Sempre ouvi, quando criança e agora também, a frase: “precisamos ganhar almas para Jesus” ou então essa – que é pior ainda –, “precisamos saquear o inferno, tirar dele as almas”. É horrível, mas não sei contar quantas vezes já ouvi isso.
O fato é que, desde cedo, nos foi ensinado de que o que, realmente, importa é a “alma do pecador”. Era preciso garantir um lugar no céu para a alma do indivíduo, não importando muito o seu contexto social e político. Por conta dessa preocupação excessiva com a alma, o cristão de vertente protestante aprendeu que não deveria se inteirar e interagir politicamente, uma vez que a suma preocupação era com a alma.
A maior preocupação de Jesus não foi com a alma, mas sim com o Reino. No evangelho de Marcos (1,15) lemos: o tempo está cumprido e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho. Não se trata de “ganhar almas”, mas de arrebanhar partidários do Reino de Deus. Quando Jesus entrou na casa de Zaqueu (Lc 19,9) e este aceitou a mensagem do Reino, Jesus pronunciou: hoje houve salvação nesta casa. A salvação aí não foi da alma de Zaqueu, mas sim de suas más ações, de sua maneira de enxergar o outro. A mensagem do Reino de Deus é integral, não paliativa. Ela visa o ser humano por inteiro, não separa sua alma do seu corpo.
A missão da igreja não pode olhar apenas para a alma, ela tem visão holística. Se fosse o contrário a resposta de Jesus àquele homem que perguntou (Mt 19,16-24) o que deveria fazer para ter a vida eterna seria: nada, você já entregou a sua alma ao Deus de Israel. Antes a resposta foi: vende os teus bens e dá aos pobres.
Produziu-se terrorismo em cima dessa questão de “ganhar almas para Jesus”. Quando na verdade o que Jesus requereu sempre foi discípulos, pessoas que partilhassem os mesmos desejos dele, ser fomentador do Reino de Deus.
Ganhar almas para Jesus não tem na Bíblia, mas em compensação o convite para fazer parte do Reino de Deus não falta.