dada no nada e no vazio, pelo contrário, o texto recolhe sagas, mitos, festas, lendas, folclore para dar claridade ao passado de Israel e sua experiência originária com o conhecido Iahweh.O mesmo com os escritos neotestamentários: a experiência com o Deus de Israel e sua manifestação no Jesus de Nazaré e a ressurreição como confirmação de que ele era o Filho de Deus; dentro do imaginário religioso e cultural, a comunidade vivencia a sua fé sem pretensão alguma de construir dogmas e fazer doutrinas. O texto ganha status revelacional depois; as disputas com Marcião e seu cânon teve a reação da Igreja e como conseqüência a definição do cânon neotestamentário como escritos autorizados para reforçar a unidade centralizadora dos bispos e a fé expressa no Credo Apostólico, formulando a partir daí a doutrina da inspiração.
Mas a reação a tudo isso veio. O movimento fundamentalista, que prefere ser chamado de conservadorismo, surge nos Estados Unidos com uma postura contrária à teologia liberal (se é que podemos usar este termo), e a crítica bíblica. Como paladinos da ortodoxia e apologista da fé, o fundamentalismo assevera a inspiração das Escrituras como revelação literal da Palavra de Deus, retomando posturas da Patrística como as de Jerônimo e sua posição de que as Escrituras, em cada palavra, sílaba, acento e ponto há significado.
A teologia contemporânea ainda produz teólogos preocupados com o humano e sua relação com o Absoluto. Da Alemanha nazista aparece Karl Rahner com sua antropologia transcendental. A procura é pela dimensão originária. A religião, instituída com seus credos e dogmas, é relegada como tentativa de aproximação do humano com Deus, um meio que procura criar uma linguagem e um vocabulário que expresse a dimensão mais profunda do ser humano. Neste caso, formula Karl Rahner, o Homem é um Ouvinte da Palavra e que, portanto, todo ele está impregnado pela presença da revelação. Em sua estrutura é constituída a vocação para ser este ouvinte. De um lugar que viu duas guerras e um lunático, Paul Tillich busca o fundamento do ser. O profundo, o abismo, o fundo do ser são símbolos do divino. Quando está busca pelo ser emerge, surge a revelação.
Deixando a teologia existencialista da Europa e o fundamentalismo pragmático norte-americano, pensemos em nosso continente: a America Latina.
Um continente subjugado pelo capitalismo selvagem e o colonialismo, condenado a ser sempre especulativo. Mas de um povo festeiro que consegue passar do soluço à gargalhada em minutos; um povo arraigado em suas tradições religiosas. Anos de dominação colonial não tiraram a diversidade cultural e religiosa de nosso continente – como bem diz um poema de nossa terra: “arrancaram nossos frutos, cortaram nossos galhos, queimaram nosso tronco, mas não puderam matar nossas raízes”. Povo hospitaleiro e possuidor de uma espiritualidade herdada pelos índios e seu apego à mãe Terra, a nossa Pacha Mama. Aqui, de fato, não há lugar para o secularismo religioso produzido na Europa, pelo contrário, é a fé em Deus que dá força para lutar contra a opressão social, a desigualdade e a miséria. Em um contexto como esse não poderia surgir outra coisa senão uma teologia da libertação.
Aqui, a revelação só pode ter seu rosto na comunidade que se chama Igreja. Não que ela seja a portadora da revelação e seu limite. Deus está aí – sempre dentro do mundo, em casa, transcendente, imanente e transparente, não necessita vir de fora, a sua presença já permeia toda a criação. Em nosso continente, a Igreja é a sinalização da graça de Deus já presente no mundo. Ela torna patente o plano de amor de Deus; torna realidade, nela mesma, a presença amorosa de Deus. A Igreja é a consciência mais profunda do manifestar de Deus. O nosso Jesus tem um rosto humano demais; a nossa oração é carregada de sentimentalismo; a nossa ética procura o desvalido e o necessitado; a nossa Bíblia é testemunho-exemplo do amor de Deus por um continente marcado pela esperança e o otimismo, a nossa leitura é libertadora – quem disse que o profeta Amós não era latino-americano?
Pr. Alonso Gonçalves
Iporanga/SP
12.6.08
CTRL C + CTRL V: QUANDO CRER É COPIAR
Hoje meu dia foi cansativo. Daqueles que a gente fica torcendo para que chegue logo o final do expediente, por não agüentar mais fazer a mesma coisa. Entre as muitas tarefas que tinha para fazer, uma me ocupou quase o dia todo... copiar dados de uma planilha para outra, uma por uma, no velho esquema de ctrl c + crtl v (copiar e colar). Como não consigo fazer diferente, enquanto trabalhava, pensava; e enquanto pensava , via claramente na minha rotina o quadro de grande parte da igreja cristã no Brasil: copiar e colar... sem refletir.
Comecei pensar nas coisas que tenho ouvido e visto: unções novas, adoração extravagante, profetadas, messianismo político e não tive como não comparar com nossa realidade: cópias e mais cópias sendo preparadas e jogadas no nosso imenso circo eclesiástico, sem espaço para o mínimo de reflexão.
Nosso povo é treinado para não pensar. Pensar tornou-se uma espécie de "pecado mortal'. Se usar a mente é pecado sem perdão, questionar, então, é a própria encarnação do mal. Vejo uma mensagem silente (às vezes nem tanto) camuflada em alguns superpastores, apóstolos, bispos, semideuses: "sou inquestionável. A única coisa que resta a você, pobre mortal pecador, é ser uma cópia de mim. Este super-homem divino". E o amém não é dado com palavras, mas com vidas: vidas secas, vidas cópias.
Crer hoje é sinônimo de repetir chavões que se aprendem e proliferam em nosso meio. Crer é o mesmo que repetir frases de efeito que "manipulam" céus e terra. Crer é usar palavras de ordem que movem o braço de "deus" ao sabor de quem manda, na terrível inversão de valores a que somos submetidos. A liberdade que Cristo nos dá é roubada descaradamente pelos líderes que procuram copiar suas pobres imagens em seus ensandecidos discípulos. O que mais me dói é que muita gente sincera se deixa enganar por esses manipuladores, gente sem alma, que se alimenta das almas de suas "ovelhas", que para nada mais servem senão alimentarem suas estatísticas "comprovadoras" do "mover de Deus".
Como vejo crescer o número daqueles que lotam igrejas aos domingos, choram apaixonadamente ao ouvirem seus mantras, mas estão vazios de conteúdo. A pior característica do evangelho ctrl c + ctrl v é que o que é copiado não tem conteúdo. É forma, jeito, chavão e aí daquele que tiver o "documento protegido" contra gravação.
Chega de ver gente sendo enganada! Basta de ver gente boa e honesta de Deus sendo levada por fraudadores do evangelho puro e simples! Não dá mais para agüentar calado tanta covardia feita em nome de Deus, roubando as mentes das pessoas e submetendo-as aos desmandos dos paipóstolos, superbispos, pastores pops e quaisquer outras nomenclaturas que possam aparecer.
Evangelho é vida, conteúdo. É vida em abundância e é arquivo protegido contra essas cópias piratas da igreja de Cristo. Crer é também pensar! É questionar! É rever vida, conceitos! Crer não é ficar entregue ao copiar enfadonho de arquivos sem valor. Em último caso dê um crtl + alt + del e reinicie a sua máquina. Ainda há esperança.
Pr. Edwin Ferraz
Pastor dos jovens na Igreja Batista da Liberdade (SP)
O Jornal Batista - 27/01/08.
Comecei pensar nas coisas que tenho ouvido e visto: unções novas, adoração extravagante, profetadas, messianismo político e não tive como não comparar com nossa realidade: cópias e mais cópias sendo preparadas e jogadas no nosso imenso circo eclesiástico, sem espaço para o mínimo de reflexão.
Nosso povo é treinado para não pensar. Pensar tornou-se uma espécie de "pecado mortal'. Se usar a mente é pecado sem perdão, questionar, então, é a própria encarnação do mal. Vejo uma mensagem silente (às vezes nem tanto) camuflada em alguns superpastores, apóstolos, bispos, semideuses: "sou inquestionável. A única coisa que resta a você, pobre mortal pecador, é ser uma cópia de mim. Este super-homem divino". E o amém não é dado com palavras, mas com vidas: vidas secas, vidas cópias.
Crer hoje é sinônimo de repetir chavões que se aprendem e proliferam em nosso meio. Crer é o mesmo que repetir frases de efeito que "manipulam" céus e terra. Crer é usar palavras de ordem que movem o braço de "deus" ao sabor de quem manda, na terrível inversão de valores a que somos submetidos. A liberdade que Cristo nos dá é roubada descaradamente pelos líderes que procuram copiar suas pobres imagens em seus ensandecidos discípulos. O que mais me dói é que muita gente sincera se deixa enganar por esses manipuladores, gente sem alma, que se alimenta das almas de suas "ovelhas", que para nada mais servem senão alimentarem suas estatísticas "comprovadoras" do "mover de Deus".
Como vejo crescer o número daqueles que lotam igrejas aos domingos, choram apaixonadamente ao ouvirem seus mantras, mas estão vazios de conteúdo. A pior característica do evangelho ctrl c + ctrl v é que o que é copiado não tem conteúdo. É forma, jeito, chavão e aí daquele que tiver o "documento protegido" contra gravação.
Chega de ver gente sendo enganada! Basta de ver gente boa e honesta de Deus sendo levada por fraudadores do evangelho puro e simples! Não dá mais para agüentar calado tanta covardia feita em nome de Deus, roubando as mentes das pessoas e submetendo-as aos desmandos dos paipóstolos, superbispos, pastores pops e quaisquer outras nomenclaturas que possam aparecer.
Evangelho é vida, conteúdo. É vida em abundância e é arquivo protegido contra essas cópias piratas da igreja de Cristo. Crer é também pensar! É questionar! É rever vida, conceitos! Crer não é ficar entregue ao copiar enfadonho de arquivos sem valor. Em último caso dê um crtl + alt + del e reinicie a sua máquina. Ainda há esperança.
Pr. Edwin Ferraz
Pastor dos jovens na Igreja Batista da Liberdade (SP)
O Jornal Batista - 27/01/08.
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